Eu não iria competir em Bagdá, mas prometi a eles que, se quisessem conhecer a cena do fisiculturismo na Califórnia, eu organizaria uma visita e seria seu guia. Dois meses depois, os dois estavam sentados na minha sala de estar em Santa Monica, conhecendo Joe Weider. Eu acabara de apresentá-los, e a situação no início foi um pouco hostil. Apesar de Charles estar envolvido com o fisiculturismo havia apenas três ou quatro anos, e George ainda menos que isso, os dois chegaram como sabichões arrogantes. Não paravam de perguntar a Joe por que ele não impulsionava o esporte nesta ou naquela direção, por que não angariava patrocinadores corporativos e outras coisas do tipo. Por que ele não chamava o ABC’s Wide World of Sports para cobrir seus eventos? Por que não contratava relações-públicas? Pude ver que Joe estava achando que eles não entendiam absolutamente nada, que eram jornalistas e viam tudo de fora. Não sabiam nada sobre os indivíduos e as personalidades do esporte, nem sobre o desafio que era tentar atrair as grandes empresas. Não era só estalar os dedos e dizer “Isso é fisiculturismo!” para conseguir elevar a modalidade ao patamar em que estavam o tênis, o beisebol ou o golfe.
Mesmo assim, o bate-papo acabou sendo produtivo. Weider convidou-os para visitar a sede de sua empresa, no Vale de São Fernando, no dia seguinte. Os dois o acompanharam e observaram como ele administrava tudo. Nessa época o fisiculturismo estava começando a se popularizar. Acho que no início foi difícil para Joe. Ele estava tentando entender como lidar com um tipo totalmente novo de atenção e não achar que alguém estava tentando se apropriar de seu negócio, superá-lo ou roubar seus atletas. Acho que estava com um pouco de medo. Apesar disso, acabou apreciando a perspectiva de quem estava de fora que os jornalistas tinham do esporte. Em pouco tempo começou a publicar fotos de Butler e matérias assinadas por Gaines em suas revistas.
Eu estava bem no meio disso tudo. Conseguia ver os dois lados e achei a novidade boa, pois sabia que o fisiculturismo precisava de sangue novo. Fiquei imaginando se, ao trabalhar com Butler e Gaines, eu também conseguiria me tornar conhecido – e ganhar distanciamento suficiente para repensar o esporte e encontrar formas de melhorar sua reputação junto ao público.
Ao longo dos meses seguintes, o livro que Butler e Gaines planejavam publicar começou a tomar forma. Ao fazer as pesquisas para Pumping Iron: The Art and Sport of Bodybuilding (Levantar ferro: A arte e o esporte do fisiculturismo), os dois se tornaram figuras conhecidas na Gold’s. Eram caras divertidos e acrescentavam uma dimensão inteiramente nova ao leque habitual de personagens daquele mundinho. Charles Gaines era um rapaz bonito e seguro de si, de uma família rica de Birmingham, Alabama. Seu pai era um homem de negócios e seus amigos frequentavam o country club. Tivera uma adolescência desregrada, largara os estudos por um tempo e percorrera o país inteiro pegando carona. Ele sempre dizia que ter descoberto o fisiculturismo o ajudara a sossegar. Charles acabou se tornando professor e amante de atividades ao ar livre. Quando nos conhecemos, ele vivia na Nova Inglaterra com a mulher, uma pintora.
Charles havia identificado todo um mundo novo de subculturas esportivas fascinantes que não estavam recebendo a devida cobertura: não só o fisiculturismo, mas também a escalada no gelo e o esqui. Como era um rapaz atlético, experimentava esses esportes e depois escrevia a respeito deles. Charles sabia transmitir em palavras a sensação de se aprimorar como levantador de peso, de conseguir levantar 14 quilos a mais do que um mês antes.
George Butler parecia ainda mais exótico. Era britânico e fora criado entre Jamaica, Quênia, Somália e País de Gales. Seu pai era um britânico típico, muito rígido. George costumava contar histórias sobre como a disciplina em sua casa era rigorosa. Descrevia também como passava, quando era menino, metade do tempo no Caribe com a mãe enquanto o pai estava em algum outro lugar. Então, ainda bem jovem, fora mandado para um colégio interno. Mais tarde, estudara no colégio interno Groton, na Universidade da Carolina do Norte e no Hollins College e saíra dessas instituições com um milhão de conhecidos na alta sociedade de Nova York.
Talvez por causa de suas origens, George podia dar a impressão de ser um homem frio e meio afetado. Vivia reclamando de bobagens. Levava sempre, a tiracolo, uma bolsa da L. L. Bean contendo sua câmera fotográfica e um diário no qual fazia anotações o dia inteiro. Isso me parecia forçado, como se ele estivesse imitando Ernest Hemingway ou algum famoso explorador.
Mas George era exatamente aquilo de que o fisiculturismo precisava para construir sua nova imagem. Sabia fotografar de um jeito que fazia as pessoas exclamarem: “Nossa, que legal, olhem só!” Não tirava fotos posadas de músculos, que não atraíam o público em geral; em vez disso, clicava um fisiculturista com uma bandeira imensa dos Estados Unidos ao fundo. Ou então fotografava a cara de espanto das garotas de Mount Holyoke ao verem os atletas competirem. Os irmãos Weider não pensavam em coisas desse tipo.
George era capaz de pegar algo insignificante e transformar em alguma coisa. Ou talvez não fosse insignificante; podia ser apenas para mim, porque eu via aquilo todos os dias e fazia parte daquele universo, enquanto para ele se tratava de algo realmente excepcional. Certa vez, depois de um dia tirando fotos na Gold’s, ele me perguntou: “Como é que você consegue andar tão depressa pela academia sem esbarrar em ninguém?”
Para mim, a resposta era óbvia: quando outra pessoa passa, você sai do caminho! Por que esbarrar nos outros? George, contudo, via muito mais nisso. Algumas semanas depois, testemunhei-o transformando esse detalhe em uma história que contou a seus amigos intelectuais durante o jantar:
– Quando Charles e eu estávamos na academia, ficamos observando com muita atenção a maneira como os caras se movimentavam. Vocês acreditam se eu disser que, nas quatro horas que passamos lá, não vimos nenhum desses fisiculturistas imensos esbarrar em outro? Mesmo com a sala apertada, vários equipamentos e quase nenhum espaço livre, ninguém se encostava. Eles simplesmente passavam uns pelos outros como grandes leões dentro de uma jaula; simplesmente passavam, graciosos, sem se encostar.
Os amigos dele ficaram fascinados.
– Nossa, eles não se esbarraram nenhuma vez?
– Nenhuma. E outra coisa incríveclass="underline" Arnold nunca, nenhuma vez sequer, fez cara de mau quando estava treinando. Ele levantava cargas pesadíssimas sempre com um sorriso no rosto. Imaginem só! O que deve passar pela cabeça dele? O que será que ele sabe sobre o próprio futuro para estar sempre sorrindo assim?
Pensei: “Genial. Eu nunca seria capaz de articular as coisas desse jeito. Tudo o que diria é que gosto de ir à academia porque cada repetição e cada série me deixam um passo mais perto do meu objetivo.” No entanto, o modo como George se exprimiu, a cena que ele criou a partir da situação e a psicologia que usou me fizeram pensar: “Isso é marketing em sua forma mais perfeita.”
Quando ele percebeu que eu era divertido e gostava de conhecer gente nova, começou a me apresentar a várias pessoas em Nova York. Conheci estilistas, herdeiras e gente que fazia filmes de arte. Ele adorava juntar mundos diferentes. Em determinado momento, fez amizade com um cara que publicava uma revista para bombeiros. “Isso vai virar moda”, falou para todo mundo. “Revistas especializadas para bombeiros, integrantes das forças de segurança pública, bombeiros hidráulicos ou membros das Forças Armadas.” Ele estava muito à frente dessa tendência.
Além de ser fotógrafo, George também queria se tornar diretor de cinema e gostava muito da ideia de me pôr na tela. Filmou curtas-metragens que me exibiam treinando, indo à faculdade ou interagindo com as pessoas. Ele mostrava esses trabalhos a conhecidos seus e perguntava: “Não quer pôr esse cara em um filme?” Começou a tentar levantar dinheiro para um documentário sobre fisiculturismo para pegar carona no sucesso do livro.