A Bruxa:
– Então por que não parou, se você se sentiu tão mal?
– Bem, acredite ou não, Michele, era exatamente isso o que eu tinha em mente quando conheci Danny. Aliás, foi de fato por isso que o conheci: eu estava no meu terraço, matando um dia de trabalho. Eu vestia um roupão branco atoalhado e pensava que direção tomar na minha vida. Já tinha um estoque decente de grana, de forma que não estava sob nenhuma pressão. Todas as opções estavam abertas para mim, todas exceto a abertura de uma corretora, que eu já havia descartado. Eram meados de junho, e George tinha abordado o assunto comigo. Ele me chamou em seu escritório e disse: “Os proprietários da Investors’ Center estão fazendo uma fortuna. É uma pena deixar tanto dinheiro assim sobre a mesa, você não acha?”. E minha resposta a George foi: “Não, eu não acho!”. Eu não queria ser dono de uma empresa de corretagem, especialmente uma como aquela onde trabalhava. Minha derrocada com a empresa de carnes e frutos do mar ainda estava muito fresca em minha mente, e eu sabia que todos os negócios pareciam lucrativos quando se olhava de fora; apenas quando você entrava para olhar é que conhecia sua verdadeira história. Claro, George não tinha ideia disso porque nunca tinha sido dono de alguma coisa antes. Tudo o que via eram os cifrões e nem uma única responsabilidade.
– Então você conheceu Danny enquanto estava no seu terraço? – perguntou o Canalha.
– Sim, eu morava no quarto andar, e Danny estava brincando com seu filho, Jonathon, no parquinho. Jonathon tinha 2 anos nessa época, e ele sempre chamava minha atenção porque tinha um fantástico cabelo loiro platinado. Ele era muito bonito. Enfim, depois de alguns minutos fazendo o papel de bom pai, Danny pareceu ficar entediado, e então saiu de lado e acendeu um cigarro. Em certo momento nossos olhares se cruzaram e eu lhe lancei um sorriso cortês de vizinho. Eu acho que o que mais me chocou em Danny naquele dia era como ele parecia um cara normal. Estava usando um short de golfe azul-claro e uma camisa polo de manga curta combinando. Era um conjunto de golfista, pensei, ou talvez um conjunto de iatista. Era difícil dizer. O que quer que fosse, eu nunca teria imaginado que ele era judeu.
O Canalha olhou para mim, confuso. Eu continuei:
– Enfim, trocamos olás, e então notei que Jonathon tinha subido ao alto do escorregador. No começo fiquei impressionado, porque parecia uma poderosa façanha para um menino de 2 anos de idade, mas então me ocorreu que provavelmente deveria avisar Danny. E então, de repente, Jonathon perdeu o equilíbrio e eu gritei: “Caralho! Cuidado, Danny! Seu filho!”, e Danny se virou a tempo de assistir a Jonathon perder o equilíbrio e bater no pavimento como uma bola de chumbo.
Fiz uma pausa e balancei a cabeça, sério.
– Eu vou dizer a verdade: de início, achei que o pobre garoto estava morto. Quer dizer, ele estava deitado, imóvel, e Danny também ficou imóvel, muito espantado para se mexer. Por fim, no entanto, depois de alguns segundos dolorosamente longos, Jonathon levantou a cabeça e começou a olhar em volta, mas não estava chorando ainda. Isso veio um segundo mais tarde, quando ele cruzou os olhos com Danny. Então ele ficou gritando com toda a força de seus pulmões, agitando os braços e chutando com as pernas loucamente. Aí concluí que deveria descer até lá e dar uma mão a Danny. Parecia a coisa certa a fazer, em nome da boa vizinhança. Mas quando cheguei ao parquinho, Jonathon estava chorando muito alto mesmo. Ele estava berrando nos braços de Danny! Eu disse a Danny: “Você quer que eu vá procurar sua esposa?”. Danny recuou com horror e disse: “Meu Deus! Procure qualquer um, menos ela! Por favor! Você pode chamar a polícia, não me importa, e fazer com que eu seja preso por ser um mau pai, só não telefone para minha esposa, por favor!”. É claro que eu pensei que ele estava brincando na hora, então concordei com a cabeça e sorri. Mas ele não sorriu de volta, e isso porque não estava brincando. Eu só iria descobrir o motivo, no entanto, alguns dias mais tarde, quando Denise e eu tivemos o prazer de sair com eles para jantar e assistimos a Nancy tirar um cigarro aceso de sua boca e jogá-lo no rosto de Danny. Mas, para não me adiantar aqui: Jonathon acabou por se acalmar, e Danny me disse: “Minha esposa me falou que o vê saindo no terraço durante toda a semana em roupão de banho. Com o que você trabalha?”. “Sou corretor de ações”, respondi casualmente. “É mesmo?”, disse ele. “Eu pensei que você precisava trabalhar em Wall Street para ser um corretor da Bolsa.” Balancei a cabeça negativamente. “Isso é um equívoco total. Tudo é feito através do telefone agora. Você poderia estar em qualquer lugar. Eu, por exemplo, trabalho em Great Neck e ganhei mais de 50 mil no mês passado”. “Cinquenta paus! Não acredito! Eu tenho um monte de amigos corretores e todos eles estão pastando desde a quebra da Bolsa!”. Expliquei: “É que eu só cuido de ações pequenas. Elas não foram tão afetadas por essa queda. Que tipo de trabalho você faz?”. “Estou no negócio de ambulâncias”, respondeu ele rapidamente, “o que é um terrível pesadelo. Eu tenho sete vans que constantemente quebram e sete motoristas haitianos que quase nunca aparecem para trabalhar. Eu teria tacado fogo no lugar para conseguir o seguro se tivesse como escapar sem ser pego.”
“Assenti com a cabeça, compreendendo o que ele queria dizer, e disse sem pensar: ‘Bem, se você quiser uma mudança em sua vida, tenho certeza de que consegue um emprego na empresa onde trabalho. Posso treiná-lo eu mesmo’, ao que Danny me olhou nos olhos e respondeu: ‘Meu amigo, se você me provar que está ganhando 50 mil por mês, eu estarei à sua porta, às 6 horas da manhã de amanhã, pronto pra escavar merda pra você, se for preciso!’.
– E quando ele realmente foi trabalhar para você? – perguntou o Canalha.
– Na manhã seguinte – disse eu. – Fiel à sua palavra, ele estava esperando na minha porta, segurando uma cópia do The Wall Street Journal.
– E o negócio de ambulâncias dele?
Eu dei de ombros.
– Ele nunca mais voltou para aquilo. Danny tinha um sócio, 50%-50%, e então apenas entregou as chaves para o cara e disse: “Até mais, amigo, legal te conhecer!”, e foi tudo. Ele ficou fazendo ligações para mim durante o restante do verão e depois passou no teste para corretor na primeira semana de setembro. George, por sua vez, foi se tornando cada vez mais agressivo sobre abrir nossa própria corretora. A CVM tinha começado a investigar a Investors’ Center e, se essa notícia vazasse, disse ele, a empresa iria quebrar rapidamente. O que mais me preocupava era que eu tinha acabado de convencer Lipsky e o Pinguim a vir trabalhar para mim. O Pinguim finalmente tinha jogado a toalha em relação à empresa de carnes e frutos do mar, e a fábrica de móveis de Lipsky estava à beira da falência. Então, de certa forma, eu me sentia responsável por eles também. Foi por isso que finalmente concordei em ir com George falar com um advogado, porque eu queria reunir conhecimento sobre as coisas.
– Com que advogado você falou? – perguntou o Canalha.
– Seu nome era Lester Morse, embora Danny e eu costumássemos chamá-lo de Lester Re-Morse, porque tudo que se relacionava com esse cara era cheio de remorsos, era taciturno. Ele era pessimista ao máximo, quase difícil de entender. Quer dizer, cada pessoa que ele conhecia estava apodrecendo na cadeia ou tinha perdido seu último centavo para a CVM. E a maneira como Re-Morse contava uma história o fazia querer cortar os próprios pulsos. Ele começava contando como alguém era um grande sujeito e como tinha feito uma fortuna em seu auge, mas a história rapidamente degenerava para uma história cheia de advertências e ele acabava dizendo: “… E o que o governo acabou fazendo com ele foi uma terrível sacanagem. Ele está em Allenwood agora e não vai sair pelos próximos dez anos”. Então, sacudia a cabeça e passava para sua próxima vítima.
– Interessante – resmungou o Canalha.