Seja como for, era ali onde a Duquesa e eu morávamos e onde eu tinha acreditado que iríamos envelhecer juntos. Mas, enquanto a limusine passava pelos pilares de pedra que margeavam nossa propriedade de 6 hectares, comecei a pensar sobre o que acontecera.
Uma longa estradinha particular em formato de círculo, limitada por sebes impecavelmente aparadas, levava à nossa mansão de 10 mil metros quadrados projetada em estilo de castelo francês, com brilhantes torretas de cobre e janelas com caixilhos. No final daquela estradinha pavimentada, uma comprida passarela de paralelepípedos conduzia até a porta de mogno, de quase 4 metros de altura. Enquanto a limusine estacionava perto da porta de entrada, decidi fazer uma última tentativa com a Duquesa antes de entrarmos. Fiquei de joelhos e coloquei minhas mãos de cada lado de suas coxas. A Duquesa estava de pernas cruzadas e, como sempre, a pele dela estava sedosa. Resisti ao desejo de correr as mãos por todo o comprimento de suas pernas nuas. Em vez disso, levantei os olhos como os de um cachorrinho perdido e disse:
– Ouça, Nae, eu sei que isso tem sido difícil para você – difícil para você? – e realmente sinto muito por tudo o que vem acontecendo, mas já estamos juntos há oito anos, querida. E temos dois filhos maravilhosos! A gente vai superar isso – fiz uma pausa por um momento e assenti com a cabeça, para acentuar o efeito do que acabara de dizer. – E mesmo que eu acabe indo parar na cadeia, sempre vai ter alguém cuidando de você e das crianças. Eu prometo.
– Não se preocupe conosco – disse ela, friamente. – Você tem de se preocupar apenas consigo mesmo.
Estreitei os olhos e disse:
– Não entendo uma coisa, Nadine. Você faz parecer que está totalmente chocada com tudo que está acontecendo… Mas, quando nos conhecemos, não era como se eu estivesse sendo indicado para o Nobel da Paz. Eu estava sendo investigado e difamado por todos os jornais do mundo livre! – inclinei a cabeça para o lado, em um ângulo que implicava lógica, e continuei – O que eu quero dizer é que acho que seria uma coisa diferente se você tivesse se casado com um médico e depois descobrisse que ele vinha fraudando a Previdência durante os últimos 20 anos! Acho que, num caso desse, você teria justificativa! Mas, agora, tendo em vistas as circunstâncias…
Ela me cortou na hora:
– Eu não tinha ideia do que você andava fazendo… – Ah, então quer dizer que os 2 milhões em dinheiro na minha gaveta de meias nunca levantaram suspeitas em você? – … Nunca! E depois que eles levaram você embora, aquele tal agente Coleman ficou me interrogando por cinco horas, cinco horas direto, porra! – disse, e gritou as últimas quatro palavras, tirando minhas mãos de suas pernas. – Ele falou que eu também iria para a cadeia, a menos que lhe contasse tudo! Você me colocou em risco, seu filho da puta! Você me colocou em perigo. E eu nunca vou lhe perdoar por isso.
Ela balançou a cabeça, desgostosa, e olhou para longe.
Mas que merda! O agente Coleman a tinha deixado traumatizada. Lógico, ele tinha sido totalmente sacana, mas ainda assim ela estava me acusando de ser o responsável. Talvez fosse um bom presságio para nosso futuro juntos. Apesar de tudo, assim que visse que não corria risco nenhum, a Duquesa poderia mudar de opinião. Eu estava a ponto de explicar isso quando Nadine se virou para mim e disse:
– Eu preciso me afastar por um tempo. Os últimos dias foram muito estressantes para mim, e quero ficar sozinha. Vou para a casa de praia durante o final de semana e voltarei na segunda…
Abri a boca, mas nenhuma palavra foi articulada, apenas um pequeno suspiro. Quando finalmente consegui, perguntei:
– Você vai me deixar sozinho com as crianças, em prisão domiciliar?
– Exatamente!
Ela disse isso com orgulho, depois abriu a porta de trás do carro e pulou de seu assento num acesso de raiva. E assim, de repente, foi embora, marchando impetuosamente em direção à enorme porta da mansão, a bainha de seu minúsculo vestido subindo e descendo a cada passo. Fiquei olhando para o fabuloso traseiro da Duquesa por um momento, então pulei para fora do carro e a segui para dentro da casa.
NO SEGUNDO ANDAR da mansão, três grandes quartos ficavam no final do longo corredor a leste, enquanto um quarto aposento, a suíte principal, ficava do lado oposto. Nossos filhos ocupavam dois daqueles três quartos; o terceiro servia como quarto de hóspedes. Uma escadaria de mogno de 4 metros de largura subia em uma curva sinuosa, saindo de um grande vestíbulo de mármore lá embaixo.
Quando cheguei ao alto da escada, em vez de seguir a Duquesa até o quarto principal, que era o nosso, me virei e fui até os quartos das crianças. Encontrei os dois no quarto de Chandler, sentadinhos num glorioso tapete rosa. Já estavam de pijaminha, brincando alegremente. O quarto era uma pequena terra da fantasia rosa, com dúzias de bichinhos de pelúcia espalhados por todos os cantos. As cortinas, o tratamento que tinha sido dado à janela e o edredom de penas de ganso sobre a cama queen-size de Chandler tinham sido todos feitos ao estilo “Laura Ashley”, com uma paleta de tons pastel suaves e estampas florais. Era o quarto perfeito para uma garotinha, feito para minha menininha perfeita.
Chandler tinha acabado de completar 5 anos e era a cara da mãe, uma pequena top model loirinha. Naquele momento, ela estava envolvida em seu passatempo favorito: organizar suas 150 bonecas Barbie em um círculo perfeito ao redor dela, de forma que pudesse se sentar no meio e se tornar o centro das atenções. Carter, que já tinha completado 3 anos, estava deitado de bruços fora do círculo. Ele estava folheando com a mão direita um livro ilustrado, com o cotovelo esquerdo descansando no tapete e o queixinho apoiado na palma da mão. Seus enormes olhos azuis brilhavam por trás dos cílios, tão exuberantes quanto as asas de uma borboleta. O cabelo loiro platinado era tão fino como palha de milho e tinha pequenos cachos na parte de trás da cabeça que reluziam como vidro polido.
No momento em que eles me viram, levantaram-se e correram para mim.
– Papai tá em casa! – gritou Chandler.
Então Carter entrou na conversa:
– Papai! Papai!
Agachei-me e eles me abraçaram.
– Estava com saudades de vocês! – disse, enchendo os dois de beijos. – Ei, acho que vocês cresceram mais nesses últimos três dias! Deixe-me olhar para vocês.
Segurei as duas crianças bem na minha frente e depois inclinei a cabeça para um lado, estreitando os olhos desconfiadamente, como se estivesse inspecionando os dois.
Eles ficaram parados de pé, orgulhosos, ombro a ombro, os queixos ligeiramente erguidos. Chandler era bem grande para sua idade, e Carter era pequeno, então ela era quase uma cabeça e meia mais alta que o irmão menor. Apertei os lábios e assenti com a cabeça gravemente, como se estivesse dizendo: “Minhas suspeitas foram confirmadas!”.
Foi então que disse, em tom de acusação:
– Eu sabia! Vocês dois cresceram mesmo, seus danadinhos!
E ambos gargalharam deliciosamente. Foi quando Chandler perguntou:
– Por que você está chorando, papai? Você tem um dodói?
Sem que eu me desse conta, um fio de lágrimas tinha aberto caminho pelo meu rosto, descendo até o queixo. Sequei-o com a palma da mão e então ofereci à minha filha uma inofensiva mentira branca:
– Não, não estou com dodói, sua boba. É que eu fiquei tão feliz de ver vocês que isso me fez chorar de alegria.
Carter assentiu em concordância, mas logo foi perdendo o interesse naquela situação. Afinal, ele era um menino, e sua capacidade de atenção era limitada. Na verdade, Carter vivia apenas para cinco coisas: dormir, comer, assistir ao vídeo do Rei Leão, subir nos móveis da casa e observar os longos cabelos loiros da Duquesa, que o acalmavam tanto quanto se ele tivesse engolido 10 miligramas de Valium. Carter era uma pessoa de poucas palavras, de fato, mas era extremamente inteligente. Já em seu primeiro aniversário era capaz de fazer funcionar a TV, o aparelho de VHS e o controle remoto. Com 1 ano e meio era um chaveiro de mão cheia, abrindo as fechaduras com a precisão de um arrombador de cofres. E, aos 2 anos, já havia memorizado duas dúzias de livros ilustrados. Ele era calmo e equilibrado, contente com seu jeito.