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Quando novembro se aproximava, eu estava confiante de que iríamos ganhar, mas não via isso como uma certeza. A Califórnia estava em recessão – desde o estouro da bolha da internet, em 2000, a renda familiar vinha caindo e o estado acumulava bilhões de dólares em dívidas. Os eleitores estavam com medo de novos gastos. Enquanto isso, a briga pelo cargo de governador ficou feia entre Gray Davis e seu principal adversário, um empresário republicano conservador contrário ao direito ao aborto chamado Bill Simon. Os índices de apoio ao governador continuavam baixos, mas os eleitores afirmavam nas pesquisas que gostavam ainda menos de Simon.

Nós queríamos garantir que a Proposta 49 não fosse tragada por um grande tsunami de pessimismo. Assim, nas últimas semanas de campanha, fizemos mais comícios e gastamos mais 1 milhão de dólares com anúncios na TV.

Na noite da votação, meus consultores recomendaram que nos reuníssemos em um elegante hotel de Los Angeles, como era o costume nas eleições da Califórnia, mas insisti que fôssemos ao Hollenbeck Youth Center, que tinha muito mais a ver com o projeto que estávamos tentando aprovar. Lá, pedimos comida para as crianças do bairro, para as pessoas que torciam pelo projeto e para as que haviam trabalhado na campanha, e ficamos aguardando os resultados. Pouco antes da meia-noite, as pesquisas indicaram que podíamos nos declarar vitoriosos e começar uma grande festa na quadra de basquete. A Proposta 49 acabou aprovada com 56,7% dos votos, enquanto os candidatos republicanos perderam todas as votações no estado.

Gray Davis também saiu vencedor nessa noite, mas sua reeleição na verdade não era algo a ser comemorado. Depois da campanha mais cara da história da Califórnia, a maioria dos eleitores simplesmente ficou em casa – foi a pior participação já registrada no estado em um pleito para governador. Davis derrotou Simon e os candidatos menos expressivos com apenas 47% dos votos, margem muito menor do que em 1998, quando vencera por grande diferença.

Para assombro do restante do país, um movimento popular para depor Gray Davis começou quase no mesmo instante em que se iniciou seu novo mandato. Fora do estado, as pessoas pensaram que fosse apenas mais um indício de que os californianos são doidos. No entanto, as mesmas cláusulas de democracia direta da Constituição estadual que permitiam propostas de votação popular proporcionavam também um mecanismo para revogar a eleição de membros do governo por meio de um pleito especial. Assim como as propostas de votação popular, a cassação de cargo de governadores tinha um histórico longo e atribulado. Pat Brown, Ronald Reagan, Jerry Brown e Pete Wilson haviam enfrentado tentativas de anulação de seus mandatos, mas nenhum de seus opositores chegara a coletar assinaturas suficientes para levar o processo adiante.

A campanha para a eleição revogatória de Davis começou com um punhado de ativistas – alimentava-se do sentimento generalizado de que o estado seguia o rumo errado e de que o governador não se esforçava o suficiente para solucionar os problemas da Califórnia. Em dezembro, por exemplo, a população ficou indignada quando Davis anunciou que o rombo nas contas do estado poderia ser 50% maior que o estimado apenas um mês antes, ou seja, 35 bilhões de dólares no total – equivalente ao déficit somado de todos os outros estados americanos. Além disso, os californianos ainda estavam bravos por causa da crise de energia. O abaixo-assinado a favor da revogação externava essas e outras preocupações, acusando o governo de “péssima gestão das finanças da Califórnia, com gasto excessivo do dinheiro do contribuinte, ameaça à segurança pública ao cortar o financiamento das administrações locais, incapacidade de justificar o custo exorbitante do fiasco da energia elétrica e inaptidão generalizada para lidar com os principais problemas do estado antes que estes chegassem a um crítico nível”.

No início, não dei muita atenção à campanha de revogação, pois achava muito difícil que fosse dar em alguma coisa. Além do mais, o movimento a favor do programa extracurricular estava atravessando sua própria crise. Em fevereiro, Bonnie Reiss e eu estávamos viajando pelo país para divulgar os Inner-City Games. Tínhamos acabado de pousar no Texas quando o celular dela tocou. Era um amigo ligando para avisar que o presidente George W. Bush acabara de apresentar uma proposta orçamentária que eliminava os subsídios federais aos programas extracurriculares: mais de 400 milhões de dólares em financiamentos anuais dos quais dependiam projetos em todo o país. Naturalmente, a imprensa texana logo quis saber o que eu pensava a respeito. Aquilo não era um insulto à minha causa? A Casa Branca não estava declarando guerra a Arnold?

“Tenho certeza de que o presidente acredita nos programas extracurriculares”, falei. “O orçamento ainda não é definitivo.” Assim que pude, liguei para Rod Paige, secretário de Educação de Bush, a fim de perguntar o que estava acontecendo. Ele explicou que o motivo alegado por Bush para interromper o financiamento era um novo estudo universitário segundo o qual os programas extracurriculares na realidade não eram tão eficazes quanto se pensava para manter as crianças longe do crime, das drogas e de outras coisas do gênero.

“Quer saber de uma coisa?”, retruquei. “Isso não quer dizer que precisamos zerar o financiamento. Significa que devemos usar esse estudo para aprender e para corrigir o problema. Por que não organizamos uma cúpula ‘O Melhor dos Programas Extracurriculares’?” Eu não achava que fosse uma ideia maluca. Conhecia os especialistas, tinha experiência em fazer pessoas nos setores público e privado e de ambos os partidos trabalharem juntas, e já havia organizado cúpulas em 50 estados. Não devia ser nenhum mistério. O secretário Paige gostou da ideia e disse que talvez o seu departamento pudesse financiá-la. Eu havia feito a sugestão de forma instintiva, de modo que ri quando Bonnie a interpretou como uma tática política sagaz.

– Entendi o que estamos fazendo – disse ela quando encerrei o telefonema. – Se a administração organizar uma cúpula sobre como melhorar os programas extracurriculares, o presidente terá uma justificativa para mudar de opinião e restabelecer os financiamentos.

– Pare com isso – retruquei. – Estamos só tentando resolver o problema.

Na mesma hora, planejamos uma ida a Washington para defender o orçamento do projeto junto a membros-chave do legislativo federal. Quando meu conselheiro político, Bob White, soube desse plano, mandou-me um recado recomendando veementemente que eu desistisse. Em poucas palavras, ele dizia: “Desista. Nunca contrarie um presidente do seu próprio partido. Se conseguir recuperar o financiamento, vai parecer desrespeitoso. Se não conseguir, vai parecer um líder fraco. Seja como for, você vai prejudicar suas chances futuras de se candidatar a governador.”

Entendi a lógica política desse conselho, mas minha sensação era que proteger os programas extracurriculares valia o risco. Perder o financiamento federal prejudicaria bastante inúmeras crianças. Pensei: “Neste caso, vamos ignorar a política.”

Assim, fomos a Washington no início de março para defender nossa causa. Nossa primeira visita foi ao deputado Bill Young, o poderoso republicano da Flórida que era presidente do Appropriations Committee (Comitê do Orçamento). Eu me tornara amigo dele e da mulher, Beverly, por causa de sua paixão por ajudar ex-combatentes feridos em instituições como o Centro Médico Militar Walter Reed e o Hospital Naval Bethesda. Eles me haviam inspirado a visitar hospitais regularmente. Eram momentos sem câmeras e sem jornalistas – eu ia porque adorava ver os jovens veteranos, diverti-los e lhes agradecer pelo ótimo trabalho.