Com muito cuidado, segurei-a pelos ombros, da mesma forma que meu pai tinha me segurado. Então forcei um sorriso e disse:
– Está tudo bem, mãe. Esses quatro anos não são realmente quatro anos, após as deduções serão menos que dois. O tempo vai voar. Vai ficar tudo bem.
Ela balançou a cabeça, perplexa.
– Eu só não entendo como você recebeu a mesma pena que Danny. Essa é a única coisa que não faz sentido para mim.
– Sim – concordei. – Eu acho que parece um pouco injusto. Mas é assim que a vida é, às vezes, não é?
Ela assentiu com a cabeça. Na verdade, com a idade de 71 anos, ela sabia disso melhor que eu.
– De qualquer forma – continuei –, Gleeson estava certo, mãe, e você sabe disso. Acho que todo mundo sabe. Eu era o cérebro por trás da coisa toda, não Danny, e, depois de tudo o que aconteceu, como eu poderia me livrar de passar um tempo na cadeia? Além disso, Gleeson é um cara inteligente: ele sabe tudo sobre o programa de drogas e sobre bom comportamento. Então, ele só me condenou a dois anos, suficientes para me enviar uma mensagem, mas não para arruinar minha vida – e pisquei. – Além do mais, isso vai me dar uma chance de recuperar o atraso em algumas leituras, o que não é de todo ruim, certo? – outro sorriso forçado.
– Quando você e Nadine vão contar às crianças? – perguntou meu pai.
– Nós não vamos – disse eu, sem emoção –, pelo menos não ainda. Por que preocupá-los agora? Vamos esperar até antes de eu ir, então contaremos juntos. De qualquer forma, eu tenho de ir agora. Preciso arrumar minhas coisas.
– Ah, você está indo para a Califórnia? – perguntou minha mãe.
Eu sorri, orgulhoso.
– Não, mãe, eu não estou indo para a Califórnia, eu estou me mudando para lá.
Eles olharam para mim, incrédulos.
– Agora? – perguntou meu pai. – Você acha que faz sentido, com essa condenação pairando sobre sua cabeça?
– Não – respondi calmamente. – Eu tenho certeza de que não faz, mas ainda assim vou me mudar. Veja, eu fiz uma promessa para minha filha uma vez e não vou decepcioná-la. – Dei de ombros, como se quisesse dizer: “Às vezes o amor supera a lógica, certo?”. E então completei. – Eu sei que vocês compreendem.
As palavras não eram necessárias, afinal, eles eram pais também.
FOI ASSIM QUE me tornei residente do Estado da Califórnia, quer eles gostassem, quer não. Em uma semana, encontrei uma bela casa perto do mar, a menos de uma dúzia de quarteirões da casa de meus filhos, e estava fazendo exatamente o que havia jurado fazer a Alonso numa outra noite: tentando recuperar o tempo perdido, muito contente de passar meus últimos três meses de liberdade numa vida comum, cozinhando para as crianças, assistindo à TV com eles, levando-os para a escola, jogando futebol, voleibol e o que fosse.
Então, depois de uma extensão de três meses, o tempo acabou.
Era a virada do ano de 2004, um sábado ensolarado, e eu precisava me apresentar na cadeia na manhã seguinte. Da forma como eu via as coisas, eu tinha duas opções: eu poderia me apresentar por conta própria ou os delegados viriam me buscar. Embora nenhuma das duas fosse de fato eletrizante, eu havia me resignado à primeira. As crianças, é claro, não tinham a menor ideia, mas estavam prestes a descobrir.
Naquele exato momento, os dois estavam descendo as escadas, só sorrisos, enquanto a Duquesa, parecendo nervosa, vinha atrás deles. John e eu estávamos sentados na sala de estar, que, em uma última dose de ironia, tinha uma estranha semelhança com Meadow Lane: parede de trás de vidro, com uma fantástica vista para o oceano, móveis shabby chic (de um jeito um pouco mais formal, porém), dezenas de almofadas, panos e bugigangas espalhadas aqui e ali e lareira de pedra até o teto. Tudo aquilo revelava o que eu já suspeitava sobre a Duquesa o tempo todo: ela gostava de decorar suas casas de praia da mesma forma.
– Não se preocupe – disse John, que estava sentado à minha frente no sofá. – Vou tratar seus filhos como se fossem meus.
Eu assenti com a cabeça, tristemente.
– Eu sei que você fará isso, John. Confio em você mais do que você pode imaginar.
E, de fato, eu confiava. Eu tinha chegado a conhecer John bastante bem ao longo dos últimos seis meses. Ele era generoso, amável, responsável, carismático, alguém que cresceu na vida por conta própria e, acima de tudo, um homem que, fiel a suas palavras, tratou meus filhos como se fossem dele. Eles estariam seguros com John, eu sabia, e nada lhes faltaria.
– Ei, pai – disse Chandler alegremente quando se sentou a meu lado no sofá. – Por que essa reunião de família?
Carter, no entanto, não se sentou; quando estava a uns 5 metros do sofá, ele executou uma manobra e veio deslizando pelo piso de terracota com um par de meias brancas suadas. Ele agarrou o topo do sofá e saltou sobre as costas, como um acrobata, e caiu bem ao meu lado sem incidentes.
– Oi! – cantou alegremente e, então, se inclinou para trás e colocou os pés em cima de uma mesa de café australiana.
John, sempre disciplinador, lançou-lhe um olhar, ao que Carter revirou os olhos azuis e pôs os pés para baixo. Enquanto isso, a Duquesa sentou-se na poltrona ao lado de John. Ela ainda estava linda, um pouco mais velha, talvez, mas, considerando o que nós dois tínhamos vivido, ela parecia muito bem. Ela estava vestida casualmente, com calças jeans e uma camiseta, como John e eu. As crianças vestiam shorts, e a pele deles brilhava de juventude e saúde.
Respirei fundo e disse a eles:
– Venham aqui, pessoal. Tenho algo a falar para vocês e quero que vocês se sentem no meu colo enquanto faço isso.
Estiquei um braço para cada um deles.
Carter, em seus 25 quilos, imediatamente saltou para meu colo e se ajeitou na minha coxa direita, as pernas balançando entre as minhas. Em seguida, ele colocou os braços em volta de mim. Com apenas 8 anos e meio de idade, não percebia nada.
Mas Chandler se moveu lentamente, com mais cautela.
– É alguém doente? – perguntou, nervosa, ajeitando-se sobre minha outra coxa.
– Não – respondi suavemente –, ninguém está doente.
– Mas é uma má notícia, certo?
Eu balancei a cabeça, tristemente.
– Sim, querida, é. Eu tenho que ir embora por algum tempo, e apesar de não ser um tempo muito longo para um adulto, vai parecer uma eternidade para vocês.
– Quanto tempo? – perguntou ela, rapidamente.
Eu apertei os dois, trazendo-os para mais perto.
– Cerca de dois anos, gatinha.
Eu vi as primeiras lágrimas brotando nos olhos.
– Não! – disse ela, com urgência. – Você não pode ir embora de novo. Você acabou de se mudar! Não nos deixe!
Lutando contra as lágrimas, eu disse:
– Escute, quero que vocês dois ouçam com atenção... Muito tempo atrás, quando eu estava no mercado de ações, fiz algumas coisas que eram muito erradas, coisas das quais não estou orgulhoso agora; um monte de pessoas perdeu todo seu dinheiro por causa disso. Agora, depois de tantos anos, tenho que compensar o que fiz, o que significa que tenho de ir para a cadeia por um tempo e...
Ela caiu em meus braços.
– Ah, não, papai, não, por favor... – Chandler começou a chorar histericamente.
Eu tinha lágrimas nos olhos.
– Está tudo bem, Channy. É só...
E então Carter desmoronou em meus braços e começou a chorar histericamente.
– Ah, papai, não vá! Por favor...
Apertei-o mais, enquanto ele chorava em meu ombro.
– Está tudo bem – disse, fazendo carinho em suas costas. – Vai ficar tudo bem. – Então, falei para Channy: – Não se preocupe, gatinha, pode acreditar, você nem vai ver o tempo passar.