Em 2010, também me aliei à NAACP e a Arne Duncan, o secretário de Educação do presidente Obama, para obter uma imensa vitória relacionada à reforma do ensino, dando aos pais o direito de tirar seus filhos de escolas de baixa qualidade. Os sindicatos de professores e as administrações das escolas lutaram com afinco para tentar barrar as reformas, mas a força bipartidária de um governador republicano, um presidente democrata e o principal grupo de direitos civis da nação foi imbatível até mesmo para o mais poderoso sindicato do estado.
A verdadeira medida do sucesso em 2010, no entanto, veio dos eleitores. Eu estava mais consciente do que nunca de que a chave para reformas verdadeiras e permanentes era estar em sintonia com o sentimento e o pensamento da população. Em junho, apesar do meu baixo índice de popularidade, os eleitores aprovaram a segunda parte de nosso pacote de reforma política: as primárias abertas. A primeira – uma reforma histórica que rompeu uma tradição americana de dois séculos de manipular as fronteiras dos distritos eleitorais – fora aprovada em 2008. Aliado a ela, o sistema de primárias abertas acabaria de uma vez por todas com a dominação dos interesses especiais da extrema esquerda e da extrema direita em nosso sistema eleitoral. Os dois nomes mais votados em cada primária decidiriam a eleição, independentemente do partido. Candidatos independentes e moderados republicanos ou democratas poderiam votar no candidato de sua escolha, acabando com o controle total dos radicais em ambos os partidos existente em um sistema de primárias fechado. A medida foi aprovada com 54% dos votos.
O derradeiro teste foi em novembro. Com nossas reformas, havíamos cutucado tantas onças com vara curta, à esquerda e à direita do espectro político, que tivemos que enfrentar propostas de votação popular elaboradas para anular nossas vitórias. A primeira foi uma tentativa de invalidar a medida que regulamentava os limites distritais, aprovada em 2008. Os dois partidos financiaram a campanha que tornaria a medida sem efeito e devolveria os distritos eleitorais sãos e salvos às mãos dos representantes em exercício. Além disso, também tentaram derrubar uma nova medida cujo objetivo era implantar um sistema distrital mais justo nas eleições para o Congresso. A democrata Nancy Pelosi, presidente da Câmara dos Deputados, fez seus membros da Califórnia arrecadarem milhões de dólares para derrotar essa medida e anular a nossa. O ringue estava armado para a luta.
A segunda votação especial foi um referendo apresentado pelos sindicatos para punir as empresas que tivessem apoiado minhas reformas orçamentárias e políticas. O referendo anularia as reformas fiscais para empresas que tanto lutáramos para aprovar em 2009 como parte do compromisso. Infelizmente, essa era uma manobra típica: conseguia-se um acordo bipartidário sobre aumento de impostos e reformas fiscais que reduzia o custo para as empresas e, em seguida, uma vez implementados os aumentos de impostos, os sindicatos tentavam anular as reformas.
A terceira medida era a mais importante. A Proposta 23 foi levada a votação popular, financiada sobretudo por grandes empresas petrolíferas do Texas, para tentar anular nosso histórico acordo sobre o aquecimento global. A campanha manipulava os medos das pessoas em relação à economia e alegava que nossos esforços para combater as mudanças climáticas iriam aumentar ainda mais os índices de desemprego. Os defensores da proposta inundaram o estado com anúncios de TV que diziam: “Empregos Primeiro – Sim à 23”. Reagimos com uma campanha surpreendentemente impactante codirigida por George Shultz, Jim Cameron e Tom Steyer, dono de um fundo de capital de risco, que arrecadou 25 milhões de dólares. Um de nossos anúncios mais eficazes mostrava um menino pegando um nebulizador e se esforçando para respirar. Não apenas derrotamos a Proposta 23 – nós a pulverizamos por uma diferença de 20 pontos. Acabamos com qualquer esperança que a indústria petrolífera texana pudesse ter de reverter a liderança da Califórnia na questão das mudanças climáticas.
Na verdade, naquele ano os eleitores apoiaram todas as nossas iniciativas, passando por cima da oposição ferrenha de partidos, sindicatos e empresas petrolíferas do Texas. Uma reforma política histórica, uma reforma tributária para as empresas e a aprovação mais firme possível de nossos esforços em relação às mudanças climáticas – era bom estar novamente no centro, em posição de poder, e contando com o apoio da população.
Vivíamos um momento de transformação. Por toda a Califórnia, era possível ver uma nova economia energética se consolidando. Uma década iniciada com apagões e desespero terminava com o estado aprovando mais projetos de energia renovável do que o país inteiro e assumindo, com determinação, a liderança nessa área. Um estado apaixonado por rodovias de alta velocidade e carros agora encabeçava o país inteiro no desenvolvimento de combustíveis alternativos. Um estado atolado em impasses políticos estava agora pondo abaixo as barreiras do radicalismo que protegiam os partidos políticos dos eleitores que supostamente deveriam representar.
Com a aproximação do fim do mandato, minha agenda ficou mais cheia. No último trecho de uma missão comercial à Ásia, em setembro, posso afirmar com orgulho que dei um jeito de concentrar 36 horas de trabalho em um único dia. Na quarta-feira, 15 de setembro, comecei o dia às oito da manhã, em Seul, em uma reunião com a Câmara Americana de Comércio no hotel Grand Hilton. Então passei algum tempo com atletas dos Jogos Mundiais Olímpicos Especiais, tive um encontro com os presidentes da Korean Air e da Hyundai, conversei com o prefeito de Seul, assinei um acordo de cooperação entre Coreia e Califórnia, andei no trem-bala, visitei uma loja de departamentos e animei os soldados americanos lotados na Coreia. Ao ser informado sobre a imensa explosão de um gasoduto em San Bruno, cancelei os outros compromissos e, em vez de ir para casa, peguei um avião direto para a região da baía de São Francisco, cruzando a linha internacional de mudança de data. Quando cheguei em território americano, portanto, ainda era quarta-feira. Em San Bruno, visitei o local da explosão, recebi informações atualizadas das equipes de socorro e conversei com as vítimas, que ainda se encontravam em estado de choque. Falei com famílias que tinham perdido seus lares, seus parentes, sua comunidade. De todas as coisas que fiz na vida, nada ficou gravado mais fundo na minha memória que fitar os olhos de uma pessoa que acabara de perder tudo o que amava na vida.
EM DEZEMBRO, DEPOIS DE OS eleitores escolherem Jerry Brown para me suceder e com os planos para a transferência de poder já bem adiantados, um jornalista me perguntou por que não saí tranquilamente pela porta, como teria feito a maioria dos governadores após dois mandatos tumultuados. Respondi que acredito em cruzar a linha de chegada correndo a toda a velocidade. “Ainda há muito trabalho a ser feito”, falei. “Por que parar em novembro ou dezembro? Não faria o menor sentido.”
O estado ainda estava tomado pela mais profunda crise financeira da história moderna dos Estados Unidos e, apesar de todos os nossos esforços, meu sucessor teria que encarar um déficit orçamentário persistente, provavelmente pelos dois anos seguintes. Eu poderia simplesmente ter ignorado os números durante o outono e deixado o trabalho a cargo de Jerry Brown. Com certeza era o que os líderes democratas do legislativo queriam que eu fizesse, pois estavam fartos da minha pressão por mais cortes de gastos. No entanto, deixar passar meses sem qualquer providência teria sido uma irresponsabilidade. Assim, convoquei mais uma sessão especial do legislativo. Dessa vez, já sabia de antemão que os legisladores não agiriam. Estavam todos sem energia, rezando para que o novo governador democrata chegasse montado em um cavalo branco e aumentasse os impostos para poupá-los de ter que fazer mais cortes. Não fariam mais nenhum corte, de jeito nenhum, por mais que eu os pressionasse. A imprensa escreveu o óbvio: “Ele começou com problemas de orçamento e terminou com problemas de orçamento.”