Houve mais um momento de silêncio, enquanto as palavras da Bruxa pairavam no ar como gás tóxico. Por fim, o Canalha falou, em um tom pacificador:
– Bem, eu acho que todos nós concordamos que o capítulo final de sua vida ainda está para ser escrito, mas por enquanto precisamos manter o foco no presente… Ou no passado, eu deveria dizer, e, mais especificamente, na sua reunião no escritório de Lester.
Sim, pensei, você é meu salvador e protetor, Canalha, e isso mostra de maneira estrondosa a terrível situação da minha vida. Afinal, você não ficaria feliz com mais nada além de me ver apodrecendo em uma prisão, e ainda assim há outro ser humano na sala que me deseja coisa ainda pior que você.
Eu balancei a cabeça e disse:
– Certo… Bem, no momento em que cheguei ao escritório de Lester minha janela de clareza estava totalmente aberta, e eu já havia trabalhado as coisas em minha mente. Havia três coisas que eu precisava alcançar. Em primeiro lugar, precisava fazer um acordo com Mike; em segundo, precisava fazer um acordo com Jim Taormina; e, em terceiro lugar, tinha que arrumar um escritório temporário para entrevistar os vendedores até que conseguisse um espaço permanente. Então, quando cheguei ao escritório de Lester, não perdi um segundo. Dessa vez, só estávamos nós três, Lester, Mike e eu, e fui direto ao ponto. “Apenas me diga seu preço e eu pagarei”, disse a Mike. “Tudo o que eu quero é que meu salário seja uma porcentagem dos lucros ou, melhor ainda, uma porcentagem da receita. Dessa forma, você nunca vai ter que se preocupar em me foder colocando suas despesas pessoais na conta da empresa.” Sorri para ele, tentando ao máximo ignorar o idiota fabuloso que era. “Eu sei como você é valioso, Mike, e não posso fazer isso sem você. Você deve ter esquecido mais coisas sobre esse negócio do que eu jamais vou aprender. Você é meu pivô, minha arma secreta.”
E continuei:
– Mike, é claro, adorou isso, como eu imaginava. Em Wall Street, as pessoas que ficam nos bastidores, dando suporte nos escritórios, são os heróis anônimos, os que mantêm as máquinas zumbindo, enquanto os corretores e banqueiros fazem suas fortunas. Eles são dramaticamente mal pagos, em minha opinião, e amplamente subestimados. Por isso, não foi nenhuma surpresa para mim quando Mike me disse: “Eu não preciso de um salário. Apenas me pague o que achar justo e estará tudo bem”. Eu já tinha verificado isso com Lester e um cara de operações de primeira-classe como ele valia 150 mil dólares ao ano. Então, respondi a Mike: “Que tal 10% da receita até meio milhão por ano?”. E foi isso, Mike era meu. Então me virei para Lester: “Ligue para Jim Taormina e traga-o aqui. Eu quero fechar um acordo com ele até o final do dia de hoje. Qual é a porcentagem padrão para um ramo de uma corretora?”. Lester resmungou: “Bem, eu…”. “Dez por cento da receita”, respondeu Mike, “e mais uma taxa de 10 dólares para cada ticket emitido, mas apenas pelo lado da compra. A venda é gratuita. Mas a coisa mais importante é que eu não quero esse cara segurando nosso dinheiro. Temos que varrer a conta da negociação uma vez por semana. Ele pode ficar com um depósito pequeno, digamos de 25 mil, coisa assim”. Concordei. “Tudo bem”, disse a Lester. “Ligue para o Jim e lhe diga que eu pago 15% das receitas, mas com um limite de 30 mil dólares por mês, que é o máximo que ele vai tirar de mim. Acima disso, eu fico com tudo. Você acha que ele vai topar?” “Ah, é claro que ele vai”, resmungou Lester. “Ele está na iminência de pedir falência. Mas ele é, uh, do tipo passivo, o Jim. Estou preocupado que você possa assustá-lo.” “Não se preocupe”, disse eu. “Eu sei exatamente como falar com um cara como Jim. Basta fazer com que ele venha até aqui e eu cuido do resto”, e, claro, eu estava certo. A Stratton começou assim. Lester pediu licença para sair da sala de reuniões e Mike passou as horas seguintes me dando um curso intensivo sobre o negócio de corretagem. Quando Jim finalmente apareceu, vi que ele era, de fato, um sujeito completamente passivo. Fiz o acordo com ele em menos de um minuto.
– E o que dizer de sua intimação pela CVM? – perguntou o Canalha.
Eu ri.
– Pois é, bem, aquilo acabou sendo a maior piada de todas. Na verdade, no momento em que finalmente fui depor, a Stratton já estava atuando no mercado havia um ano! E quando eles processaram a Stratton, nunca tentaram usar o que acontecera na Investors’ Center para dar um nocaute! – dei de ombros. – Mas é assim que eles são: a mão direita nunca sabe o que a mão esquerda está fazendo.
Depois de alguns instantes de silêncio, o Canalha perguntou:
– Quanto tempo mais a Investors’ Center ficou operando?
– Acredito que mais uns cinco ou seis minutos – respondi casualmente. – Na verdade, depois que eu saí do escritório de Lester, dei uma passada por lá, e havia uma semelhança estranha com o que eu imaginava ter sido a sede do Terceiro Reich quando os russos estavam se aproximando de Berlim. Havia papéis por toda parte e os corretores estavam correndo, carregando caixas, mas não foi nada comparado com a semana seguinte, quando nossos salários não foram pagos. Os corretores começaram a derrubar as paredes…
Eu dei de ombros.
– Não surpreendentemente, o Cabeça Quadrada se mostrou uma pessoa muito adepta a esse tipo de coisa. Primeiro, ele pegou uma copiadora Canon, que serviria para nossa futura firma de corretagem, e depois usou um pé de cabra para arrombar o cofre do escritório e roubar todos os formulários de novas contas. Havia milhares deles, uma verdadeira mina de ouro de pessoas que tinham mostrado alguma propensão a investir em ações baratas. Foram esses formulários de novas contas que serviram como nossa primeira fonte de buscas de receita, quando começamos o trabalho de telemarketing duas semanas depois. Foi esse o tempo que levou para arrumarmos um espaço para trabalhar.
– E o que você usou nesse meio tempo? – perguntou TOC.
– A concessionária de automóveis de um amigo. Era no fim da mesma rua onde ficava a Investors’ Center. Fiquei lá por cerca de duas semanas, até que encontrei o espaço certo, na cidade de Lake Success, Long Island. Ele ficava a leste do limite entre Queens e Long Island e, apesar de ser pequeno, o edifício era limpo e sofisticado. Apertando um pouco, percebi que poderiam caber 20 corretores na sala de pregões. Isso seria perfeito, pensei. Com 20 corretores, eu poderia fazer uma fortuna.
TOC, com uma risada:
– Vinte corretores?
Eu balancei a cabeça lentamente.
– Sim, acho que minhas perspectivas estavam um pouco baixas.
– Qual era o percentual da sociedade? – perguntou o Canalha.
– Era 70 e 30 – respondi. – Setenta por cento para mim, 30% para o Kenny.
– Danny não era um dos sócios? – perguntou a Bruxa.
– Não, eram apenas Kenny e eu. Danny comprou sua parte mais tarde.
A Bruxa prosseguiu:
– Qual foi o capital inicial da empresa?
– Cerca de 80 mil – respondi rapidamente. – E, apesar de eu ter o dobro das cotas de Kenny, nós dividimos o investimento da mesma forma: 40 mil cada um. Isso porque eu era o líder – disse respeitosamente. – Então, dividir o investimento parecia justo. A única baixa foi Elliot Loewenstern, o Pinguim. O que aconteceu na Investors’ Center o assustou e ele conseguiu um emprego em Manhattan, no Bear Stearns. Ele voltou, naturalmente, logo depois de eu acertar com minha ideia de vender ações de 5 dólares para os ricaços.
– E quando foi isso? – perguntou o Canalha.
– Cerca de um mês depois – respondi casualmente. – No início de novembro.
– O que fez você pensar nisso? – perguntou TOC.