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Se algum dia tivessem lhe dito para cursar a universidade, Albert teria se tornado médico, cientista ou intelectual. Em vez disso, estudou engenharia. Descobriu a malhação e então percebeu que tinha talento para a escrita e a fotografia. Perguntou a Putziger se podia fazer uns trabalhos para a revista. “Claro, escreva uma matéria para mim, escreva alguma coisa”, ouviu em resposta. Quando Albert e a mulher tiveram gêmeos e ele parou de receber a bolsa de estudos, foi trabalhar para Putziger em tempo integral. Em pouco tempo, virou editor responsável pela revista e se firmou como um especialista na cena do fisiculturismo. Ele tinha certeza de que eu iria me tornar a próxima sensação do esporte e, como queria que eu alcançasse o sucesso, prontificou-se a servir de interlocutor entre mim e Putziger.

Tirando meus problemas com o chefe, o emprego era ideal. O negócio de Putziger compreendia a academia, a revista e uma pequena empresa de venda de suplementos alimentares por correspondência. A academia em si tinha várias salas, em vez de uma única sala grande. Contava também com janelas e luz natural, em vez das úmidas paredes de concreto do estádio de Graz com as quais eu estava acostumado. O equipamento era o mais sofisticado que eu já tinha usado. Além dos pesos, havia um conjunto completo de aparelhos para ombros, costas e pernas. Assim, pude acrescentar ao meu treino exercícios que isolavam músculos, aumentavam a definição e desenvolviam meu corpo de uma forma impossível de conseguir apenas com halteres.

No exército, eu havia aprendido que adorava ajudar as pessoas a treinar, de modo que essa parte do trabalho foi natural. Ao longo do dia, dava aulas para pequenos grupos e tinha sessões individuais com todo tipo de gente: policiais, operários da construção civil, executivos, intelectuais, atletas, artistas, alemães e estrangeiros, jovens e velhos, gays e heterossexuais. Incentivava os soldados da base americana próxima a treinar na academia. A Universum Sport Studio foi o primeiro lugar em que conheci um negro. Muitos de nossos clientes só queriam melhorar a forma física e a saúde, mas tínhamos também um grupo de halterofilistas e fisiculturistas profissionais que eu podia imaginar como parceiros de treino sérios. Percebi também que eu sabia unir e desafiar homens assim. “É, você até que pode ser meu parceiro de treino. Está mesmo precisando de ajuda”, eu brincava. Como treinador, eu gostava de ser o líder do grupo e, embora tivesse bem pouco dinheiro, sempre levava todos para almoçar ou jantar e pagava a conta.

Estar ocupado ajudando os clientes significava que eu não tinha tempo de treinar como antes, ou seja, fazer uma sessão diária intensa de quatro ou cinco horas. Então optei por treinar duas vezes por dia, duas horas antes do trabalho e duas das sete às nove da noite, quando o movimento diminuía e só ficavam os praticantes mais sérios. No início, achei esses treinos divididos uma chatice, mas percebi que havia descoberto uma coisa interessante quando vi os resultados: estava me concentrando melhor e me recuperando mais depressa, ao mesmo tempo que fazia séries mais longas e mais puxadas. Em muitos dias, acrescentava um terceiro treino na hora do almoço. Isolava uma parte do corpo que considerava fraca e lhe dedicava atenção total por 30 ou 40 minutos: 20 séries de flexões plantares em pé, por exemplo, ou 100 extensões de tríceps. Fazia a mesma coisa algumas noites, depois do jantar, quando voltava às 11 da noite para mais uma hora de treino. Ao ir dormir no meu quartinho, muitas vezes sentia algum músculo que havia trabalhado nesse dia se contrair e latejar – mas isso era apenas o efeito colateral de uma boa malhação, e muito agradável, pois eu sabia que essas fibras agora iriam se recuperar e se desenvolver.

Estava treinando duro porque, dali a menos de dois meses, sabia que teria que enfrentar um dos melhores fisiculturistas do mundo. Eu tinha me inscrito no maior evento de fisiculturismo da Europa: a disputa de Mister Universo, em Londres. Era uma atitude precipitada. Em condições normais, alguém relativamente novato como eu nem sonharia em participar daquela competição. Eu teria tentado vencer primeiro a disputa de Mister Áustria e, caso ganhasse, aí, sim, teria cogitado concorrer ao Mister Europa. No entanto, nesse ritmo, estar “pronto” para Londres teria levado muitos anos, e eu estava impaciente demais para isso. Queria a competição mais difícil que pudesse conseguir, e essa seria a guinada mais agressiva que eu poderia dar na minha carreira. No entanto, eu não era nenhum idiota, claro, e conhecia os riscos. Não esperava ganhar em Londres – não dessa vez. Porém estava decidido a descobrir qual era minha posição na carreira. Albert adorou a ideia e, como falava inglês, me ajudou a preencher o formulário de inscrição.

Para uma rotina tão fanática quanto a minha, era preciso mais de um parceiro de treino. Por sorte, havia um número suficiente de fisiculturistas sérios em Munique que gostaram do meu sonho de ser Mister Universo, ainda que me achassem meio maluco. Franz Dischinger treinava comigo regularmente, assim como Fritz Kroher, rapaz do interior como eu, originário de uma cidadezinha nas florestas da Bavária. Até mesmo Reinhard Smolana, dono da academia rival, entrou na dança. Às vezes ele me convidava para treinar na sua academia, ou ia à Universum malhar depois do expediente. Em apenas poucas semanas, vi que tinha encontrado minha verdadeira turma e comecei a me sentir em casa em Munique.

Meu parceiro de treino favorito chamava-se Franco Columbu, e ele logo se tornou meu melhor amigo. Eu o conhecera em Stuttgart no ano anterior, quando ele vencera o campeonato europeu de levantamento de peso no mesmo dia em que eu ganhara o Mister Europa juvenil. Franco era italiano, natural da Sardenha. Fora criado em uma fazenda em um minúsculo vilarejo de montanha que soou ainda mais primitivo do que Thal quando ele o descreveu para mim. Passara a maior parte da infância pastoreando ovelhas e, aos 10 ou 11 anos, ficava vários dias sozinho no mato, tendo que se virar para achar o que comer e se defender sem a ajuda de ninguém.

Franco tivera que abandonar a escola aos 13 anos para ajudar a família na fazenda, mas era muito trabalhador e inteligente. Começara como pedreiro e lutador de boxe amador e depois fora para a Alemanha ganhar a vida no ramo da construção. Em Munique, aprendera o idioma e passara a conhecer a cidade tão bem que se qualificou para ser taxista. A prova para ser motorista de táxi lá era difícil até para os locais, e o fato de um italiano ser aprovado deixou todo mundo impressionado.

Franco praticava levantamento de peso, eu, fisiculturismo, e ambos concordávamos que os dois esportes se complementavam. Eu queria aumentar minha massa corporal, o que significava trabalhar com pesos pesados, e isso Franco sabia fazer. Em contrapartida, eu entendia de fisiculturismo, algo que ele queria aprender. “Eu quero ser Mister Universo”, disse ele. Os outros riam da sua cara, pois Franco tinha apenas 1,65 metro, mas, no fisiculturismo, a perfeição e a simetria podem derrotar a simples estatura. Gostei da ideia de treinarmos juntos.

Talvez por ter passado tanto tempo ao ar livre, no mato, Franco estava sempre disposto a abraçar novas ideias. Por exemplo, ele adorou minha teoria de “choque muscular”. O maior obstáculo para um treino bem-sucedido sempre me pareceu ser o fato de que o corpo se ajusta muito depressa. Se você fizer a mesma série de levantamentos todos os dias, mesmo que aumente a carga progressivamente, verá o ganho muscular diminuir e depois parar, porque os músculos se tornam muito eficientes executando a sequência à qual já estão acostumados. A única forma de estimular o músculo e fazê-lo voltar a crescer é surpreendê-lo com a mensagem: “Você nunca vai saber o que está por vir. Será sempre diferente do que você espera. Hoje é assim, amanhã será outra coisa.” Um dia são pesos superpesados; no outro, séries com muitas repetições.