– Sim, acho que é. E vou fazer o que puder para ajudá-lo, mas você tem que ser paciente por um tempo. O próximo ano vai ser agitado, há processos pendentes, os indiciamentos se aproximam, um monte de coisas ainda está no ar. Mas deve haver uma luz no final. De um ponto de vista logístico, porém, não sei se faz sentido você se mudar antes de cumprir sua pena. Quer dizer, o que você vai fazer: alugar uma casa e, em seguida, ir para a cadeia, logo depois de alugá-la?
Eu sorri e pisquei.
– Pode apostar que sim! Antes de eu ir para a cadeia, quero que meus filhos saibam que eu oficialmente me mudei para a Califórnia. Dessa forma, eles saberão que eu voltarei para lá quando sair. E quero passar minha última noite de liberdade com eles em uma casa que seja nossa, e não em um hotel. Todos dormiremos na mesma cama, cada um debaixo de um braço – parei por um momento, saboreando o pensamento. – É assim que eu quero passar minha última noite em liberdade.
Só então a porta se abriu e TOC entrou. Ele deu algumas farejadas no ar, com ar de desconfiança, e depois olhou para o cesto de lixo de metal, onde Alonso tinha jogado o cigarro. Então ele olhou para Alonso e disse:
– Então, até onde vocês foram sem mim? É que está ficando um pouco tarde.
Com grande entusiasmo, Alonso disse:
– Ainda estamos na mesma. É que nos desviamos um pouco...
Alonso comprimiu os lábios, suprimindo uma gargalhada.
Eu suprimi minha gargalhada também quando os últimos vestígios de cor deixaram o rosto de TOC.
DIFERENTEMENTE do seriado Law & Order, onde a emoção é palpitante e a tensão é tão espessa que você pode cortá-la com uma faca, os acontecimentos da vida real em um tribunal federal são completamente o oposto. O juiz Gleeson, por exemplo, fica no alto de sua bancada, às vezes parecendo interessado, às vezes parecendo entediado, ocasionalmente parecendo se divertir, mas sempre em completo controle. Não há explosões, discussões, pessoas que questionam a sabedoria de suas decisões nem qualquer coisa que possa levá-lo a se levantar da cadeira, inclinar-se para a frente sobre sua grande mesa, apontar o dedo e gritar: “Você está se excedendo, advogado! Sente-se ou será detido por desacato!”.
Eu testemunhei durante três dias, três dias indescritíveis, durante os quais pude notar que Fischetti era bastante competente, mas sem exagero. Ah, ele parecia bem bacana em seu terno de seda cinza de 2 mil dólares e sua gravata cinza, mas isso era tudo. Suas linhas de questionamento pareciam chatas e enfadonhas. Se eu estivesse sentado no júri, teria adormecido.
Alonso, no entanto, foi brilhante: organizado, eloquente, persuasivo, minucioso. Ele havia deixado Fischetti sem ter para onde ir, além de andar em círculos, falando e falando, e quanto mais ele falava, mais culpado o cliente parecia. Danny testemunhou também, assim como um punhado de outras pessoas, apesar de eu não ter certeza de quem e quantos. Quanto menos eu soubesse, melhor, explicou Alonso. Eu não estava em julgamento, afinal, era apenas uma testemunha.
Um mês mais tarde, eu estava sentado na minha cabana de caça suíça, debaixo da cabeça do alce indignado, quando recebi a ligação de TOC, bastante indignado.
– O julgamento foi anulado – gaguejou ele. – Eu não posso acreditar nisso! Como aquele júri não o condenou? Não faz sentido.
– Você consultou o júri depois? – perguntei.
Com nojo, ele respondeu:
– Sim, por quê?
– Bem, deixe-me adivinhar, só houve um que negou, certo?
Silêncio mortal no início, em seguida, ele completou:
– Como diabos você sabe disso?
– Apenas um palpite – disse eu. – Quer ouvir meu segundo palpite?
– Sim – respondeu ele, com cautela.
– O voto foi daquele safado na fila da frente, um de bigode, certo?
– Foi, isso mesmo – disse TOC. – Você está apenas supondo?
– Não exatamente – respondi, e contei a ele meus pensamentos, ou seja, embora não tivesse como provar, a anulação tinha as digitais do Demônio de Olhos Azuis por toda a parte.
– Não brinca! Você realmente acha isso?
– Sim, acho. Novamente, eu não tenho nenhuma prova, mas, não sei, você viu Gaito apenas sentado ali, tão calmo, tranquilo, em paz? Parecia um cara convencido, e Gaito pode ser qualquer coisa, mas não é um sujeito convencido, ele é humilde. Talvez eu seja louco, mas toda a cena me pareceu estranha, principalmente aquele jurado; ele parecia desinteressado, como se já tivesse tomado sua decisão de antemão.
TOC concordou, assim como fez Alonso quando compartilhei meus pensamentos com ele alguns minutos mais tarde, por meio de teleconferência. De qualquer maneira, não havia como provar nada, e Alonso se recusou a investigar, pois considerava isso o ato de um mau perdedor. Além disso, ele não tinha realmente perdido, a nulidade do julgamento simplesmente significava que Gaito teria de ser julgado de novo, o que aconteceu exatos seis meses depois.
Durante esses seis meses, de dezembro de 2000 a maio de 2001, queimei a maior parte do dinheiro que tinha me sobrado, assim como o pouco da paciência que ainda me restava com a KGB. Ela, eu tinha certeza, me desprezava no mesmo tanto que eu a ela. Infelizmente, eu nunca tinha sido bom para terminar relacionamentos, e aparentemente a KGB também não. Assim, continuamos noivos, passando nossos dias com sexo raivoso e discussões amargas, estas últimas muito relacionadas a pousos na Lua e coisas afins.
Infelizmente, Gaito foi condenado no segundo julgamento, e o júri chegou a um veredito em um único dia. Eu estava em casa quando recebi a notícia, e naquele momento me senti como o menor verme sobre a face da Terra. Eu tinha traído um amigo, que ficaria na cadeia durante praticamente uma década, porque tinha se recusado a trair um de seus amigos.
Danny, por sua vez, já tinha ido para a cadeia; na verdade, ele nem teve chance de testemunhar no segundo julgamento. Danny tinha sido preso na Flórida, em uma acusação relacionada a fraude de telemarketing ligada a memorabilia de esportes, ou algo assim – Gleeson o condenou no início de abril.
Quando o verão chegou, torrei com as crianças os poucos dólares que ainda tinha. Esse, sim, tinha sido um gasto apropriado, pensei, considerando que elas eram a única coisa boa em minha vida, de qualquer maneira. Quando me despedi delas no Dia do Trabalho, chorei por dentro, porque sabia que não iria vê-las de novo por um longo tempo. Apesar de Alonso manter sua palavra, tirando-me da prisão domicilar e me permitindo viajar sem restrições para a Califórnia, eu já não podia sustentar essas viagens.
Isso, no entanto, estava prestes a mudar.
CAPÍTULO 28
SAINDO DAS CINZAS
Foi cerca de uma semana depois do 11 de setembro, quando o país se preparava para a guerra, que minha onda de azar finalmente terminou. Eu estava colado à TV quando um velho amigo telefonou do nada e começou a me pedir conselhos sobre algo a que ele continuava se referindo como o boom do refinanciamento.
As taxas de financiamento de hipotecas tinham caído para mínimos históricos e os americanos faziam refinanciamentos em massa.
– Você pode me fazer um rápido favor? – perguntou ele.
– Sim – respondi. – Do que se trata?
– Eu queria que você em escrevesse um script para chamadas telefônicas de captação. Há uma fortuna que pode ser feita via telemarketing com esse negócio de refinanciamento.
Interessante, pensei, mas foi tudo que me passou pela cabeça. Eu estava tão deprimido com minha vida que as palavras dele passaram por mim como uma rajada de vento.
– Tudo bem – eu disse. – Fale um pouco sobre seu negócio e eu escrevo um script nesta tarde.