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Dianne se concentrava em me encher de proteínas e aprimorar minhas boas maneiras. Às vezes ela devia ter a impressão de que eu fora criado por lobos. Não sabia como segurar os talheres direito, nem que era preciso ajudar a tirar a mesa depois do jantar. Dianne assumiu o lugar que tanto meus pais quanto Fredi Gerstl e Frau Matscher tinham deixado vazio. Uma das poucas vezes que ela ficou brava comigo foi quando me viu abrir caminho aos empurrões por uma multidão de fãs após uma competição. Na minha cabeça, eu só pensava: “Eu ganhei! Agora vou comemorar.” Mas Dianne me segurou e disse: “Arnold, isso não se faz. Essas pessoas vieram aqui ver você. Elas gastaram dinheiro e algumas viajaram longas distâncias para estar aqui. Você pode parar por alguns minutos e lhes dar um autógrafo.” Essa bronca mudou minha vida. Eu nunca havia pensado nos fãs, só nos concorrentes. A partir desse dia, porém, passei a encontrar sempre um tempo para eles.

Até as crianças ajudaram no projeto “A educação de Arnold”. Não deve haver nenhum jeito melhor de aprender inglês do que conviver com uma família londrina animada e feliz na qual ninguém entende alemão, você dorme no sofá e tem seis irmãos e irmãs mais novos. Eles me tratavam como um gigantesco filhote de cachorro que houvessem acabado de ganhar e adoravam me ensinar palavras novas.

Em uma foto minha tirada nessa viagem, estou encontrando pela primeira vez meu ídolo de infância, Reg Park. Ele veste calça esportiva e suéter, tem a aparência relaxada e está bronzeado. Eu, ao contrário, com minha sunga de competição, estou pálido e tenho um ar surpreso, de admiração. Estava diante de Hércules, do detentor de três títulos de Mister Universo, do astro de cinema cuja foto eu pregara na parede do meu quarto, do homem que servira de modelo para o meu projeto de vida. Mal consegui articular qualquer palavra. Todo o inglês que havia aprendido se evaporou da minha cabeça.

Reg vivia então em Johanesburgo, onde era dono de uma rede de academias, mas voltava à Inglaterra a trabalho várias vezes por ano. Era amigo dos Bennett e generosamente concordara em me ensinar os truques da profissão. Para Wag e Dianne, a melhor maneira de eu ter uma boa chance de ganhar o título de Mister Universo era me tornar mais conhecido no Reino Unido. Na época, os fisiculturistas faziam isso entrando no circuito de exibição – promotores das Ilhas Britânicas organizavam eventos regionais e, se você aceitasse participar, podia ganhar um dinheirinho e divulgar o próprio nome. Por acaso, Reg estava a caminho de um evento desses em Belfast, na Irlanda do Norte, e sugeriu que eu o acompanhasse. Construir um nome no fisiculturismo é bem parecido com fazer política. Você vai de cidade em cidade e torce para a informação se espalhar. Esse contato com o público funcionou, e o entusiasmo gerado por essa iniciativa acabaria me ajudando a ganhar o título de Mister Universo.

Certa noite eu estava nos bastidores de uma exibição vendo Reg posar no palco diante de uma plateia de várias centenas de fãs animados. Então ele foi até o microfone e me chamou para subir ao palco. Ficou narrando enquanto eu demonstrava minha força: roscas com os dois braços e um peso de 125 quilos, e cinco levantamentos terra com 227 quilos. Terminei com uma pose e as pessoas aplaudiram de pé. Estava pronto para descer do palco quando ouvi Reg dizer:

– Arnold, venha cá. – Quando cheguei ao microfone, ele tornou a falar: – Diga alguma coisa para o pessoal.

– Não, não, não – respondi.

– Por que não?

– Eu não falo inglês muito bem – expliquei.

– Vejam só! – exclamou ele. – Muito bom! Vamos aplaudir, pessoal. Para um cara que não fala inglês, é preciso muita coragem para dizer uma frase dessas.

Ele começou a aplaudir e logo todos o imitaram.

De repente, pensei: “Caramba, que fantástico. Eles gostaram do que eu disse!”

– Diga a eles: “Eu gosto da Irlanda” – continuou Reg.

– Eu gosto da Irlanda.

Mais aplausos.

– Lembro que você me disse mais cedo que é a sua primeira vez em Belfast, e que você mal podia esperar para chegar aqui. Não é verdade?

– É.

– Então diga a eles! “Eu mal podia esperar...”

– Eu mal podia esperar...

– “...para chegar aqui.”

– ...para chegar aqui.

Mais aplausos. Minha nossa! A cada frase que ele dizia e eu repetia, a plateia me aplaudia.

Se Reg tivesse me dito na véspera que iria me chamar para subir ao palco e pedir que eu dissesse algumas palavras, eu teria ficado apavorado. Agora, porém, ali estava eu, conseguindo falar em público sem pressão. Não precisava me preocupar com o fato de os espectadores me aceitarem ou darem importância ao que eu dissesse. Eu não tinha medo, porque estava focado no meu corpo. Eu estava levantando pesos, posando. Sabia que eles me aceitavam. Falar era só uma atração extra.

Depois desse dia, passei a estudar o comportamento de Reg em várias exibições. Ele tinha um jeito inacreditável de falar. Sabia divertir as pessoas, era espontâneo, contava histórias. E ele era Hércules! Era Mister Universo! Conhecia vinhos e gastronomia, falava francês e italiano. Era um daqueles caras que realmente sabem se comportar. Eu via o jeito como ele segurava o microfone e dizia a mim mesmo: “É isso que você tem que fazer. Não pode simplesmente posar no palco feito um robô e depois ir embora. Assim as pessoas nunca vão conhecer sua personalidade. Reg Park fala com as pessoas. É o único fisiculturista que conheço que interage com a plateia. É por isso que elas o amam. É por isso que ele é Reg Park.”

DE VOLTA A MUNIQUE, PASSEI A ME CONCENTRAR em conseguir clientes para a academia. O velho Putziger quase nunca aparecia, fato que Albert e eu achávamos ótimo. Nós dois formávamos uma bela equipe. Albert administrava tudo – o negócio de venda de suplementos pelo correio, a revista e a academia – e fazia o trabalho de várias pessoas. A mim, além de conduzir os treinos, cabia recrutar novos clientes. Nosso objetivo, naturalmente, era ultrapassar Smolana e nos tornarmos a principal academia da cidade. A publicidade era um primeiro passo evidente, mas não tínhamos dinheiro para anunciar tanto assim, então mandamos imprimir alguns cartazes. Esperávamos a noite cair e então percorríamos a cidade para pregá-los em canteiros de obras, onde imaginávamos que os operários fossem se interessar pelo fisiculturismo.

Mas essa estratégia não deu tão certo quanto esperávamos. Ficamos quebrando a cabeça, tentando encontrar uma solução, até que Albert passou por um dos canteiros de obras durante o dia e viu um cartaz de Smolana pregado no muro, bem em cima de um dos nossos. Descobrimos que ele vinha mandando seu pessoal percorrer a cidade para cobrir nossos cartazes com os dele antes de a cola secar. Assim, mudamos de tática. Colávamos os cartazes uma primeira vez à meia-noite, depois dávamos uma segunda passada às quatro da manhã para ter certeza de que quando os operários das obras chegassem para trabalhar os cartazes da nossa academia estariam por cima. Todo mundo se divertiu bastante com essa guerra de cartazes, e aos poucos nosso número de clientes começou a aumentar.

Nosso argumento era que, embora Smolana tivesse mais espaço, nós tínhamos mais energia e mais diversão. Outra vantagem nossa eram os lutadores. Hoje em dia a luta livre é um fenômeno esportivo da TV, mas naquela época os lutadores iam de cidade em cidade promovendo combates. Quando estavam em Munique, eles se apresentavam em um lugar chamado Circus Krone, um prédio construído para servir de sede a um circo e que tinha uma imensa arena permanente no centro. Sempre que havia uma luta, o lugar ficava abarrotado.

Os lutadores viviam procurando um lugar para malhar e, quando ouviram falar de mim, começaram a escolher a nossa academia. Treinei com pessoas como o havaiano Harold Sakata, que fez o papel do vilão Oddjob no filme 007 contra Goldfinger em 1964. Assim como muitos outros lutadores profissionais, Harold começou como levantador de peso. Ele ganhou uma medalha de prata para os Estados Unidos nos Jogos Olímpicos de 1956 em Sydney, Austrália. Tínhamos também lutadores húngaros, franceses, do mundo inteiro. Eu abria a academia em horários fora do expediente só para recebê-los e à noite ia assistir às suas lutas. Eles estavam doidos para me fazer virar lutador, mas é claro que isso não fazia parte dos meus planos.