Выбрать главу

AO INICIAR O SEGUNDO MANDATO, eu tinha grandes ambições. Estava decidido a cumprir as promessas de campanha e abordar questões importantes e difíceis que pudessem posicionar a Califórnia como líder em matéria de saúde pública, meio ambiente e reformas políticas. Já tínhamos lançado programas de grande alcance nas áreas de mudanças climáticas e infraestrutura. A recessão fazia parte do passado, a economia recomeçara a crescer e, graças a isso e a muita disciplina, conseguíramos diminuir o déficit orçamentário de 16 bilhões de dólares em 2004 para 4 bilhões no ano fiscal corrente. No orçamento para o ano que começaria em julho de 2007 que eu estava prestes a apresentar ao legislativo, o déficit seria zero pela primeira vez em muitos anos. Portanto, o estado estava preparado para ações decisivas.

Meu plano era usar o discurso de posse para contestar a própria ideia do partidarismo. A louca polarização de nosso sistema político me deixava desolado, bem como o desperdício, a paralisia e os danos causados por ela. Apesar de acordos bipartidários em 2006 nas áreas de infraestrutura, meio ambiente e orçamento, a Califórnia havia se tornado profundamente dividida. Republicanos e democratas não conseguiam mais chegar a um denominador comum e negociar acordos em relação a interesses compartilhados, como acontecera durante o grande crescimento do pós-guerra. Agora a política da Califórnia era uma grande força centrífuga que obrigava eleitores, políticas e partidos a se afastarem do centro. Os distritos eleitorais tinham sido estabelecidos para eliminar a competição. Alguns eram administrados por republicanos conservadores, outros por democratas liberais. O falecido deputado federal Phil Burton tinha tanto orgulho da demarcação que fizera para os democratas da Califórnia ao estabelecer as linhas divisórias no Congresso, em 1981, que a qualificava como “sua contribuição para a arte moderna”. Em meu discurso de posse, em 2007, falei que, por causa da divisão desigual e controversa dos distritos políticos, o legislativo da Califórnia tinha menos rotatividade que a monarquia Habsburgo na Áustria.

Nos dois dias que sucederam o 11 de Setembro, houvera um exemplo realmente lamentável desse fato. Com o país ainda atordoado por causa dos ataques terroristas a Nova York e Washington, o legislativo aprovara uma lei de redefinição dos limites distritais que entrincheirava ainda mais os legisladores eleitos e os linhas-duras de ambos os partidos. Era uma visão de mundo que punha partidos acima de pessoas e, na minha opinião, isso tinha que mudar.

Assim, quando saí da cama, peguei as muletas e fui fazer meu discurso de posse, desafiei os californianos a não cederem mais à extrema esquerda e à extrema direita e a voltarem para o centro. Para os políticos, falei: “Ser moderado não é sinônimo de ser fraco, ou sem-graça, ou indeciso. Ser moderado significa ser bem equilibrado, bem fundado. O povo americano é instintivamente centrista. Nosso governo também deveria ser assim. Os partidos políticos dos Estados Unidos deveriam voltar ao centro, que é onde o povo está.”

E lembrei aos eleitores: “A esquerda e a direita não detêm o monopólio da consciência. Não podemos deixá-las pensar que detêm. É possível ser moderado e ter princípios. É possível buscar um consenso e manter as próprias convicções. Existe princípio maior do que ceder parte de sua posição em nome de um bem mais importante? Foi assim que conseguimos chegar a uma Constituição neste país. Se não tivessem entrado em um acordo, nossos Pais Fundadores estariam reunidos até hoje no Holiday Inn de Filadélfia.”

Quatro dias depois, proferi o discurso “O estado do estado” diante da Assembleia e do Senado estaduais. Apesar da maneira como muitas vezes havíamos nos torturado mutuamente durante meu primeiro mandato, pude elogiar seus integrantes. Sequer precisei mentir – tudo o que tive que fazer foi compará-los aos políticos de Washington. “No ano passado, o governo federal ficou paralisado por impasses e joguinhos”, falei. “Mas vocês, aqui nesta casa, tomaram atitudes relacionadas a infraestrutura, salário mínimo, custo de remédios com receita controlada e redução de gases de efeito estufa em nossa atmosfera. Isso significa que não estamos parados esperando nossos problemas piorarem. Não estamos aguardando o governo federal. Porque o futuro não espera.”

Expus então a visão que tinha do estado: “Não só podemos conduzir a Califórnia para o futuro como podemos mostrar ao país e ao mundo como chegar lá. Podemos fazer isso porque temos importância econômica, temos nossa população e temos a força tecnológica de um estado-nação. Nós somos a versão moderna das antigas cidades-estado de Atenas e Esparta. A Califórnia conta com as ideias de Atenas e a potência de Esparta.” Em seguida, enumerei meia dúzia de maneiras ambiciosas de o nosso estado servir de exemplo em âmbito nacional e internacional, da construção de escolas ao combate ao aquecimento global.

É claro que o político mediano está pouco se lixando para Atenas e Esparta, ou para qualquer outro tipo de visão. Mas eu acabara de ganhar uma eleição. Por ora, portanto, eles tinham que me ouvir. Eu estava disposto a apostar que pelo menos alguns dos membros do legislativo estadual aceitariam o desafio de realizar ainda mais do que havíamos realizado em 2006.

Antes mesmo que eu me livrasse das muletas, eu e meu gabinete voltamos a trabalhar com força total. Somando os objetivos que eu havia estabelecido nos discursos às propostas de votação popular relativas ao orçamento do ano, lançamos a mais ambiciosa agenda de mudanças de qualquer governo estadual na história moderna: a reforma da legislação de saúde mais abrangente dos Estados Unidos; a implementação das mais completas regulações relativas a mudanças climáticas do país, incluindo o primeiro padrão do mundo para combustível de baixo carbono; a reforma do sistema de liberdade condicional e a construção de novas prisões; e o imenso e mais controverso projeto das lendárias guerras da água da Califórnia: um novo canal periférico para concluir o que o governador Pat Brown havia começado 30 anos antes.

Continuamos a fazer as reformas orçamentária e política avançarem: fortalecemos o fundo emergencial e proibimos a arrecadação de recursos durante o processo de aprovação do orçamento. Fizemos uma segunda tentativa de redefinição dos limites distritais por meio de uma proposta de votação popular, com o objetivo de formar um comitê independente, sem vínculos partidários. E eu gastei longas horas tentando ajudar pessoas comuns a lidar com problemas extraordinários. Passamos semanas fazendo reuniões com empresas hipotecárias – tais como Countrywide, GMAC, Litton e HomEq –, de modo a acelerar o auxílio para impedir que mutuários do segmento de crédito de risco, ou subprime, que não estavam conseguindo honrar seus empréstimos perdessem seus imóveis. Nós nos reunimos com líderes de segurança pública das regiões do Vale Central e do Vale de Salinas para ajudá-los a formular uma abordagem mais eficaz para o combate à violência das gangues.

As jornadas de trabalho muitas vezes chegavam a 16 horas, e eu simplesmente passava a maioria das noites em Sacramento. Gostava da importância e da complexidade dos desafios, de estar sempre em movimento. No entanto, sentia falta de Maria e das crianças e continuava me esforçando para tentar passar a sexta-feira e todos os fins de semana em Los Angeles.

Durante meu primeiro mandato, acho que esse arranjo havia funcionado sobretudo graças ao talento de Maria como mãe. Certa noite, porém, durante a primavera, eu tinha chegado de Sacramento e estávamos todos sentados ao redor da mesa da cozinha quando Christina começou a chorar. “Pai, você nunca está em casa”, reclamou ela. “Vive em Sacramento. Nem foi assistir ao meu recital na escola.” Outro de meus filhos falou: “Você não apareceu no Dia dos Pais. Só a mamãe foi.” Então um terceiro começou a chorar e disse: “É, você também faltou à minha partida de futebol.” De repente, foi como uma catarse coletiva. Todos choravam, e cada um tinha a sua reclamação.