É verdade. Apesar disso, tivemos um baita progresso e também fizemos história em muitas frentes: reformas no sistema de seguros e indenizações trabalhistas, reformas nas políticas de concessão de liberdade condicional, reformas da aposentadoria, reformas do ensino, reformas do sistema de benefícios sociais e previdenciários e reformas do orçamento não uma, nem duas, mas quatro vezes. (E lá estarei, na campanha de 2014, para garantir que os eleitores aprovem as novas reformas orçamentárias.) Fizemos do nosso estado um líder internacional em matéria de mudanças climáticas e energia renovável; um líder nacional em reforma do sistema de saúde e na luta contra a obesidade; lançamos o maior esforço de investimento em infraestrutura em muitas gerações; e enfrentamos o problema da água, o mais espinhoso da política estadual. Implementamos as reformas políticas mais significativas desde o governo de Hiram Johnson – e, em junho de 2012, na primeira eleição realizada com o novo sistema de primárias abertas, o aumento da participação de candidatos moderados e pragmáticos atraiu atenção nacional. E realizamos tudo isso ao mesmo tempo que lidávamos com o maior desastre econômico desde a Grande Depressão.
Não nego que ser governador foi mais complexo e mais desafiador do que eu havia imaginado. Destaco um incidente em especial, pelo abismo que revela entre o que as pessoas pensam que você pode fazer por elas e a realidade que você tem que enfrentar como governador. Durante a terrível seca de 2009, fui conversar com agricultores em Mendota, no vale Central. Estava com Alan Autry, prefeito de Fresno e ex-quarterback profissional de futebol americano, que se esforçou mais do que ninguém para chamar minha atenção para a situação dos agricultores. Mendota era uma das comunidades mais afetadas tanto pela crise econômica quanto pela seca devastadora. A produção agrícola estava paralisada, os campos tinham virado pó e o desemprego atingira os 42%. Precisávamos de mais água do delta dos rios Sacramento-San Joaquin. Os ambientalistas, porém, diziam que desviar a água ameaçaria um peixinho chamado delta smelt, e um juiz federal ordenou que o desvio não fosse feito. O governo federal avaliou que o peixe precisava de mais proteção que os agricultores.
Os lavradores começaram a fazer demonstrações com cartazes que diziam “Liguem as Bombas” e mostravam imagens dos campos secos. Davam à imprensa declarações do tipo: “De jeito nenhum vou deixar um peixinho levar embora minha água. Vamos lutar contra o governo até o fim.”
Eu disse a eles que estávamos negociando com Ken Salazar, secretário do Interior.
– Essas coisas levam tempo, é preciso ter paciência – falei.
Um dos agricultores se levantou e perguntou:
– Como você pode dizer isso? Por que simplesmente não vai lá e gira a válvula? Vá lá e ligue a bomba.
Percebi que as pessoas achavam que eu fosse ignorar o juiz federal, ignorar quem quer que estivesse vigiando a estação da bomba, chegar até uma imensa válvula, quebrar a corrente que a prendia e girá-la, liberando assim uma enxurrada de água sobre a região para deixá-la toda verdinha e devolver o emprego aos agricultores. Só que eu não podia fazer isso na vida real! É esse o problema quando você é governador. Pode até fazer milagres, mas não do tipo em que veste uma capa e sai voando pelo céu. Foram precisos muitos meses de pressão e convencimento junto ao Departamento do Interior e algumas dedicadas negociações com o governo Obama antes de a água ser liberada.
Como governador, você não é nem um defensor solitário nem um astro. Precisa trabalhar lado a lado com o legislativo, com os tribunais, com a máquina burocrática e com o governo federal, sem falar nos próprios eleitores.
A política pode ser bem parecida com se atirar no ar em direção a uma multidão. Muitas mãos se levantam para carregá-lo e às vezes você até acaba indo parar aonde queria ir, mas outras vezes não. Em comparação com fazer um filme, porém, a satisfação de realizar algo no governo é bem maior e mais duradoura. Em um filme, você diverte o público por algumas horas dentro de uma sala escura. Já no governo você afeta vidas inteiras, gerações até.
Sempre que chegávamos a algum acordo e que alguma medida era aprovada pelo legislativo ou nas urnas, eu era tomado por uma sensação extraordinária. Pegava um charuto, acendia, sacava minha lista de coisas a realizar, pegava uma caneta e riscava aquele item da lista. Sem dúvida eu gostaria de ter riscado mais itens, mas mesmo assim me sinto bem com o que conseguimos realizar.
Até Maria concordava que o desafio tinha valido a pena. Em 2010, ao discursar em uma conferência sobre bem-estar, ela afirmou: “Gostaria de reconhecer hoje que estava errada quando tentei convencer Arnold a não se candidatar a governador, sete anos atrás, e que ele teve razão em não me dar ouvidos. A verdade é que eu não queria que ele concorresse porque eu própria não gostei de ser criada em uma família de políticos. Tinha medo de que algo ruim acontecesse. Eu temia o desconhecido. Na realidade, Arnold teve razão em correr atrás de seu sonho e se candidatar. Ele adorou ter sido governador mais do que qualquer outra coisa que já tenha feito na vida. O trabalho acabou combinando perfeitamente com seu intelecto, seu amor pelas pessoas, sua paixão por políticas públicas e sua tendência competitiva. Nunca o vi mais feliz ou mais realizado. Mesmo com todos os altos e baixos dos últimos sete anos, ele diz que, se tivesse que fazer tudo outra vez, faria sem pestanejar, e eu acredito nele. Nunca pensei que fosse dizer isso, mas agradeço ao meu marido por não ter me escutado.”
Ter uma mulher assim era mais sorte do que eu merecia.
CAPÍTULO 29
O segredo
DURANTE MEUS CAÓTICOS ÚLTIMOS MESES como governador, Maria e eu fomos procurar um terapeuta de casais. Ela queria conversar sobre o fim do meu mandato, e nos concentramos em questões que vários casais enfrentam na meia-idade, como o fato de nossos filhos estarem começando a viver as próprias vidas. Katherine já estava com 21 anos e cursava o terceiro ano na Universidade do Sul da Califórnia, enquanto Christina estava no segundo ano na Universidade de Georgetown. Dali a alguns anos, Patrick e Christopher também sairiam de casa. Como ficariam nossas vidas?
No entanto, Maria marcou uma sessão logo para o dia seguinte à minha saída do governo, quando me tornei outra vez um cidadão comum (era uma terça-feira), e pressenti que dessa vez era outra coisa. Agora minha mulher tinha algo muito específico em mente.
O consultório tinha uma iluminação fraca e era mobiliado com peças minimalistas e de cores neutras – não era o tipo de sala em que eu gostaria de passar muito tempo. Havia um sofá, uma mesa de centro e a poltrona do terapeuta. Assim que nos sentamos, ele virou-se para mim e falou:
– Maria quis vir aqui hoje para perguntar sobre um filho... para perguntar se você teve um filho com Mildred, sua empregada. Foi por isso que ela marcou esta sessão. Então vamos falar sobre isso.
No primeiro instante, quando o tempo pareceu parar, pensei comigo mesmo: “Bom, Arnold, você queria contar para ela. Surpresa! Está contado. Agora a bola está com você. Talvez esse fosse o único jeito de você tomar coragem.”