Olhei para Tommy, tentando manter uma cara séria.
– David é um bom homem – disse Tommy. – Você deveria contratá-lo.
– Quanto é? – perguntei a David.
– Sete livros por mês – respondeu ele, com orgulho. – Faço um excelente vanilla latte. Eu roubo xarope da cozinha.
– Claro, por que não? – respondi. Afinal, um livro de selos custava apenas 7,20 dólares. Assim, por 50,40 dólares, eu teria um verdadeiro mordomo de cadeia. – Você pode começar amanhã.
David inclinou-se e, em seguida, foi embora.
Tommy disse:
– Só tome cuidado se ele oferecer qualquer alimento cozido. Ele está na cadeia há 20 anos e passa a maior parte do dia capturando esquilos; então, deixa marinando em molho de soja e depois cozinha no micro-ondas – deu de ombros. – Têm um sabor muito bom, pelo que ouvi.
Passei um momento revendo aquela cena na cabeça e me perguntando como ele conseguia pegar os esquilos. Devia colocar algumas armadilhas, pensei. E então ouvi outra voz:
– Ei, Jordan?
Eu olhei para cima e vi um mexicano baixo na entrada.
– O que foi? – disse eu, com um sorriso.
– Sou Jimmy, o chefe da arrumação. A senhora Strickland me disse que você vai trabalhar para mim – a boa e velha Sra. Strickland! – Eu suponho que você realmente não queira trabalhar, certo?
– Absolutamente não – respondi rápido. – Quanto vai custar?
– Cem dólares por mês, e você nunca mais vai encostar no cabo de uma vassoura.
– Fechado – disse eu. – Como você quer ser pago?
– Peça a um amigo do lado de fora que envie uma ordem de pagamento para minha irmã todo mês. Daí ela enviará para mim.
– Muito bem – respondi, e, no momento em que ele se afastou, um sujeito de aparência italiana e com enormes dentes brancos e brilhantes enfiou a cabeça.
– Você é o Jordan? – perguntou.
Assenti.
– Sim, como posso ajudá-lo?
– Sou Russo, o cara que consegue as coisas por aqui. Eu estava assistindo ao seu jogo de tênis antes. Você é muito bom, mas acho que seria muito melhor com a raquete certa.
– O que você tem?
– Uma Head, Liquidmetal. Novinha.
– Quanto é?
– Setenta e cinco dólares.
– Vou levá-la. Como você quer ser pago?
Ele acenou.
– Não se preocupe com isso, a gente vê mais tarde. Você e eu vamos fazer um monte de negócios juntos, deixe-me buscar a raquete. – Ele se afastou.
Olhei para Tommy e disse:
– Mas que lugar maluco é esse aqui!
– Ah, você não tem ideia – ele disparou de volta. – Não é exatamente o que se chamaria de “cana dura”, rapaz. De fato, à noite, as pessoas dão uma escapada para os campos ao redor e pegam pacotes de seus amigos, e alguns deles até encontram as esposas para transar. É totalmente à vontade.
E de fato era.
Enquanto Tommy e eu passamos os dias seguintes trocando histórias de guerra, um fluxo aparentemente interminável de presos ofereceram seus serviços para mim. Tinha Miguel, o massagista mexicano (10 dólares por 60 minutos, sem final feliz); Teddy, o mestre retratista chinês (por 20 dólares você dava a ele uma foto de seus filhos e ele a recriava na aquarela); Jimmy, o homem de couro caipira (por 75 dólares ele fazia um livro de bolso estilo caubói para enviar à sua esposa em casa); Danny, o barbeiro gay (por seis latas de atum ele cortava seu cabelo enquanto tentava esfregar o pau contra seu joelho)... E assim por diante. Claro, havia ainda todos os chefs, que, usando uma combinação de alimentos comprados na intendência, plantados nos jardins, contrabandeados nos campos e roubados da cozinha, preparavam ótimas refeições no micro-ondas.
Foi assim que vivi: tudo do bom e do melhor atrás das grades.
Mas foi só depois da quarta noite conversando sobre nossas histórias de guerra que Tommy trouxe para a conversa algo que mudaria minha vida para sempre.
– Eu estive convivendo com malucos – disse ele –, mas você, meu caro, ultrapassou todas as medidas. Pedi para minha mulher dar um Google em você porque achei que estava cheio de merda e me enrolando, especialmente sobre aquele absurdo de afundar o iate. Quer dizer, isso é estranho! Quem afunda um iate? Mas ela disse que está tudo na internet.
– Sim – respondi com uma mistura de tristeza e orgulho. – Acho que vivi uma vida bem ferrada.
Tommy encolheu os ombros.
– Pode ser que sim, mas as histórias são hilárias, principalmente a maneira como você as conta, com todos os apelidos: o Cabeça Quadrada, o Chinês, Mad Max, o Sapateiro, especialmente a Duquesa, que gostaria de conhecer um dia.
Eu sorri.
– Bem, tenho certeza de que podemos organizar isso daqui a alguns anos. Eu e ela, na verdade, estamos nos dando bem atualmente, nada mais de atirar coisas um no outro.
Tommy ergueu as sobrancelhas.
– Vou lhe dizer o que você realmente tem de fazer.
– O quê?
– Escrever um livro.
Eu comecei a rir.
– Escrever um livro? Como vou escrever um livro? Eu não sei como escrever! Quer dizer, eu posso escrever, mas não um livro inteiro. Agora, se for para falar, aí, sim, eu posso fazer. Sou um orador muito bom, isso eu garanto a você. Coloque-me em frente a uma sala cheia de pessoas e eu faço todo mundo chorar!
– Não há diferença – disse ele, confiante. – Escrever é ter uma voz, e você tem uma das melhores vozes que eu já ouvi. Basta escrever sua história exatamente do jeito que você me contou.
– Tudo bem, vou tentar – respondi.
Então passei a semana seguinte tentando encontrar um ponto de partida para minha história. Algumas coisas muito estranhas tinham de fato acontecido durante toda a minha vida. Parecia uma série de eventos bizarros encadeados, um após o outro. Decidi fazer uma lista deles.
Em pouco tempo, me peguei pensando por que tantas coisas bizarras continuavam acontecendo comigo. Cheguei à conclusão de que as coisas não vinham acontecendo comigo, eu é que as atraía as coisas para mim. Era como se eu fosse um esganado compulsivo por castigos e punições. No topo da lista estava o desastre do iate; na parte inferior, o arremesso de anões. Decidi, então, começar a escrever.
Com caneta e papel na mão, sentei em um dos tranquilos quartos e comecei a escrever meu livro de memórias. Duas semanas depois, ainda estava no primeiro parágrafo. Eu li aquilo para mim mesmo. Depois li de novo. Nossa, era uma merda! Um monte de baboseiras sobre os homens em suas torres de marfim querendo saltar lá de cima depois da quebra da Bolsa de 1987. Quem dava a mínima para aquilo? Eu não dava. O que havia de errado comigo? Por que não conseguia escrever?
Decidi tomar um rumo diferente: iria falar sobre meus pais e como eles gostavam de comer no mesmo restaurante o tempo todo. Rapidamente escrevi quatro páginas. Olhei para elas, estavam de fato muito boas e me apressei a levá-las a Tommy, para a crítica dele.
– Tudo bem – disse ele, ansioso. – Vamos ver o que temos aqui.
E ele começou a ler, ler... Mas por que não estava rindo? Tinha uma ótima piada no primeiro parágrafo e ele tinha passado direto...
Um minuto depois, ele olhou para cima.
– Isso é realmente uma merda! – disse.
– Sério?
Ele assentiu com a cabeça rapidamente.
– Ah, sim, é muito ruim. Quer dizer, é absolutamente terrível. Não tem uma única qualidade redentora – encolheu os ombros. – Comece de novo.
– Mas, como, começar de novo? Você não leu o primeiro parágrafo?
Tommy me olhou diretamente nos olhos e disse:
– Quem se importa sobre essa coisa do restaurante? É chato pra caralho e normal demais. Deixe-me dizer uma coisa, Jordan. Há duas coisas sobre a escrita que você nunca pode esquecer: primeira, tudo gira em torno de conflito. Sem conflito, ninguém vai se importar. A segunda coisa é o máximo de. Você sabe o que significa o máximo?