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– Bem, quer fosse um preço alto ou não, o fato é que, quando chegamos ao depósito, eu já tinha uma boa ideia do que estava acontecendo na Great American Meat and Seafood: não havia territórios, brochuras, clientes que devessem ser atendidos nem salários de qualquer tipo. Era tudo na base da comissão. “Nós somos máquinas de captação de clientes”, disse o Pinguim assim que entramos no armazém. “É por isso que ganhamos tanto dinheiro.” Minha entrevista de trabalho ocorreu dentro de um escritório desorganizado na parte da frente do armazém. Durou oito segundos e meio, depois dos quais fui contratado. Eu ainda não tinha ouvido falar do teste do espelho na época, então apenas supus que tinha conseguido o trabalho porque era amigo de Elliot. Não sabia até então que eles iriam contratar qualquer um que tivesse batimentos cardíacos comprovados – dei de ombros inocentemente. – E então veio o programa de treinamento, que consistiu em dois dias em uma picape com Elliot. Sentei-me no banco do passageiro, observando, enquanto ele dirigia sem rumo, batendo na porta da casa das pessoas, tentando vender a comida. O discurso que ele usava era o de ser motorista de uma picape e ter um excesso de carga que não podia levar de volta para o freezer, por isso estava disposto a vender tudo a preço de custo, antes que a comida descongelasse e ele perdesse a mercadoria. E, para apoiar sua alegação, cada caixa tinha um preço inflacionado marcado nela. Enquanto estava vendendo, o Pinguim chamava a atenção para os preços e começava a dizer “Eu aceito 15 dólares por essa caixa e 15 dólares por aquela caixa…”. E, em seguida, sorria para o cliente e acrescentava: “Ei, eu prefiro vender a preço de custo a deixar descongelar tudo, certo?”.

– Ele estava mentindo descaradamente na cara de seus clientes! – rosnou a Bruxa.

Eu sorri por dentro.

– Sim, Michele, ele estava mentindo para seus clientes. Quero esclarecer que isso definitivamente me chocou no início. Aquilo que ele estava fazendo me parecia totalmente desprezível. Totalmente viscoso, nojento, sacana. Mas, é claro, o Pinguim tinha uma racionalização para tudo, inclusive para essa atitude. Estávamos em algum lugar da costa sul de Long Island quando abordei o assunto com ele. Elliot estava ao volante, em busca de “território virgem”, que era um termo “pinguinzístico” para um bairro do qual nunca ninguém tinha ouvido falar antes. Era início de tarde, e eu já o tinha visto fazer seu discurso mais ou menos meia dúzia de vezes até então, embora não tivesse vendido nenhuma caixa ainda. Foi quando comecei a falar: “Não consigo acreditar no golpe que é isso aqui, Elliot. Tem certeza de que isso é mesmo legal?”. Elliot olhou para mim como se eu tivesse acabado de cair de um caminhão de nabo e disse: “Olha quem está falando, seu hipócrita do caralho! Você não é o cara que costumava raspar o fundo das geladeiras de isopor para vender mais algumas bolas de sorvete?”. E deixou escapar uma bufada. “Isso aqui não é diferente, amiguinho. Além disso, as pessoas não podem nem mesmo encontrar essas caixas de comida no supermercado.” Eu balancei a cabeça e disse: “Sim, sim, eu entendo que a comida é ótima e estou muito feliz com tudo, mas nada disso muda o fato de que você é um mentiroso de merda!”. Parei por um momento e, em seguida, acrescentei: “E quanto a esse comentário de eu raspar o fundo da geladeira, isso só aconteceu por acidente, foi uma coisa meio automática”. “Claro, claro que foi”, chiou o Pinguim. “Foi tudo um acidente. Não dava para deixar o gelo separado de lado sem misturar, não.” Ele revirou os olhos para mim. “Enfim, o que estou fazendo com os preços é uma coisa que acontece em todos os lugares. Sério. Basta você andar em qualquer loja de joias ou de eletrônicos e conferir. Todo mundo age assim.”

Fiz uma pausa, deixando as palavras de Elliot pairando no ar. Então disse:

– Não há como negar que ele tinha razão em um ponto. Você vê isso em joalherias o tempo todo. Eles aumentam os preços e depois remarcam as etiquetas bem na sua frente, e assim você pensa estar fazendo um grande negócio – fiz nova pausa e continuei. – E esse lance de ter excesso de pedidos na picape não é muito diferente de todas essas lojas que você vê anunciando “queima de estoque”, “fechando a loja” ou coisa parecida. A maioria delas fica anunciando que vai sair do mercado por dez anos, e dez anos depois elas ainda estarão saindo do mercado…

Respirei fundo e continuei:

– De qualquer forma, passamos a maior parte do primeiro dia trabalhando em bairros de classe média, batendo na porta das pessoas e tocando a campainha. A rejeição foi absolutamente impressionante. Portas foram batidas em nossa cara a torto e a direito, com as pessoas basicamente nos dizendo para irmos para o inferno. Por volta das 2 horas da tarde, Elliot estava ficando pessimista. Ele começou a se lamentar para mim: “Ninguém quer comprar comida hoje” – balancei a cabeça e comecei a rir. – Aquilo foi triste de ver. Quer dizer, o pobre coitado estava quase chorando! Na praia, todo mundo nos amava, éramos tratados quase como celebridades por lá. Mas ali nós éramos tratados como leprosos. Ainda assim, de alguma forma o Pinguim conseguiu descarregar 12 caixas naquele dia, e no dia seguinte ele descarregou outras 16 – balancei a cabeça lentamente, ainda muito impressionado com a persistência dele. – Uma coisa que posso dizer sobre o Pinguim é que ele é um cara implacável. Ele se manteve vagando de porta em porta, batendo e tocando campainhas até que os nós dos dedos ficassem quase sangrando, mesmo enquanto engolia as lágrimas. Mas ele estava faturando em média 300 dólares por dia em comissões, portanto aquilo valia algumas lágrimas. Quer dizer, isso era muito dinheiro naquela época, especialmente para um moleque que tinha acabado de cair fora da faculdade de odontologia. Então, foda-se, eu pensei. Apesar de saber que era sacanagem, resolvi que era uma coisa que valia a pena tentar.

Fiz uma pausa e olhei para o TOC.

– Você quer adivinhar o que aconteceu a seguir?

TOC sorriu e balançou a cabeça algumas vezes.

– Nem consigo imaginar…

– Na verdade – retruquei –, de fato você não conseguiria imaginar, porque ninguém naquela empresa conseguiria. Já que o preço parecia ser a maior objeção das pessoas, então porque não tentar vender para os mais ricos? Ou melhor, para as pessoas ricas que eu conhecia? O problema era que eu realmente não conhecia ninguém rico, exceto pelo pai da minha namorada na faculdade, David Russell. Mas era uma situação que podia ser meio complicada, porque ele e sua esposa tinham acabado de se separar e eu não tinha ideia de onde ele estava vivendo. Ela, eu sabia, ainda estava vivendo na mansão em Westchester, mas eu não podia simplesmente bater à porta dela. Ela nunca gostou de mim, embora eu não possa imaginar por que – olhei para a Bruxa e disse: – O que há para não gostar, certo, Michele?

A Bruxa não disse nada nem sorriu; ela simplesmente ergueu a fina sobrancelha esquerda como se questionasse: “Você está brincando comigo, certo?”. Dei de ombros e disse:

– Bem, acho que ela teve suas razões. Mas, deixando isso de lado, tomei a melhor decisão que podia e fui até seu vizinho – balancei a cabeça uma única vez, o que denotava a correção daquela minha decisão. – Sim – contei com orgulho –, eu estacionei minha picape Toyota bem na frente da enorme porta do vizinho e pulei do carro, subindo a escada e batendo na porta. Lembro-me de tudo como se tivesse acontecido ontem. Era uma enorme casa no estilo colonial, com persianas de cor verde-floresta, e a porta da frente era maior que aquela que conduzia à Cidade das Esmeraldas. Era pintada de vermelho escuro e devia ter umas mil mãos de verniz sobre ela. Continuei batendo, até que, finalmente, depois de um minuto, uma senhora de seus 60 anos e aparência gentil, com cabelos grisalhos e óculos de vovó, veio até a porta e me disse: “Posso ajudá-lo, meu jovem?”. Ofereci a ela um sorriso triste e respondi: “Talvez a senhora possa. Meu nome é Jordan e eu entrego carnes e frutos do mar para alguns de seus vizinhos na região. Eu tenho um excesso de produtos na minha picape hoje e não posso levar isso de volta para o freezer. Estou disposto a vender-lhe tudo a preço de custo”. Lancei a ela meus grandes e tristes olhos azuis de cachorrinho e acrescentei: “Tem algum jeito de a senhora me ajudar?”. Ela olhou para mim por alguns segundos e, depois, em um tom maduro e repleto de ceticismo, perguntou: “Quem são esses vizinhos para quem você faz entregas?”. Sem perder o ritmo, respondi: “Para os Russells aqui ao lado”. De repente, me ocorreu que ela podia realmente telefonar para eles, então rapidamente acrescentei: “Na verdade, era para o senhor Russel, David, como ele gostava de ser chamado”, e então apertei os lábios e balancei a cabeça tristemente. “Mas, como sabe, com tudo que vem acontecendo por lá com essa história do divórcio, eles não têm comprado muita coisa de mim ultimamente”.