Fiz uma pausa e me recostei na cadeira, olhando para o Canalha.
– E foi simples assim, ela comprou toda a carga que eu trazia na picape de uma tacada só – dei de ombros. – Claro, eu me senti um pouco culpado por mentir para aquela senhora, mas a comida, bem, aquilo era de alto nível, para não mencionar o fato de que eu sozinho a inspirei a organizar uma reunião de família. Então foi tudo bem, certo?
– Sim, foi tudo bem – rosnou o Canalha.
Eu ignorei seu sarcasmo.
– Certo, foi tudo bem. Na verdade, foi tudo tão bem que, na minha primeira semana na empresa, vendi 240 caixas, o que foi mais que o dobro do recorde da empresa. E foi assim que tudo começou. A partir daí, uma cadeia de acontecimentos bizarros me levou para o mercado de ações e, em seguida, para a Stratton. Deixe-me conduzi-los por esse caminho na ordem em que os fatos aconteceram.
O Canalha aquiesceu uma vez com a cabeça.
– Por favor, faça isso.
Respondi com outro aceno.
– Tudo começou com o escritório da Great American. Foi como se toda a força de vendas da empresa subitamente pegasse fogo. A produção de todo mundo praticamente dobrou, de alguns caras até triplicou. Foi como se eu tivesse aberto uma tranca, um novo campo de possibilidades em relação ao dinheiro que podia ser feito se você trabalhasse duro e vendesse os produtos da maneira certa. Depois de uma semana, o gerente veio falar comigo e me perguntou se eu não poderia ajudar no treinamento dos novos vendedores. O nome dele era P. J. Cammarata. Ele disse: “Você bombou este escritório, Jordan, você bombou de um jeito que não se consegue acreditar…” e blá-blá-blá. Ele ficava falando sobre como eu tinha feito bem todas as coisas e tal…
Fiz uma pausa, chocado pela maneira como minhas lembranças desse momento eram bastante límpidas.
– Quando olho para trás e vejo o que aconteceu, penso que aquilo foi a única coisa inteligente que aquele sujeito disse na vida. Vejam, fazer essa pressão é crucial, porque sem ela a força de vendas murcha e morre mais rápido do que você pode imaginar.
– Então você concordou em treinar os vendedores? – perguntou o Canalha.
– Sim, mas por razões egoístas. Eu já estava pensando em começar minha própria empresa, era apenas uma questão de quando iria fazer isso. Pensei em comprar meu próprio caminhão, ir até o mercado de carnes e fazer o atacado também. Era o que eu tinha feito na praia todos aqueles anos e tinha dado muito certo – encolhi os ombros. – Então comecei a treinar os vendedores e rapidamente percebi que tinha um talento especial para isso. Na verdade, eu era tão bom que podia pegar praticamente qualquer moleque na rua e transformá-lo em um vendedor de carnes. Algumas semanas depois, P. J. me perguntou se eu daria uma palestra sobre vendas para o pessoal interno, para aumentar a motivação e a pressão.
Fiz uma pausa, refletindo sobre aqueles acontecimentos por um momento.
– É bastante irônico o fato de que um idiota como P. J., com seus jeans sujos e sua jaqueta de funcionário, tenha instigado um dos momentos definidores da minha vida. Veja, acima de tudo, era minha capacidade de falar diante da multidão, coordenando reuniões de vendas para os strattonitas, que residia no centro do meu sucesso. Foi isso o que manteve a bomba funcionando todos esses anos, apesar de todos os problemas regulatórios que tivemos.
– As reuniões? – o Canalha perguntou, me interrompendo.
– Sim, as reuniões. É o que separa ou, devo dizer, o que separou a Stratton das outras corretoras do país. Duas vezes por dia eu ficava diante de todos na sala de reuniões, pregando para os corretores. Ninguém em Wall Street tinha feito isso antes. Ocasionalmente uma corretora trazia um orador convidado, alguém como um Anthony Robbins da vida, mas foi sempre um negócio de um tiro só, não como parte de um programa regular. E isso é uma completa perda de tempo, quer dizer, fazer isso apenas uma vez. Se você quer resultados, tem de fazê-lo todos os dias; se você realmente quer muitos resultados, você tem de fazê-lo duas vezes por dia, uma de manhã e outra à tarde. Então, os milagres podem acontecer. Mas é claro que eu ainda não sabia de nada disso em meus dias de Great American… Embora eu seja obrigado a lhes dizer que minha primeira reunião foi de fato uma verdadeira revelação. Aconteceu dentro do armazém, em Forest Hills, no Queens. Havia uns 20 vendedores lá, a maioria deles com 20 e tantos anos. Estavam todos vestidos de jeans e tênis, tentando se parecer com motoristas de caminhão. Eles estavam dispostos em um círculo e eu de pé, no centro. No começo, falei devagar, exaltando a qualidade da comida, como ela era excepcional, destacando o fato de que não havia nada parecido no mercado e de como nossos clientes eram sortudos por ter acesso a ela. Em retrospecto, eu estava começando a lançar as bases de um culto, embora na época eu não tivesse consciência disso. E o fato de que…
TOC levantou a mão:
– O que você quer dizer com “lançar as bases de um culto”?
Olhei para ele e respondi:
– Deixe-me colocar desta forma: no coração de qualquer culto, seja ele a Stratton Oakmont, a Great American ou aqueles Davidianos loucos de Waco, no Texas, a crença fundamental é de que não interessa o que o resto do mundo está dizendo, todos são loucos e eles não. E, sem exceção, tudo sempre começa com a crença na justiça de sua causa. Com os extremistas muçulmanos, isso se demonstra em uma interpretação distorcida do Alcorão, com o Ramo Davidiano é uma interpretação distorcida da Bíblia, e na Stratton foi a sala de reuniões em si, o grande equalizador em um mundo que era, de outra forma, injusto. Em outras palavras, não tinha a menor importância se você nascera em uma família sem pedigree, se só tinha estudado até o ensino fundamental ou se seu QI era muito baixo. Uma vez que entrasse na sala de reuniões da Stratton, tudo isso ficava para trás. Você se igualava aos outros e poderia, a partir daí, ganhar tanto dinheiro quanto o mais poderoso CEO do país – dei de ombros, como se isso fizesse parte das coisas mais básicas.
E continuei:
– Todos os cultos sugam seu poder de um conceito como esse, de que eles possuem algum tipo de vantagem em relação ao mundo. No caso da Great American, era o fato de eles venderem um tipo de comida que não se conseguia encontrar nos supermercados; com a Stratton, era a promessa de ficar rico, mesmo que não tivesse completado o ensino fundamental e só merecesse trabalhar como atendente de uma loja de conveniência – dei uma risadinha irônica. – Foi por isso que eu disse antes: “Eu quero os jovens e os pouco instruídos, os jovens e os ingênuos”. Porque eles se tornam os melhores membros dessa seita.
E disse mais:
– Enfim, de volta à primeira reunião, depois de alguns minutos dizendo aos vendedores como aquela comida era boa, as palavras começaram a jorrar em torrentes. Era uma sequência perfeita de pensamentos, derramando-se de minha boca. E, antes mesmo que eu percebesse, estava ali pregando a eles, falando em detalhes íntimos sobre coisas que nunca tinham me ocorrido antes. E, mesmo assim, eu parecia ser o maior especialista do mundo nesses assuntos: coisas como a diferença entre vencedores e perdedores, o poder do pensamento positivo e como ser o mestre de seu próprio destino. Eu me tornei mais técnico e mergulhei na arte de vender, explicando como abrir e fechar uma venda, como modular a velocidade e o tom de sua voz para manter as pessoas interessadas e a importância de ser implacável, de não aceitar um não como resposta e bater nas portas até que os dedos comecem a sangrar. “Você deve isso a si mesmo!”, disse aos vendedores. “Você deve isso a si mesmo, você deve isso à sua família e, mais importante, você deve isso àquelas pessoas em cujas portas está batendo, porque a comida que está vendendo é tão incrível que cada pessoa que a comprar lhe será eternamente grata!”