Joe insistia na importância de se tornar global, em vez de restringir os negócios a apenas um país. Ele sabia que o futuro apontava nessa direção. Cada viagem sua tinha vários objetivos: no Japão, por exemplo, também encontramos integrantes da federação nacional de fisiculturismo e Joe lhes deu conselhos sobre como melhorar suas competições. Nossas longas viagens de avião eram sempre estimulantes. Conversávamos sobre negócios, arte, antiguidades, esportes. Ele estudava história mundial e história judaica. Também era muito versado em psicologia. Com certeza deve ter feito análise.
Eu estava no paraíso, pois sempre achei que o meu futuro estivesse nos negócios. Não importava o que eu estivesse fazendo, parte da minha mente com frequência se perguntava: “Será esse o meu destino? Qual é minha missão aqui?” Eu sabia que tinha um destino especial, mas qual seria? Para mim, ser empresário era o melhor de todos eles. E agora aquele líder estava me deixando acompanhá-lo em suas viagens de negócios, e eu estava aprendendo justamente o que precisava. Talvez pudesse acabar promovendo e vendendo o fisiculturismo, suplementos alimentares, equipamentos domésticos e para academias, abrindo minha própria rede de academias e administrando um império – como Reg Park, só que em escala global. Isso seria fantástico! Eu sabia que tinha uma visão de negócios diferente da dos outros fisiculturistas. Se Weider tivesse proposto a viagem ao Japão a algum deles, a resposta teria sido “Ah, não, o Japão deve ser um saco. Que academias eles têm por lá? Eu quero é malhar”, ou alguma outra imbecilidade assim. Então talvez o meu destino fosse mesmo suceder os irmãos Weider na geração seguinte. Joe obviamente estava gostando muito de me ensinar. “Você está mesmo interessado!”, ele costumava comentar.
O que aprendi com Joe vai muito além dos negócios. Ele colecionava móveis e objetos de arte, algo que me fascinava. Quando fiquei hospedado em seu apartamento de Nova York, pude admirar todas as obras de arte e antiguidades. Ele falava sobre os leilões e dizia: “Comprei isto aqui por tanto. E agora está valendo tanto.”
Foi a primeira vez que entendi que móveis antigos podem aumentar de valor. Até então eu os via apenas como velharias sem valor, como as que tínhamos na Áustria. Mas Joe dizia: “Olhe só isto aqui: é do período do Império francês. É mogno. Está vendo os cisnes esculpidos nos braços? São o emblema da esposa de Napoleão I, a imperatriz Josefina. E tem também esta esfinge de bronze incrustada nas costas, está vendo? Os franceses adoram motivos egípcios.” Comecei a acompanhá-lo a leilões em Nova York, na Sotheby’s, na Christie’s e em outras casas leiloeiras.
A cadeira Napoleão era uma das melhores peças de Joe. Ficava no quarto de hóspedes de sua casa. Na primeira vez em que me hospedei lá, ele fez todo um teatro: “Essa cadeira é muito frágil e muito, muito cara. Preste atenção para não sentar nela nem tocá-la, está bem?” Eu queria tomar cuidado com a cadeira, mas nessa noite, quando estava tirando a calça para me deitar, meu pé ficou preso, perdi o equilíbrio e caí bem em cima dela. A cadeira foi esmagada pelo meu peso e parecia ter explodido. Fui procurar Joe e disse:
– Você tem que ver uma coisa. Acabei de destruir a cadeira.
Ele entrou correndo no quarto e, quando viu os pedaços espalhados pelo tapete, quase desmaiou. Então começou a xingar.
– Ah, seu filho da mãe! Essa cadeira é caríssima!
Mas logo se controlou, porque percebeu que reclamar assim era coisa de gente desclassificada. Qualquer cadeira pode ser consertada se for danificada. O móvel não estava destruído, só havia quebrado nas partes em que era colado, nas junções. Simplesmente desmontou quando caí por cima dele.
Estava me sentindo culpado, claro, mas não consegui me segurar e falei:
– Não acredito. Eu machuquei o joelho, arrebentei o quadril e você nem perguntou “Como você está?” ou disse “Não se preocupe com isso, o mais importante é você”. Você deveria estar sendo uma figura paterna para mim aqui nos Estados Unidos! Mas a sua única preocupação é essa cadeira.
Isso fez Joe se sentir realmente mal.
– Ai, meu Deus, tem razão – reconheceu ele. – Olhe só para isso! Essa cadeira é mesmo vagabunda. Quem a montou fez um péssimo trabalho!
E então começou a chamar os outros de filhos da mãe, os tais caras da época de Napoleão que tinham fabricado a cadeira.
Depois dessa visita a Nova York, fui de avião a Chicago para assistir à competição de Mister América da AAU e passar uma semana treinando com Sergio Oliva. Apesar de termos sido adversários no outono anterior, isso não o impediu de se mostrar hospitaleiro. Ele e a mulher me receberam para jantar no seu apartamento, e tive meu primeiro contato com a cultura negra e latina de Cuba. Sergio falava usando muitas gírias, se vestia de maneira excêntrica e sua relação com a mulher era diferente de tudo o que eu já tinha visto, com muitas explosões e gritos de ambos os parceiros. Mesmo assim, ele era um verdadeiro cavalheiro.
Eu estava em uma missão secreta de reconhecimento: na minha opinião, era preciso entrar no campo do inimigo e descobrir como ele via o mundo. O que faz desse homem um campeão? Que alimentos ele come, como vive, o que posso aprender com seu treinamento? Como ele pratica suas poses? Qual é sua atitude em relação à competição? Nenhuma dessas informações me daria um corpo capaz de vencê-lo, mas poderia me motivar e me mostrar do que eu precisava para vencer. Será que eu poderia encontrar um ponto fraco a ser usado psicologicamente? Estava convencido de que o esporte não era apenas uma guerra física, mas também psicológica.
A primeira coisa que descobri foi que Sergio trabalhava ainda mais que eu. Tinha um emprego em tempo integral em uma siderúrgica e, depois de passar o dia inteiro no calor dos altos-fornos, treinava por horas na Associação Cristã de Moços de Duncan. Era uma daquelas pessoas que não se cansam com facilidade. Diariamente, para começar, ele fazia 10 séries de 20 barras. Não eram exercícios para as costas. Era apenas para se aquecer. Todo santo dia. Sergio tinha várias técnicas pouco comuns que eu podia usar. No supino com barra, ele fazia meias repetições, sem nunca dobrar completamente os cotovelos. Isso mantinha o músculo peitoral em tensão total o tempo todo, e de fato seus peitorais eram lindos e plenamente desenvolvidos. Também aprendi coisas na maneira como ele treinava suas poses.
Eu entendia, é claro, que o que funcionava para Sergio não iria necessariamente servir para mim. Éramos mais como reflexos espelhados. Eu tinha ótimos bíceps e músculos dorsais, mas seus deltoides dianteiros, tríceps e peitorais eram melhores que os meus. Para derrotá-lo, eu teria que trabalhar esses músculos muito, muito mais pesado e aumentar o número de séries. Suas outras grandes vantagens eram anos de experiência e um excelente potencial natural – ele realmente era um animal. Acima de tudo, porém, o que me inspirava em Sergio era sua energia. Eu disse a mim mesmo que precisaria estar à sua altura.
Sabia quem poderia me ajudar a fazer isso. Na Califórnia, tinha parceiros de treino de nível internacional. No entanto, praticamente desde o instante em que pisei lá, comecei a tentar convencer Joe a trazer Franco da Europa. Sentia saudades de muitos dos meus amigos da Alemanha, e eles deviam achar estranho o modo como eu havia desaparecido na Califórnia. Mas quem mais me fazia falta era Franco, pois nós dois éramos como irmãos e ele era o parceiro de treino perfeito para mim. Era estrangeiro como eu e, mesmo em Munique, nós dois tínhamos a mesma mentalidade de imigrantes e o mesmo tipo de ambição. A única coisa com a qual podíamos contar era o trabalho duro. Na minha cabeça, os Estados Unidos iriam ser um lugar tão bom para Franco quanto estavam sendo para mim.