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Ela empurrava as crianças nos balanços de um jeito muito alegre e, depois de tirar seus próprios sapatos, ficou pulando com elas pelo quintal. Era como se nossa vida não estivesse interligada de nenhuma maneira. Sua tremenda insensibilidade havia enviado minha alma para um mergulho ainda mais fundo. Eu me sentia como se estivesse em um buraco escuro, sufocante, sem escapatória.

Estava sem comer, sem dormir, sem rir e sem sorrir havia quase quatro dias e, naquele momento, com as divagações vazias de Monsoir, estava pensando seriamente em cortar meus pulsos.

Ele tinha começado a falar de novo.

– Eu só estava tentando animá-lo, chefe. Voxê é de fato uma homem de muita sorte. Na minha país, eles teriam cortado sua mão fora se o pegassem roubando um pedaço de pão.

Eu interrompi sua ladainha.

– Sim, isso é mesmo fascinante, Monsoir. Obrigado por compartilhar…

E fiquei algum tempo refletindo sobre os prós e os contras da justiça islâmica. Cheguei rapidamente à conclusão de que, tendo em vistas as atuais circunstâncias, para mim havia pontos positivos e negativos. Pelo lado bom da coisa, a Duquesa não estaria dando uma de durona se fosse obrigada a vestir uma daquelas burcas que cobrem uma mulher dos pés à cabeça e a sair pela cidade desse jeito; e isso iria impedir que aquela loira ficasse andando por aí como a porra de um pavão. Pelo lado negativo, a pena islâmica para os crimes de colarinho branco e para um tarado compulsivo por prostitutas devia ser bastante severa. Eu e meus filhos tínhamos assistido ao Aladdin, da Disney, recentemente, e havia uma cena em que estavam prestes a cortar a mão do rapaz porque ele tinha roubado uma laranja. Ou tinha sido um pedaço de pão? De qualquer maneira, eu tinha roubado bem mais que 100 milhões de dólares e conseguia imaginar qual seria o castigo islâmico para isso.

Mas, pensando bem, eu realmente tinha roubado alguma coisa? Quer dizer, essa palavra, “roubar”, não seria uma espécie de descaracterização do que eu tinha feito? Em Wall Street, nós não éramos de fato ladrões, éramos? Nós simplesmente persuadíamos as pessoas a nos dar seu dinheiro, a gente não roubava deles! Havia uma grande diferença. Os crimes que havíamos cometido eram do tipo suave, como vender o maior número possível de títulos numa mesma conta para inflar nossas comissões, negociar informações privilegiadas ou se envolver em lavagem de dinheiro e evasão fiscal. Eram violações técnicas, mais que qualquer outra coisa. Não era assim um roubo descarado.

Ou era? Bem, talvez fosse… Talvez… Talvez eu tenha levado as coisas a um novo nível. Ou pelo menos era isso que os jornais pensavam.

Nessa altura, a limusine estava passando pelos grandes arcos da Ponte Triborough, e eu já conseguia distinguir a brilhante silhueta dos prédios de Manhattan à esquerda. Em dias claros como aquele, os edifícios pareciam subir todos em direção ao céu. Você poderia sentir o peso de todos eles. Não havia dúvida de que Manhattan era o centro financeiro do Universo, um lugar onde os mandachuvas podiam se mover e se agitar, reunindo-se com os Mestres do Universo como se fossem deuses gregos no Olimpo. E cada um deles era tão trapaceiro quanto eu!

Pois é, pensei, eu não era muito diferente de nenhum outro dono de corretora, fosse do WASP de sangue azul que dirigia o JP Morgan até o branquelo pateta que tocava sua Foda-se Valores Mobiliários (que fica em Foda-se, Minnesota). A verdade é que todos nós pegávamos alguns atalhos. Nós somos obrigados a fazer isso; afinal, se não fosse por qualquer outro motivo, era para, pelo menos, ficarmos acompanhando nossa concorrência. Tal era a natureza da perfeição contemporânea de Wall Street, caso você quisesse ser de fato um verdadeiro e influente corretor.

Então, na verdade, nada daquilo era de fato culpa minha. A culpa era de Joe Kennedy! Sim, ele é que tinha começado essa terrível onda de manipulações, tramas e armadilhas corporativas. Nos anos 1930, o velho Joe foi o verdadeiro Lobo de Wall Street, queimando qualquer um que se colocasse em seu caminho. Na verdade, foi ele um dos principais instigadores da quebra da Bolsa de Nova York de 1929, que mergulhou os Estados Unidos na Grande Depressão. Ele e um pequeno punhado de lobos fabulosamente ricos se aproveitaram de um público desavisado e tomaram dezenas de milhões de dólares em ações de curto prazo que já estavam à beira do colapso, fazendo com que elas caíssem ainda mais.

E qual foi o castigo deles? Bem, a menos que eu esteja mal informado sobre nossa história, o velho Joe se tornou o primeiro presidente da Comissão de Valores Mobiliários. Olhe a audácia! Sim, o maior bandido do mercado de ações havia se tornado seu principal cão de guarda! E durante todo o tempo, mesmo sendo o presidente da comissão, ele continuou a derrubar os preços das ações por trás das cortinas, faturando outros milhões.

Eu não era diferente de nenhum deles, não era mesmo.

– VOCÊ É MUITO DIFERENTE de todo mundo – disse Gregory J. O’Connell, meu advogado criminalista de quase 2 metros de altura. – Esse é seu problema.

Ele estava sentado do outro lado de sua fabulosa mesa de mogno, recostado em sua fabulosa poltrona de couro de espaldar alto, segurando a cópia de meu não tão fabuloso indiciamento. Gregory era um homem de boa aparência, em seus 40 e poucos anos, com cabelo castanho-escuro e um queixo bastante quadrado. Tinha uma semelhança impressionante com Tom Selleck, do seriado Magnum, embora para mim parecesse bem mais alto. De fato, inclinado como estava agora sobre a mesa, sua cabeça e seu tronco pareciam ter 1 quilômetro de altura (na verdade, ele tinha 1,95 metro de altura, embora para mim qualquer um que tivesse 1,90 já parecesse suficientemente alto).

– Pelo menos é assim que o governo parece ver você, assim como seus amigos da imprensa, que não se cansam de falar sobre o Lobo de Wall Street – continuou Magnum, com sua voz de tenor e oferecendo conselhos da mesma forma teatral que Enrico Caruso teria feito, caso fosse essa a inclinação dele. – Odeio dizer isso, mas você se tornou o garoto-propaganda da fraude contra os pequenos investidores, Jordan. Foi por isso que o juiz lhe deu uma fiança de 10 milhões de dólares, para fazer de você um exemplo.

Respondi reclamando:

– Ah, é mesmo? Pois bem, tudo isso é um monte de merda do caralho, Greg! Até a última gota! – Ergui-me da poltrona de couro preto onde estava sentado, para elevar-me ao nível de seus olhos. – Todo mundo em Wall Street é safado, e você sabe disso! – Inclinei a cabeça para o lado e estreitei os olhos, desconfiado. – Quer dizer, que tipo de advogado é você, afinal? Eu sou inocente, pelo amor de Deus! Completamente inocente!

– Eu sei – disse meu amigo e advogado pelos últimos quatro anos. – E eu sou a Madre Teresa, a caminho de Roma, fazendo minha peregrinação. E o Nick aqui – ele ergueu o queixo, apontando o terceiro ocupante da sala, seu sócio Nick de Feis, que estava sentado na outra poltrona de couro ao meu lado – é Mahatma Gandhi. Não é mesmo, Nick?

– É Mohandas – respondeu ele, que tinha se formado em primeiro lugar em sua classe em Yale. Ele tinha mais ou menos a mesma idade de Greg e um QI que beirava 7 mil… Era magro, de cabelos escuros cortados bem curtos, olhos intensos e comportamento tranquilo. Com mais ou menos a minha altura, Nick ficava muito bem no terno risca de giz azul, com o colarinho pesadamente engomado e sapatos estilo escocês bem WASP, e a soma disso tudo o fazia parecer um sujeito muito inteligente. – Mahatma não é realmente um nome – continuou o veterano de Yale –, é a palavra sânscrita para “grande alma”, caso você queira saber o significado. Mohandas foi…

Eu o cortei:

– E quem se importa com essa merda, Nick? Porra, eu estou aqui encarando uma condenação para passar o resto da vida na prisão e vocês dois, filhos da puta, ficam tagarelando sobre sânscrito!