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– Bem, acho que eu poderia, mas isso ia tirar toda a diversão, né? De qualquer forma, basta ver o vídeo com Gwynnie e depois vamos conversar sobre ele, o.k.?

– Tudo bem – disse ela, alegremente. – Eu amo você, papai.

Então ela explodiu um grande beijo no telefone.

– Eu também amo você – disse, calorosamente, e mandei-lhe um beijo de volta.

Depois, desliguei o telefone, lutei contra as lágrimas e voltei ao fim da fila de novo, esperando minha vez. Dez minutos depois, eu estava discando para Southampton.

Primeiro eu ouvi a voz da KGB:

Alloa?

Então a voz gravada da telefonista: “Esta é uma chamada a cobrar a partir de uma prisão federal. Se você deseja aceitar, por favor, pressione 5 agora, se você não quiser aceitar, pressione 9 ou desligue o telefone, se você deseja bloquear as chamadas deste número de forma permanente, pressione 7-7 agora”.

E então houve um silêncio.

Ah, meu Deus!, pensei. KGB não conseguia entender as instruções! Eu gritei para o telefone:

– Yulia! Não pressione 7-7! Senão nunca vou poder ligar para você de volta! Não pressione 7-7!

Olhei em volta procurando um rosto amigo. Um homem negro muito alto era o próximo da fila. Ele estava olhando para mim, com uma expressão divertida. Balancei a cabeça e disse:

– Minha namorada é estrangeira. Ela não entende a mensagem...

Ele sorriu de maneira cordial, expondo uma notável ausência dos dentes incisivos.

– Acontece o tempo todo, xará. É melhor desligar antes que ela aperte o 7-7. Se ela fizer isso – o telefone fez bip-bip –, você está fodido.

Nesse momento escutei um clic alto. Com o coração apertado, levantei o fone e olhei para ele com curiosidade. Então me virei para o imponente homem negro e disse:

– Eu acho que ela pressionou 7-7.

Ele balançou a cabeça e deu de ombros.

– Então, você está ferrado.

Eu estava prestes a desligar quando ele disse:

– Você tem outro número em casa?

Eu assenti com a cabeça.

– Sim, por quê?

Ele apontou para o telefone.

– Então ligue para ele. Eles não bloqueiam a casa inteira, só aquela linha.

– Mas você não se importa? – perguntei nervosamente. – Pensei que só fosse uma ligação de cada vez.

Ele deu de ombros.

– Vamos, ligue para sua garota. O que não me falta aqui é tempo.

– Obrigado!

Mas que cara fantástico! Primeiro Ming, o Impiedoso, e então esse negro da altura de uma torre. Essas pessoas não eram tão más assim, eram? Principalmente esse cara. Ele era um verdadeiro cavalheiro. Mais tarde descobri que ele estava enfrentando 20 anos por causa de extorsão.

Virei-me, disquei o número novamente e então ela atendeu. Suas primeiras palavras foram:

– Ah, meus Deus! Maya lubimaya! Ya lublu tibea!

– Eu também te amo – respondi suavemente. – E aí, está aguentando bem?

– Aguentando o quê? – perguntou ela, com uma fungada confusa.

Caramba, pensei. Apesar de tudo, era o suficiente para deixar qualquer um louco.

– Eu quero saber se você está bem.

Da... – disse ela, com tristeza. – Eu... Bem... – e depois – Ah, Ah... meus Deus... Eu... Ah, meus Deus – e começou a chorar incontrolavelmente.

Por mais que eu tentasse, não conseguia deixar de pensar que eu encontrava conforto em seus soluços. Era como se cada soluço, cada lágrima, cada fungada fosse uma forma de ela reafirmar seu amor por mim. Fiz uma nota mental de contar cada “Eu te amos” que ela falasse por dia. Quando eles começassem a diminuir, eu saberia que o fim estava próximo.

Naquele dia, definitivamente, o fim não estava nem um pouco à vista. No momento em que parou de soluçar, ela disse:

– Eu não me importo quanto tempo demorar, eu espero por você para sempre. Eu não vou sair de casa até que você esteja casa.

Fiel à sua palavra, foi exatamente o que ela fez.

Quando minha primeira semana atrás das grades estava chegando ao fim, ela estava lá a cada vez que eu ligava para Southampton. Segundo as regras da cela, você podia falar pelo tempo que quisesse em cada chamada, e algumas vezes nós falávamos por horas a fio. Isso era bastante irônico, pensei, considerando que nunca tínhamos conversado muito quando eu estava do lado de fora. Nosso relacionamento se baseara principalmente em sexo e, quando não estávamos fazendo amor, a gente estava comendo, dormindo ou discutindo sobre qual livro de história era mais preciso.

Agora, no entanto, nós não tínhamos essas discussões. A gente parecia concordar em tudo, muito porque evitávamos falar de assuntos que fossem vagamente relacionados com história, política, economia, religião, gramática e, claro, a Lua. Em vez disso, falávamos de coisas simples, como todos os jantares maravilhosos que tínhamos compartilhado juntos... Todas aquelas pequenas fogueiras na praia... E como tínhamos feito amor a noite inteira. Mas, acima de tudo, a gente falava sobre o futuro, nosso futuro, e como, assim que tudo aquilo tivesse acabado, iríamos nos casar e viver felizes para sempre.

Quando não estava conversando com a KGB, eu estava lendo livro após livro, tentando me atualizar depois de anos me entretendo com sexo, drogas e rock and roll. Por mais tempo do que poderia me lembrar, eu havia desprezado a leitura, associando-a a tédio e chateação em vez de a admiração e prazer. Eu vi a mim mesmo como o produto de um equivocado sistema de ensino que enfatizara que nós deveríamos ler os “clássicos”, os quais, em sua maioria, eram chatos e ultrapassados. Talvez se eu tivesse sido forçado a ler Tubarão e O poderoso chefão, em vez de Moby Dick e Ulysses, as coisas tivessem sido diferentes. (Sempre buscando colocar a culpa em outro lugar.)

Então, estava tentando recuperar o tempo perdido, com a média de quase um livro por dia, e também escrevendo três cartas, uma para KGB e as outras duas para cada um de meus filhos. É claro, eu telefonava para as crianças todos os dias para dizer que os amava e que estaria em casa de volta em breve. Embora detestasse mentir para elas, eu sabia que era a coisa certa a fazer.

Como esperado, Carter foi fácil de enganar. Nós conversávamos sobre qualquer filme da Disney com o qual ele estivesse obcecado no momento e depois trocávamos alguns “eu te amo”. Nossas conversas não duravam mais que um minuto, e depois ele voltava para a feliz ignorância da infância.

Chandler, no entanto, já era outra história. Nossa conversa durava em média 15 minutos e, se no dia ela estivesse especialmente falante, podia se estender para quase uma hora. Eu não sabia exatamente sobre o que a gente falava durante todo esse tempo, mas, enquanto as semanas se arrastavam, notei que ela estava ficando cada vez mais obcecada com Passepartout. Em essência, ela estava usando o filme para manter controle do meu progresso, da forma como um adulto riscaria os dias em um calendário.

Ela ficava dizendo coisas como: “Passepartout fez isso, papai, e fez aquilo, papai”, como se eu pudesse de alguma forma aprender com os erros dele e acelerar minha viagem ao redor do mundo. Com a ajuda de Gwynne, ela tinha indexado o dia 10 de janeiro como o dia de minha chegada aos Estados Unidos, vindo de Yokohama, exatamente como Passepartout. No entanto, se ela pudesse me ajudar a descobrir uma maneira de viajar mais rápido ou simplesmente evitar um acidente, então talvez eu pudesse estar em casa para o Natal.

Então, quando eu lhe disse que estava em Paris, ela disse “Tenha cuidado quando você decolar em seu balão de ar quente, papai! Passepartout teve que subir no balão, e ele quase caiu!”. Tive de prometer que tomaria cuidado.

E quando eu disse a ela que estava indo para a Índia, ela disse “Tenha cuidado quando você montar em seu elefante, papai, porque Passepartout foi capturado por caçadores e teve que ser resgatado!”. E a partir daí o assunto se tornaria algo completamente inócuo, tipo seus novos amigos na escola, algo que ela tinha visto na TV, os brinquedos que ela queria para o Natal. Nunca, nem uma vez, ela trouxe à baila o nome de John Macaluso ou o de sua mãe. Se isso foi por acidente ou premeditado, eu não tinha certeza, mas eu podia sentir que Chandler tentava proteger meus sentimentos.