Na manhã seguinte mesmo, marquei um encontro com um dos maiores consultores políticos da Califórnia, Bob White, chefe de gabinete de Pete Wilson por quase três décadas, inclusive durante os oito anos dele como governador. Bob era o cara que tinha feito os trens partirem no horário e era considerado um dos mais influentes republicanos de Sacramento. Eu o conhecia de muitos eventos beneficentes e jantares ao longo dos anos. Quando ele saíra do governo, eu perguntei se poderíamos continuar em contato.
Naturalmente, contratar Bob e sua equipe de estrategistas e analistas não significava que eu fosse ter o apoio do Partido Republicano. Para os chefões do partido, eu era centrista demais. Sim, eu era conservador do ponto de vista fiscal, a favor do empreendedorismo e contrário ao aumento da carga tributária, mas todos sabiam que eu defendia também o direito ao aborto, os gays, o meio ambiente, um controle sensato da venda de armas e um sistema razoável de proteção social. Muitos republicanos conservadores também ficavam incomodados por meu vínculo com os Kennedy, incluindo a admiração que eu nutria por meu sogro, que consideravam um forte exemplo de cobrador de impostos e gastador de dinheiro público. Era quase possível ouvi-los pensar: “Claro, é disto mesmo que precisamos: primeiro virão Arnold e sua mulher liberal, em seguida sua sogra e seu sogro, depois Teddy Kennedy, e por fim todos eles. Um verdadeiro Cavalo de Troia.” Os líderes do partido apreciavam o fato de eu ajudar a angariar fundos e falar sobre seus candidatos e a filosofia republicana durante as campanhas, mas sempre diziam apenas: “Foi ótimo, muito obrigado por ter ajudado.” Não acho que eles algum dia tenham nutrido real simpatia por mim.
No entanto, não foi por isso que procurei Bob e seus sócios. O que eu queria era uma avaliação completa e profissional do potencial que tinha para me candidatar e vencer, acompanhada por pesquisas e estudos que a sustentassem. Embora já tivesse participado de campanhas, também queria saber o que era realmente necessário para se concorrer a um cargo público, uma vez que não era um candidato típico. Quantas horas teria que gastar em campanha? Quanto dinheiro teria que arrecadar? Qual seria o tema da minha eventual campanha? Como manter meus filhos longe dos holofotes? O fato de Maria fazer parte de uma família democrata era um trunfo ou uma desvantagem?
Minha mulher não soube que eu tinha procurado Bob. Já lera sobre minha possível candidatura nos jornais e me vira cogitar a ideia, mas imaginara que eu jamais fosse aguentar uma agenda de político, com 20 reuniões por dia, nem aturar a bobajada habitual que se precisa engolir quando se faz parte da política. Tenho certeza de que estava pensando: “Ele ama demais a vida. Segue o princípio do prazer, não do sofrimento.” Eu não disse a ela que estava considerando seriamente uma candidatura porque não queria que isso virasse um assunto interminável em casa.
Os consultores logo determinaram meus pontos fortes e meus pontos fracos como candidato. O fator Ronald Reagan era a maior vantagem de todas. Ele havia mostrado que o entretenimento é capaz de atravessar as fronteiras entre partidos: as pessoas não apenas sabem quem você é como prestam atenção em qualquer coisa que você diga, sejam elas democratas, republicanas ou independentes – contanto que cumpra o que prometeu. O governador Pat Brown e seus conselheiros políticos erraram feio na avaliação do poder da fama quando Reagan o derrotou em 1966, e acho que os políticos ainda têm dificuldade para acreditar nesse poder. Quando George Gorton, principal estrategista de Pete Wilson, acompanhou-me em um evento em prol das atividades extracurriculares no Hollenbeck Youth Center, ficou abismado ao encontrar 19 equipes de TV a postos para documentar minha visita para os noticiários da noite. Havia pelo menos uma dúzia de câmeras a mais do que ele costumava ver para o próprio governador nesse tipo de evento.
A primeira pesquisa que eles fizeram, com 800 eleitores da Califórnia, chegou ao resultado misto já esperado. Todos os eleitores sabiam quem eu era e 60% tinham uma imagem positiva de mim – isso era uma vantagem. No entanto, quando tiveram que escolher entre mim e Gray Davis para governador, as pessoas optaram por ele em uma proporção de mais de dois contra um. Eu não era sequer candidato, claro, mas estava muito, muito longe de ser favorito. Os consultores listaram as desvantagens óbvias: embora eu tivesse uma filosofia forte e muitas opiniões, meu conhecimento sobre questões como emprego, ensino, imigração e meio ambiente não era muito profundo. Além do mais, eu não dispunha de nenhuma organização para angariar fundos, nem de equipe política, nem de experiência no contato com jornalistas especializados, sem falar no fato de nunca ter sido eleito para nada.
Uma dúvida que surgiu foi se eu deveria concorrer ao cargo de governador em 2002 ou aguardar até 2006. Esperar daria mais tempo para me firmar como candidato aos olhos dos californianos. George Gorton sugeriu que, fosse a minha candidatura quando fosse, uma boa forma de estabelecer sua base seria fazer campanha para uma proposta de votação popular. Entre todos os estados americanos, a Califórnia é famosa por sua tradição de “democracia direta”. Segundo a Constituição estadual, o legislativo não é o único responsável pela criação das leis; o povo também pode fazer isso de forma direta, levando propostas a voto durante os pleitos estaduais. Esse sistema de propostas de votação popular remonta a Hiram Johnson, lendário governador da Califórnia de 1911 a 1917, e depois senador por quase 30 anos. Johnson o usou para diminuir o poder de um legislativo corrupto controlado pelas grandes empresas ferroviárias. A mais célebre aplicação contemporânea do sistema de votação popular foi na revolta fiscal de 1978. Nesse ano, os eleitores californianos aprovaram a Proposta 13, emenda constitucional oficialmente intitulada “Proposta Popular para Limitar a Carga Tributária sobre Bens Imobiliários”. Na época, fazia apenas 10 anos que eu morava nos Estados Unidos, e lembro que fiquei maravilhado com o fato de cidadãos comuns poderem limitar os poderes de um estado.
Gorton comentou que, se eu patrocinasse uma proposta de votação popular, poderia me apresentar aos eleitores sem ter que me candidatar imediatamente a governador. Isso me daria motivo para criar uma organização, promover eventos beneficentes, constituir alianças com grupos importantes, conversar com jornalistas e fazer comerciais na TV. Se a proposta fosse aprovada, isso mostraria que eu era capaz de conseguir votos em todo o estado.
Antes de encarar qualquer um desses desafios, porém, Bob e os colegas acharam melhor me alertar sobre a situação em que eu estava me metendo. Apesar de eu estar pagando pelos seus serviços, eles eram caras ambiciosos e queriam ter certeza de que não estavam desperdiçando seu tempo em uma campanha movida pela simples vaidade de um astro de Hollywood. Na realidade, eles pediram ao ex-governador Wilson que me transmitisse essa mensagem pessoalmente. Em março de 2001, ele conduziu uma sessão estratégica de quatro horas no meu escritório. Disse que torcia para que eu me candidatasse e que eu já começara a formar uma boa equipe para conseguir ser eleito. Mas disse também: “Você tem que ser realista em relação ao impacto que isso vai ter na sua vida, na sua família, nas suas finanças e na sua carreira.” Ele então circulou a mesa e cada consultor foi citando mudanças que iriam ocorrer na minha vida. O estrategista político Don Sipple falou sobre como Eisenhower e Reagan tinham feito a transição para a vida política com sucesso, enquanto Ross Perot e Jesse Ventura haviam fracassado. Perot, um empresário texano, surgira do nada em 1992 para concorrer à presidência como candidato independente e conseguira impressionantes 19,7 milhões de votos, quase um em cada cinco computados na eleição daquele mês de novembro. Ventura, ex-lutador profissional e meu ex-colega de elenco em Predador e O sobrevivente, estava no meio de um mandato frágil como governador de Minnesota, que não tentaria renovar.