– Tem toda a razão, não compreendo mesmo – falei.
Então me matriculei em um matéria em que estudávamos alguns números decimais e um pouco de álgebra simples, e comecei a reaprender a linguagem da matemática.
O orientador também me ensinou a encaixar as aulas na vida que eu levava.
– Soube que você é atleta, então as coisas talvez fiquem complicadas em determinados semestres. Como as grandes competições são sempre no outono, quem sabe você possa fazer apenas um curso durante o verão? Pode estudar uma vez por semana, das sete às dez da noite, depois do treino. Tenho certeza de que consegue.
Achei ótima a maneira como ele lidou comigo. Era muito bom poder acrescentar os estudos aos meus objetivos. Não havia pressão nenhuma, já que ninguém estava me dizendo: “Você tem que fazer faculdade. Precisa se formar em alguma coisa.”
Eu tinha também um professor particular na Gold’s: antes de ir treinar na Califórnia, Frank Zane dera aulas de álgebra na Flórida. Não sei por quê, mas na verdade vários fisiculturistas já tinham sido professores. Frank me ajudava com os deveres e as traduções, me dando explicações e trabalhando junto comigo quando eu não entendia. Na Califórnia, ele havia mergulhado fundo na filosofia oriental, na meditação e no relaxamento da mente. Mas só me interessei por essas coisas mais tarde.
Se eu houvesse detectado alguma ameaça séria à minha primazia, teria me concentrado totalmente no fisiculturismo, mas não havia ninguém no radar. Assim, desviei um pouco da minha atenção para outras ambições. Sempre anotava meus objetivos, como havia aprendido a fazer no clube de levantamento de peso lá em Graz. Não bastava apenas dizer a mim mesmo algo do tipo: “Minha resolução de ano-novo é perder 9 quilos, melhorar meu inglês e ler um pouco mais.” Não. Isso era apenas um começo. Naquela ocasião eu precisava especificar muito mais cada objetivo, para que todas essas boas intenções não ficassem apenas flutuando no ar. Assim, pegava fichas e anotava o que iria fazer:
– fazer mais 12 créditos na faculdade;
– ganhar dinheiro suficiente para economizar 5 mil dólares;
– malhar cinco horas por dia;
– ganhar 3 quilos de pura massa muscular;
– encontrar um prédio de apartamentos para comprar e morar.
Pode até parecer que eu estava me prendendo ao estabelecer objetivos tão específicos, mas na realidade era o contrário: essa lista me liberava. Saber exatamente aonde eu queria chegar me deixava livre para improvisar o caminho que iria percorrer para chegar lá. Os 12 créditos a mais que eu precisava cursar na faculdade são um exemplo. Pouco importava de onde eles viessem – isso eu decidiria depois. Daria uma olhada nos cursos oferecidos, em quanto cada crédito custava e se eles se encaixavam nos meus horários e nas regras do meu visto. Naquele momento, eu não precisava me preocupar com os detalhes exatos, porque já sabia que iria conseguir os tais créditos.
Minha condição de imigrante foi um dos obstáculos que precisei contornar enquanto cursava a faculdade. Eu tinha um visto de trabalho, não de estudante, de modo que só podia estudar em meio período. Nunca podia fazer mais de dois cursos ao mesmo tempo em uma faculdade só, então tinha que ficar trocando de instituição. Por isso, estudei também no West Los Angeles College e fiz cursos de extensão no campus de Los Angeles da Universidade da Califórnia (UCLA). Percebi que isso seria problemático se eu quisesse obter um diploma, pois teria que vincular todos esses créditos entre si para poder validá-los. Meu objetivo, porém, não era um diploma. Tudo o que eu precisava fazer era estudar o máximo que pudesse no meu tempo livre e aprender como os americanos administravam seus negócios.
Assim, no Santa Monica College as aulas de inglês se transformaram em inglês, matemática, história e administração de empresas. Na Escola de Administração da UCLA fiz cursos de contabilidade, marketing, economia e administração. Já tinha estudado contabilidade na Áustria, é claro, mas nos Estados Unidos foi totalmente diferente. Os computadores eram uma novidade que acabara de surgir: usavam-se máquinas enormes da IBM, com cartões perfurados e fitas magnéticas. Gostei de aprender sobre isso, pois para mim aquela era a maneira americana de fazer as coisas. A faculdade combinava com meu temperamento disciplinado. Eu gostava de estudar. Era muito agradável ter que ler livros para fazer trabalhos e participar dos debates em sala de aula. Eu também gostava de estudar com os outros alunos, que convidava para tomar café e fazer os deveres comigo no meu apartamento. Os professores incentivavam essa prática: se alguém não entendesse alguma coisa, outro aluno podia explicar. Isso tornava as discussões em sala bem mais eficazes.
Um dos cursos exigia que lêssemos o caderno de negócios do jornal diariamente, a fim de nos prepararmos para discutir as manchetes e matérias durante a aula. Então abrir o jornal no caderno de negócios se tornou meu primeiro hábito matinal. O professor dizia: “Temos aqui uma matéria interessante sobre como os japoneses compraram uma siderúrgica americana, desmantelaram-na inteira e tornaram a montá-la no Japão. Agora estão produzindo aço mais barato do que aqui e revendendo com lucro para os americanos. Vamos falar sobre isso.” Eu nunca conseguia prever o que me deixaria impressionado. Um palestrante convidado da UCLA nos disse que, em vendas, quanto mais corpulento o vendedor, mais probabilidade tinha de fechar negócios. Achei isso fascinante, porque sou um cara grande. Pensei: “Bom, eu peso 113 quilos, então, quando for vender alguma coisa, meu negócio vai ter que ser imenso.”
Também arrumei uma namorada firme, fato que teve uma influência tranquilizadora na minha vida. Não que fosse difícil conhecer mulheres. Assim como o rock, o fisiculturismo tinha suas próprias tietes. Elas viviam por perto, nas festas, nas exibições, às vezes até nos bastidores das disputas, se oferecendo para ajudar a passar óleo nos competidores. Apareciam na academia e na praia para nos ver malhar. Dava para ver na hora quais estavam disponíveis. Bastava ir a Venice Beach para conseguir 10 números de telefone. Mas Barbara Outland era diferente, pois gostava de mim como pessoa e nem sequer sabia o que era fisiculturismo. Nós nos conhecemos na delicatéssen Zucky’s em 1969. Um ano mais nova que eu, ela era universitária e estava trabalhando como garçonete no verão. Começamos a sair juntos e tínhamos longas conversas. Meus amigos da academia logo começaram a zombar de mim: “Arnold está apaixonado.” Quando Barbara voltou para a faculdade, fiquei pensando nela e chegamos a nos corresponder – coisa que eu jamais tinha feito.
Eu gostava de namorar, de ter alguém que visse com mais frequência. Podia compartilhar a vida de Barbara, sua carreira de professora, a escola em que ela trabalhava e seus objetivos. Podia dividir com ela minha ambição, meus treinos, meus altos e baixos.
Ela era muito mais uma garota normal do que uma mulher fataclass="underline" loura, pele queimada de sol, saudável. Estava estudando para se tornar professora de inglês, e era óbvio que seu objetivo comigo não era apenas diversão. Suas amigas que namoravam estudantes de direito e medicina me achavam estranho, mas Barbara não ligava. Ela me admirava por anotar meus objetivos em fichas de papel. Seus pais foram maravilhosos comigo. No Natal, cada membro da família me deu um presente – e mais tarde, quando levei Franco, ele também ganhou presentes. Barbara e eu fomos juntos ao Havaí, a Londres e a Nova York.
Em 1971, quando ela se formou e se mudou para Los Angeles para começar a trabalhar, Franco estava se preparando para sair do apartamento. Ele também estava sossegando o facho: começara a estudar quiropraxia e ficara noivo de uma moça chamada Anita, que já era estabelecida como quiroprática. Quando Barbara falou em ir morar comigo, isso me pareceu totalmente natural, uma vez que ela já passava mesmo muito tempo na minha casa.