Meu velho amigo Artie Zeller teve um choque ao me ver fechar um negócio de 215 mil dólares. Passou dias me perguntando como eu tivera coragem para tanto. Ele não conseguia entender, porque jamais quisera correr risco nenhum na vida.
– Como é que você aguenta a pressão? A responsabilidade de alugar os outros cinco apartamentos é toda sua. Você vai ter que cobrar os aluguéis. E se alguma coisa der errado? – Ele só via os problemas. Poderia ser um horror. Os inquilinos poderiam ser barulhentos. E se alguém chegasse em casa bêbado? E se alguém escorregasse e eu fosse processado? – Você sabe como é esse negócio de processo aqui nos Estados Unidos! – E blá-blá-blá.
Eu me peguei prestando atenção ao que ele dizia.
– Artie, você quase conseguiu me assustar – falei, rindo. – Pare de ficar me falando essas coisas. Eu quero sempre meter a cara nas coisas. Primeiro me meto no problema, depois penso no que ele realmente significa. Não fique colocando o carro na frente dos bois.
Muitas vezes, é mais fácil tomar uma decisão quando não se tem tanta informação à disposição, porque nesse caso não se fica pensando demais. Se souber demais, você pode ficar paralisado. E a coisa toda vira um campo minado.
Eu já havia reparado que o mesmo acontecia na faculdade. Nosso professor de economia tinha dois doutorados, mas dirigia um fusca. A essa altura, já fazia muitos anos que meus carros eram melhores que o dele. Pensei: “Saber tudo na verdade não é a solução, porque esse cara não está ganhando dinheiro suficiente para ter um carro maior. Ele devia estar dirigindo um Mercedes.”
CAPÍTULO 9
O maior show de
músculos de todos os tempos
OS TÍTULOS DE MISTER OLYMPIA me transformaram em tricampeão de uma disputa mundial da qual 99% dos americanos jamais ouvira falar. Além disso, o fisiculturismo não era apenas um esporte desconhecido – se você perguntasse a um americano comum o que ele achava dos praticantes dessa modalidade, tudo o que ouviria eram os pontos negativos:
“Esses caras só pensam em músculos. São uns desajeitados que não conseguem nem amarrar os próprios sapatos.”
“Tudo aquilo vai virar gordura e eles vão morrer cedo.”
“Todos eles têm complexo de inferioridade.”
“São todos uns burros.”
“São todos narcisistas.”
“São todos homossexuais.”
Não havia um único aspecto positivo nessa imagem. Um jornalista chegou a escrever que o esporte tinha o mesmo apelo de uma luta livre de anões.
É verdade que os fisiculturistas se olham no espelho durante o treino. Espelhos são ferramentas para eles, assim como para os bailarinos. Como fisiculturista, você precisa ser seu próprio treinador. Quando está fazendo rosca bíceps com halteres, por exemplo, tem que verificar se um braço está acompanhando o outro.
O esporte tinha tão pouco prestígio que era quase como se não existisse. Para mim, o fisiculturismo sempre fora algo tão americano que eu ainda me espantava quando as pessoas não conseguiam adivinhar o que eu fazia. “Você é lutador?”, perguntavam. “Que corpo! Não, não, já sei, você é jogador de futebol americano, não é?” Elas davam qualquer palpite, menos fisiculturismo.
Na verdade, havia muitos mais fãs do esporte nos países do Terceiro Mundo. Em uma exibição na Índia, uma multidão de 25 mil pessoas se reuniu para ver Bill Pearl, e 10 mil apareceram na África do Sul. O fisiculturismo era uma das atividades esportivas com mais espectadores no Oriente Médio. Um dos grandes marcos da carreira de Joe Weider ocorreu em 1970, quando a comunidade internacional reconheceu o fisiculturismo como esporte. A partir daí, os programas dessa modalidade puderam se beneficiar do patrocínio público em dezenas de países que apoiavam o esporte.
No entanto, já fazia quatro anos que eu estava nos Estados Unidos e praticamente nada havia mudado. Todas as cidades grandes ainda tinham apenas uma ou duas academias onde os fisiculturistas podiam treinar. As competições maiores nunca esperavam atrair mais de 4 ou 5 mil fãs.
Isso me incomodava, porque eu queria ver o esporte explodir e os atletas, não só os organizadores, ganharem dinheiro. Também achava que, se milhões de pessoas iriam assistir aos meus filmes algum dia, era muito importante que soubessem de onde vinham aqueles músculos e o que significava ser Mister Universo, Mister Olympia ou Mister Mundo. Portanto, era preciso muita divulgação. Quanto mais popular a modalidade se tornasse, melhores seriam minhas chances de conseguir um papel principal no cinema. Joe Namath, por exemplo, quarterback do New York Jets, famoso time de futebol americano, não tinha a menor dificuldade para ser contratado para comerciais e filmes. Nos esportes principais – futebol americano, beisebol, basquete e tênis –, os melhores atletas simplesmente cruzavam essa ponte e faturavam alto. Eu sabia que isso nunca iria acontecer comigo, então tinha que ir além. Queria promover o fisiculturismo, tanto para que mais pessoas pudessem participar quanto para facilitar minha carreira.
Joe Weider, porém, estava bastante satisfeito com sua situação no momento. Por mais que eu o instigasse, ele não queria tentar ampliar seu público para além dos fãs de fisiculturismo e dos adolescentes de 15 anos. “Essas coisas parecem uma revista em quadrinhos”, dizia eu, referindo-me às suas publicações. “‘Como Arnold maltratou as próprias coxas’? ‘Alô, eu gostaria de falar com o bíceps do Joe’? Que manchetes ridículas são essas?”
“Esses títulos vendem”, respondia ele. Sua tática era manter a qualidade dos produtos e aproveitar qualquer oportunidade para expandir a distribuição mundial. Com certeza era uma tática inteligente, porque o público não parava de aumentar. Mas eu percebi que, se quisesse promover o esporte para um público novo, teria que dar meu próprio jeito.
No outono de 1972, estava passando por Nova York a caminho da Europa quando conheci as duas pessoas que me colocariam no rumo que eu pretendia seguir: George Butler e Charles Gaines. Butler era fotógrafo e Gaines, redator. Ambos trabalhavam como freelancers para a revista Life. Estavam prestes a cobrir a disputa de Mister Universo organizada por Joe Weider no Iraque. Alguém tinha lhes dito que eles deveriam conversar comigo para entender o contexto do fisiculturismo.
Mal pude acreditar em minha sorte. Eles foram os primeiros jornalistas fora do mundo do fisiculturismo com quem realmente conversei. Deviam ter acesso a cerca de 1 milhão de leitores que jamais tinham ouvido falar no esporte. Eram mais ou menos da mesma idade que eu, e nos demos bem logo de cara. Gaines já sabia bastante sobre o esporte: acabara de publicar um livro chamado Stay Hungry (O guarda-costas), ambientado em uma academia de fisiculturismo no Alabama. O livro fora um sucesso de vendas. No verão anterior, ele e Butler tinham se juntado para produzir uma reportagem para a revista Sports Illustrated sobre um concurso chamado Mister Costa Leste que era realizado em Holyoke, Massachusetts. E já estavam falando em continuar a escrever sobre o assunto depois da matéria da Life e publicar um livro. Sabiam que aquele era um assunto fascinante, ainda desconhecido pela maioria dos americanos.