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Joe Weider havia criado a versão americana do Mister Universo 10 anos antes, para aumentar a popularidade do fisiculturismo nos Estados Unidos, mas aquela era a primeira vez que o concurso era realizado na Flórida. Eles alugaram o Miami Beach Auditorium, um salão grande e moderno, com 2.700 lugares. Eu já perdera a prévia do evento – entrevistas, festas, filmagens para cinema e TV e ações promocionais –, mas mesmo assim a produção me pareceu grande, bem de acordo com os padrões americanos. Lendas do fisiculturismo como Dave Draper e Chuck Sipes, respectivamente Mister América e Mister Universo, podiam ser encontradas por toda parte.

Pela primeira vez pude ver o campeão mundial de fisiculturismo, Sergio Oliva, um imigrante cubano que fora o primeiro integrante de uma minoria a vencer as disputas de Mister América, Mister Mundo, Mister Internacional, Mister Universo e Mister Olympia. Na semana anterior, ele tinha acabado de conquistar o segundo título consecutivo de Mister Olympia. Embora eu ainda não estivesse no seu nível, Oliva sabia que nós dois logo iríamos competir. “Ele é muito, muito bom”, comentou o cubano com um repórter, falando de mim. “O ano que vem vai ser difícil. Mas, por mim, tudo bem. Não gosto de competir com bebês.” Quando ouvi isso, pensei: “A pressão psicológica já começou.”

Eram uns 20 competidores divididos em dois grupos: altos e baixos. Nas rodadas prévias de avaliação, durante o dia, derrotei com facilidade os dois outros altos. Mas o melhor competidor na categoria dos baixos era o Mister América, Frank Zane, que estava na melhor forma física de toda a sua carreira. Na semana anterior, ganhara a disputa de Mister América em Nova York. Estava tão grande, definido e forte quanto eu em Londres, com a mesma massa muscular impressionante. No entanto, uma semana sem fazer nada enquanto esperava o visto tinha me deixado um pouco mais pesado que o ideal. Quando posei, portanto, meu corpo pareceu liso e com menos definição. Pior ainda: além de ter proporções perfeitas e de ser musculoso e definido, Zane exibia um belo bronzeado, enquanto eu era branco feito leite. À noite, quando a etapa final começou, ele estava alguns pontos na minha frente.

Nessa noite, diante do público, tive a sensação de estar 100% melhor. Um dia inteiro flexionando os músculos e posando sob as luzes do palco tinha derretido os quilos a mais. Isso ajudou a tornar a disputa entre nós dois tão acirrada que acabamos empatados na votação dos jurados. No entanto, a pontuação mais alta de Frank durante o dia levou-o à vitória. Fiquei parado no palco tentando não parecer atarantado enquanto um cara 13 centímetros mais baixo e 23 quilos mais leve que eu ganhava o prêmio.

Foi um golpe. Eu conseguira enfim chegar aos Estados Unidos, exatamente como sonhara. Mas perdi o título de Mister Universo em Miami. Para um cara mais leve e mais baixo. Fiquei pensando que a disputa tinha sido marmelada, porque ele simplesmente não era grande o suficiente para ganhar de mim. Me faltava definição, mas ele não passava de um baixinho magrelo.

Nessa noite, o desespero bateu forte. A animação quase nunca me abandona, mas foi o que aconteceu nesse dia. Estava em um país estrangeiro, longe da família e dos amigos, cercado por pessoas desconhecidas e sem falar o idioma. Como conseguira chegar até ali? Tinha dado um passo muito maior do que as pernas. Todos os meus pertences estavam dentro de uma pequena bolsa de ginástica – todo o resto ficara para trás. Provavelmente não tinha mais emprego. Nem dinheiro. E não sabia como iria voltar para casa.

Pior de tudo, eu havia perdido. O grande Joe Weider me fizera atravessar o Atlântico para me dar aquela oportunidade, mas, em vez de me mostrar à altura, eu passara vexame e não conseguira dar o melhor de mim. Estava dividindo o quarto com Roy Callander, um fisiculturista negro que vivia na Inglaterra e também havia participado da competição em Londres. Ele foi um doce de pessoa e conversou comigo sobre a derrota. Era bem mais maduro que eu e falou sobre coisas que eu não entendia muito bem. Estava falando sobre sentimentos.

“É difícil perder depois de uma grande vitória como a de Londres”, disse ele. “Mas lembre que no ano que vem você vai ganhar outra vez, e todo mundo vai esquecer essa derrota.”

Era a primeira vez que um homem se mostrava tão atencioso comigo. Eu sabia que mulheres eram atenciosas: minha mãe era e outras mulheres também. Mas ser tratado com empatia genuína por outro homem foi algo avassalador. Até então, eu achava que só meninas chorassem, mas nessa noite acabei deixando as lágrimas correrem em silêncio por muitas horas. Foi um baita alívio.

No dia seguinte, quando acordei, estava me sentindo bem melhor. A luz do sol entrava no quarto e o telefone ao lado da cama estava tocando.

“Arnold!”, disse uma voz rascante. “Aqui é Joe Weider. Estou na beira da piscina. Quer descer e pedir o café da manhã? Queria entrevistar você para a revista. Pretendemos fazer uma matéria de capa com você, contando exatamente como é o seu treinamento...”

Desci até a piscina e lá deparei com Joe à minha espera, usando um roupão de banho listrado, sentado em frente a uma mesa com uma máquina de escrever. Mal pude acreditar. Eu havia crescido lendo suas revistas, e ele sempre retratava a si mesmo como o Treinador dos Campeões, o homem que inventara todos os métodos de treinamento, que pusera o fisiculturismo no mapa e criara todos os grandes nomes do esporte. Eu idolatrava aquele homem e agora estava ali, sentado ao lado dele à beira de uma piscina em Miami. De repente, as lágrimas da véspera foram esquecidas e me senti importante outra vez.

Joe tinha 40 e poucos anos, um rosto bem barbeado, costeletas e cabelos escuros. Não era muito alto – tinha uma estatura mais para mediana –, mas era robusto. Graças às revistas, eu sabia que ele malhava diariamente. Tinha uma voz inconfundíveclass="underline" forte, penetrante, com vogais estranhas que, até mesmo aos meus ouvidos, soavam diferentes do sotaque de outras pessoas que falavam inglês. Mais tarde, descobri que ele era canadense.

Ele me perguntou tudo sobre meus treinos. Passamos horas conversando. Ainda que meu inglês tornasse a conversa um pouco lenta, senti que tinha mais histórias a contar do que os demais fisiculturistas. Contei a Joe sobre como treinava na floresta, ao estilo dos gladiadores. Ele gostou de ouvir. Quis saber cada detalhe das técnicas que eu havia desenvolvido: o método do “treino dividido”, com duas ou três sessões por dia, os truques que Franco e eu tínhamos inventado para estimular os músculos. Enquanto isso, eu não parava de me beliscar. Ficava pensando: “Queria que os meus amigos de Munique e Graz vissem isto: eu aqui, sentado com Joe Weider, e ele me perguntando como treino.”

Ao meio-dia, ele pareceu tomar uma decisão. “Não volte para a Europa”, disse ele por fim. “Você tem que ficar aqui.” Ele se ofereceu para me pagar uma passagem para a Califórnia, me arrumar um apartamento, um carro e pagar minhas despesas para que eu pudesse passar um ano inteiro só concentrado em treinar. No outono do ano seguinte, na época da mesma competição, eu poderia tentar outra vez. Enquanto isso, suas revistas publicariam reportagens sobre meus treinos e Weider arrumaria tradutores para eu poder escrever sobre minhas séries e expressar minhas ideias.

Joe tinha várias opiniões sobre o que eu precisava fazer para chegar ao topo. Ele me disse que eu estava me concentrando nas coisas erradas e que, mesmo para um homem alto, potência e tamanho por si sós não bastavam. Eu precisava treinar mais pesado para que meus músculos também ficassem mais definidos. Embora algumas partes do meu corpo fossem fantásticas, as costas, o abdômen e as pernas ainda podiam melhorar. E eu ainda precisava aprimorar as poses. Montar séries de treino, é claro, era a especialidade de Joe Weider, e ele mal podia esperar para começar a me treinar. “Você vai ser o melhor de todos”, afirmou. “Espere e verá.”