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Quando os três se aproximaram, a porta traseira do táxi se abriu e uma lufada de ar frio invadiu o veículo.

Trevize saltou, depois de abotoar o casaco até em cima. Os outros dois o seguiram, Bliss com visível relutância.

Os três comporelianos não passavam de vultos informes. Usavam roupas muito folgadas, provavelmente com aquecimento elétrico. Trevize olhou-os com desdém. Em Terminus não havia necessidade de roupas aquecidas. A única vez em que pedira emprestado um casaco elétrico havia sido quando estava passando o inverno em Anacreon, um plane-in vizinho. Não tinha gostado da experiência. O traje se aquecia devagar e quando percebia que estava ficando quente demais, já estava munido em bicas.

Quando os comporelianos chegaram mais perto, Trevize observou, com indignação, que estavam armados. Não pareciam preocupados em esconder o fato. Pelo contrário; os três usavam coldres do lado de fora do casaco.

Um dos comporelianos se dirigiu para Trevize.

— Com licença, conselheiro — disse, rispidamente, ao mesmo tempo em que desabotoava o casaco do outro.

Apalpou o corpo de Trevize com movimentos rápidos e precisos. Examinou os bolsos do casaco. Quando Trevize se recobrou da surpresa, já tinha sido totalmente revistado.

Pelorat, de cara amarrada, estava passando por uma humilhação semelhante nas mãos de um segundo comporeliano.

O terceiro aproximou-se de Bliss, que não esperou até ser tocada. Ela, pelo menos, parecia conhecer as intenções dos desconhecidos, pois tirou o casaco e ficou ali parada, no vento gélido, usando apenas uma roupa leve.

— Pode ver que não estou armada — disse para o comporeliano, em um tom mais gelado que a temperatura que estava fazendo.

Realmente não tinha onde esconder uma arma. O comporeliano sacudiu o casaco, como se apenas pelo peso pudesse saber se continha uma arma (talvez pudesse) e recuou.

Bliss tornou a vestir o casaco e Trevize não pôde deixar de senti certa admiração pelo que a moça havia feito. Sabia que ela detestava o frio e no entanto havia ficado ali, vestida apenas com uma blusa fina e calças compridas, sem demonstrar o menor desconforto. (Então pen sou que talvez, em uma emergência, Bliss pudesse receber calor do res to de Gaia.)

Um dos comporelianos fez um gesto para que Trevize, Pelorat e Bliss o seguissem. Os outros dois comporelianos ficaram mais para trás. Os dois ou três pedestres que estavam na rua não demonstraram nenhum interesse pelo que estava acontecendo. Ou já estavam acostu-mados ou, o que era mais provável, tudo o que tinham em mente era chegar o mais depressa possível a um lugar abrigado do vento e do frio.

Trevize percebeu que os comporelianos tinham subido por uma rampa móvel. Agora estavam descendo, todos os seis, e passaram por um sistema de portas duplas quase tão complicado quanto o de uma espaçonave. O objetivo, sem dúvida, era não deixar o calor escapar.

De repente, estavam no interior de um grande edifício.

Capítulo 5

A Luta pela Nave

17

A primeira impressão de Trevize foi a de que estava participando de um hiperdrama... mais especificamente, de uma novela histórica passada no tempo do Império. Havia um cenário em particular, com poucas variações (talvez só existisse mesmo um cenário, usado por todos os produtores de hiperdramas), que representava a gigantesca cidade-planeta de Trantor no seu apogeu.

Ali estavam as praças espaçosas, o formigueiro de pedestres, os pequenos veículos correndo nas pistas reservadas para eles.

Trevize olhou para cima, quase esperando ver os aerotáxis entrando em túneis bem iluminados, mas pelo menos aquilo estava ausente. Na verdade, quando a surpresa inicial passou, Trevize se deu conta de que a escala da cena que estava presenciando era muito menor do que se estivesse na antiga Trantor. Afinal, era apenas um edifício e não parte de um complexo que se estendia por milhares de quilômetros em qualquer direção.

As cores também eram diferentes. Nos hiperdramas, Trantor era sempre representado em cores incrivelmente berrantes, e os trajes, de tão espalhafatosos, chegavam a ser ridículos. Todas essas cores e babados tinham um significado simbólico, pois serviam para mostrar a decadência do Império e particularmente de Trantor.

Nesse caso, porém, Comporellon não devia ter nada de decadente, pois o uso das cores só servia para confirmar as suspeitas de Pelorat.

As paredes eram todas pintadas em tons de cinza; os tetos eram brancos; as roupas da população, uma mistura de preto, cinzento e branco. De vez em quando aparecia uma roupa toda preta; ainda mais raramente, uma roupa toda cinzenta. Trevize não conseguiu ver ne-nhuma roupa toda branca. Os padrões, entretanto, eram todos diferentes, como se as pessoas, impedidas de variar nas cores, procurassem outras formas de manifestar sua individualidade.

O rosto dos transeuntes era impassível. As mulheres usavam o cabelo bem curto; o cabelo dos homens era mais comprido, mas puxado para trás para formar um coque. Quando se cruzavam, ninguém olhava para ninguém. Todo mundo parecia ocupado, como se tivesse um objetivo estreito em mente e não sobrasse tempo para mais nada. Homens e mulheres se vestiam da mesma forma; a diferença estava apenas no comprimento do cabelo, no volume dos seios e na largura dos quadris.

Os três foram conduzidos para um elevador que desceu cinco andares. Saíram do elevador e foram levados até uma porta onde estava escrito, com pequenas letras brancas em fundo cinza: “Mitza Lizalor, MinTrans”.

O comporeliano que ia à frente encostou o dedo no letreiro, que, depois de um momento, começou a brilhar. A porta se abriu e eles entraram.

Era uma sala grande e estava quase vazia. A falta de mobília talvez servisse para demonstrar, através do uso imoderado de espaço, a importância do ocupante.

Havia dois guardas do outro lado da sala, imóveis, os olhos fixos naqueles que entravam. O centro do aposento era ocupado por uma grande escrivaninha. Sentada atrás da escrivaninha estava uma mulher corpulenta, de olhos escuros e feições regulares. Duas mãos fortes e capazes, com dedos longos e quadrados, repousavam sobre a mesa.

O MinTrans (Ministro dos Transportes, concluiu Trevize) usava um traje cinza-escuro no qual se destacavam duas grandes faixas brancas, que se cruzavam no peito. Trevize notou que embora o corte do vestido disfarçasse a saliência dos seios, as faixas atraíam a atenção para eles.

O ministro era indubitavelmente uma mulher. Mesmo ignorando os seios, bastava observar os cabelos curtos e as feições delicadas, embora sem nenhuma maquilagem. A voz também era feminina, um rico contralto. Ela disse:

— Boa tarde. Não é todo dia que temos a honra de receber dois homens de Terminus... e uma mulher de origem desconhecida. — Os olhos passearam de um para outro e afinal se detiveram em Trevize, que estava de pé, muito sério, em rígida posição de sentido. — Além de tudo, um dos homens é membro do Conselho.

― Do Conselho da Fundação — completou Trevize, tentando parecer o mais arrogante possível. — Conselheiro Golan Trevize, em missão especial.

— Em missão especial? — repetiu a ministro, interessada.

— Em missão especial — reafirmou Trevize. — Por que, então, estamos sendo tratados como bandidos? Por que fomos sequestrados por guardas armados e trazidos para cá como prisioneiros? O Conselho da Fundação não vai ficar nada satisfeito quando souber disso.

— A propósito — interveio Bliss, sua voz parecendo um pouquinho esganiçada em comparação com a da mulher mais velha —, por quanto tempo vamos ter que continuar de pé?