– Porque ele foi indiciado também – disse Grover. – Ele está na cadeia com Kaminsky neste exato momento.
PARA MINHA SURPRESA, TOC ainda levou mais de três anos para conseguir uma acusação contra mim, apesar de Saruel ter começado a cooperar quase imediatamente. E, embora parte do atraso tivesse a ver com a lealdade de meus strattonitas, muito estava ligado ao fato de que eu havia recrutado o Chef para me ajudar a inventar uma história que me acobertasse. Na verdade, enquanto meu castelo de cartas estava desabando à minha volta, o Chef foi preparar uma de suas lendárias receitas. E essa receita em particular foi tão saborosa e tão deliciosa que manteve TOC coçando a cabeça por mais de três anos completos.
E agora o Chef era um homem procurado. Ele tinha um alvo dos federais plantado nas costas, e não apenas porque ele tinha me ajudado e instigado, ao ajudar a cobrir minha derrocada na lavagem de dinheiro, mas também por causa de seu relacionamento com o Demônio de Olhos Azuis. A gente aperta o Gaito, raciocinou o Canalha, e ele vai entregar o Brennan, que era o verdadeiro alvo.
Na verdade, eu não tinha tanta certeza disso. O Chef era alguém ferozmente leal ao Demônio, tinha vendido a alma a ele, por assim dizer, e era o tipo de cozinheiro endurecido em batalhas, que poderia suportar o calor na cozinha, preferindo, de fato, inventar suas receitas ao lado das chamas. O Chef não apenas amava a ação, ele vivia para a ação, e, depois de todos esses anos de trabalho com o Demônio, tinha se tornado completamente insensível. Coisas como medo, insegurança e autopreservação passaram a ser conceitos estranhos para o Chef. Se você fosse seu amigo, ele se ergueria ao seu lado; se estivesse em apuros, ele iria para a guerra por você; e se estivesse de fato encurralado de costas para a parede, e se a escolha fosse entre você e ele, ele cairia sobre a espada por você.
Talvez tenha sido esse o motivo, naquela mesma tarde, de o Chef ter desafiado a sabedoria convencional e atendido meu telefonema. Afinal, a primeira regra de ouro no meu mundo, ou seja, o mundo dos ladrões, vigaristas e canalhas, era: quando alguém fosse indiciado pelo FBI, você perderia seu número de telefone para sempre. Era como se tornar um leproso, e se um leproso realmente toca você ou não, isso realmente não importa. Basta chegar perto e ele infecta você do mesmo jeito.
Então, o dia seguinte seria o dia D, o plano simples e diabólico do FBI: o Chef viria até minha casa e eu estaria recheado de escutas. Depois de alguns minutos de conversa, eu casualmente traria o passado à baila e faria o Chef se incriminar. Por mais triste e deplorável que fosse essa atitude, que escolha eu tinha? Se eu não cooperasse, eles iriam acusar a Duquesa; se eu não cooperasse, meus filhos iriam crescer sem pai; se eu não cooperasse, correria o risco de me tornar o senhor Gower! Tudo o que eu podia esperar era que o Chef fosse inteligente o suficiente para não se incriminar, que ele dançasse, se quisesse, perto da linha, mas que fosse esperto para não cruzá-la.
Essa era minha única esperança.
CAPÍTULO 9
TOTALMENTE LIGADO
Meu Deus, eles estão contaminando o quarto da minha filha!
Era início da tarde, e eu estava sentado no meu pátio coberto de ardósia cinza, em uma poltrona da Smith & Hawken de 1.200 dólares, quando esse pensamento horrível borbulhou em meu cérebro. Embora não pudesse vê-los, sabia que estavam lá, Zé Colmeia e Catatau, Debi e Loide! TOC e Mórmon estavam acampados no quarto rosa e perfeito de Chandler, dando uma olhadinha rápida em mim através dos espaços minúsculos das ripas cor-de-rosa perfeitas de sua veneziana.
Que tipo de pai permitiria que uma coisa dessas acontecesse? Eu supostamente deveria ser o protetor de Chandler! Seu guardião! Seu salvador! Era função do papai manter os intrusos afastados; mas agora havia dois intrusos armados contaminando seu quarto, além das 150 Barbies imaculadamente vestidas e um número igual de bichinhos de pelúcia, todos em total desamparo, sendo testemunhas silenciosas do fracasso do papai como protetor.
O Chef estava para chegar a qualquer minuto, então eu precisava me recompor. Eu precisava controlar todos esses pensamentos desgarrados rugindo em meu cérebro: a culpa, o remorso, o pânico, o puro e simples terror do caralho! Na verdade, não era realmente minha culpa que o FBI tivesse declarado completo domínio sobre o perfeito quarto cor-de-rosa de minha filha; o problema era daqueles de geometria, uma vez que a janela do quarto de Chandler era o ângulo perfeito para TOC e Mórmon tirarem fotos clandestinas do Chef enquanto ele e eu nos sentávamos lá fora no pátio de ardósia cinza e eu começava a destruir a vida dele.
Que vergonha eu senti! Que desonra terrível! Eu, um rato ignóbil!
Ainda assim, o fato é que estava muito bonito lá fora. Era um daqueles dias gloriosos e edificantes, quando um jovem de valor e substância pode apreciar a Mãe Natureza e tudo o que ela tem para oferecer. E que lugar melhor para fazer isso senão a partir do pátio de ardósia cinza na fabulosa Chez Belfort? A paisagem, afinal, era bonita; atrás de mim, minha mansão de pedra cinza com 10 mil metros quadrados se elevava acima do terreno com a grandeza e a magnificência do Palácio de Versalhes; diante de mim, as águas azuis cristalinas de minha piscina olímpica brilhavam como se fossem diamantes e, além dela, a lagoa de tirar o fôlego e um sistema de cachoeira que bombeava milhares de galões de água por minuto, enquanto uma fonte disparava um jato de água a 15 metros de altura, em uma deslumbrante exibição de riqueza e excesso. Que opulência! Com quanta beleza eu me cerquei!
E então, minha alma afundou. Aquelas merdas de lagoa e de cachoeira tinham me custado uma porra de 1 milhão de dólares, 1 milhão de dólares de merda que eu poderia realmente usar agora! Ainda naquela manhã, eu tinha tido um ataque debilitante de ansiedade por dinheiro. Eu estava sozinho na cama quando a realidade cruel de ter que vomitar a maioria dos meus ativos para o governo federal me atingiu como uma bola de ferro de demolição. No momento seguinte, meu coração estava batucando no peito e eu suava profusamente. Comecei a entrar em pânico.
E por que eu estava sozinho? Por que a cadela da Duquesa não tinha sequer voltado para casa na noite anterior? Aparentemente, ela se concentrava em uma nova mina de ouro e estava agora no processo de construir a cerca em torno de sua nova posse. Era apenas uma questão de tempo até que ela se tornasse um acessório de luxo de cabelos loiros de outro dono de mina. E aonde isso me levava? Que mulher gostaria de ficar com um Lobo quebrado, sem dinheiro e que tinha dedurado todos os amigos?
Respirei fundo e resisti à vontade de dar uma espiada rápida na veneziana do quarto de minha filha. Eu tinha estado lá menos de cinco minutos antes, e a cena era uma confusão enorme. O Mórmon estava andando para trás e para a frente (enquanto mantinha um largo sorriso gentil) com uma câmera Minolta pendurada no pescoço, como um sorridente turista japonês. Enquanto isso, TOC tinha se mantido curvado de joelhos, fixando um gravador de fita ultrassensível logo acima de meu quadril, utilizando um rolo de fita adesiva que ele tinha comprado na Staples.
Quanto a mim, passei quase o tempo todo reclamando.
– Porra, vai doer pra caralho quando você retirá-lo! – reclamei com TOC. Eu estava me referindo ao fato de que a maioria de meus pelos pubianos seria arrancada quando ele tirasse o gravador.
– Eu sei, eu sei – respondeu TOC de maneira simpática, enquanto cuidadosamente evitava meus pelos pubianos com as costas da mão. – Mas você tem que confiar em mim, não há melhor lugar para esconder um gravador de fita – ele deu de ombros, ao fixar o último pedaço de fita adesiva quatro centímetros acima da minha bolsa escrotal. – Mesmo alguém que suspeita de tudo como o Chef vai pensar duas vezes antes de acariciar suas bolas!