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Stannis Baratheon estava mostrando-se um hóspede suscetível e irrequieto. Cavalgara pela estrada do rei quase até Coroadarrainha, passeara por entre as cabanas vazias de Vila Toupeira, inspecionara os fortes arruinados de Portão da Rainha e Escudorroble. Todas as noites caminhava pelo topo da Muralha com a Senhora Melisandre, e durante os dias visitava as paliçadas, escolhendo cativos para a mulher vermelha interrogar. Ele não gosta de ser contrariado. Aquela não seria uma manhã agradável, temeu Jon.

Do armeiro vinha um retinir de escudos e espadas feito pelo último grupo de rapazes e recrutas que se armava. Jon ouviu a voz do Emmett de Ferro dizendo-lhes para se despacharem. Cotter Pyke não ficara satisfeito por perdê-lo, mas o jovem patrulheiro tinha um dom para treinar homens. Ele adora combater, e irá ensinar os seus rapazes a gostar também. Pelo menos era a esperança que tinha.

O manto de Jon estava pendurado de uma cavilha ao lado da porta, o cinturão da espada de outra. Envergou-os a ambos e saiu para o armeiro. Viu que o tapete em que Fantasma dormia estava vazio. Dois guardas estavam à porta, do lado de dentro, vestidos com mantos pretos e meios elmos de ferro, com lanças nas mãos.

— O senhor vai querer uma escolta? — perguntou Garse.

— Acho que consigo encontrar a Torre do Rei sozinho. — Jon detestava ter guardas seguindo-o para onde quer que fosse. Fazia-o se sentir como uma mãe pata levando atrás uma procissão de patinhos.

Os rapazes do Emmett de Ferro estavam em plena atividade no pátio, atirando espadas embotadas contra escudos e fazendo-as ressoar umas nas outras. Jon parou para observar no momento em que o Cavalo empurrava o Pisco-Saltitão para o poço. Decidiu que o Cavalo tinha as características de um bom combatente. Era forte e estava tornando-se mais forte, e os seus instintos eram bons. O Pisco-Saltitão era outra história. O pé aleijado já era suficientemente mau, mas, além disso, também tinha medo de ser atingido. Talvez consigamos fazer dele um intendente. O combate terminou de forma abrupta, com o Pisco-Saltitão no chão.

— Boa luta — disse Jon ao Cavalo — mas abaixa muito o escudo quando pressiona no ataque. Vai querer corrigir isso, senão é provável que isso lhe mate.

— Sim, senhor. Da próxima vez mantenho-o mais alto. — Cavalo pôs Pisco-Saltitão de pé, e o homem menor fez uma mesura desajeitada.

Alguns dos cavaleiros de Stannis estavam praticando do outro lado do pátio. Homens do rei num canto e homens da rainha no outro, não deixou Jon de notar, mas só alguns. Está frio demais para a maioria. Enquanto passava por eles a passos largos, uma voz trovejante chamou-o.

— RAPAZ! VOCÊ AÍ! RAPAZ!

“Rapaz” não era a pior das coisas que tinham chamado Jon Snow desde que fora escolhido como senhor comandante. Ignorou-o.

— Snow — insistiu a voz — Senhor Comandante. Desta vez parou.

— Sor? O cavaleiro era quinze centímetros mais alto do que ele.

— Um homem que anda com aço valiriano devia usá-lo para mais do que coçar o cu.

Jon já vira aquele tipo no castelo; um cavaleiro de grande renome, segundo ele próprio contava. Durante a batalha à sombra da Muralha, Sor Godry Ferring matara um gigante em fuga, atacando-o a cavalo e enfiando-lhe uma lança nas costas, desmontando em seguida para cortar a cabeça lamentavelmente pequena da criatura. Os homens da rainha tinham começado a chamar-lhe Godry, o Mata-Gigantes.

Jon lembrou-se de Ygritte, gritando. Sou o último dos gigantes.

— Uso a Garralonga quando tenho de usá-la, sor.

— Mas com que perícia? — Sor Godry puxou pela sua espada. —Mostre-nos. Prometo não te magoar, rapaz.

Que gentil da tua parte.

— Outra hora, sor. Temo que tenha outros deveres a cumprir neste momento.

— Temes. Estou vendo que sim. — Sor Godry dirigiu um sorriso aos amigos. — Ele teme — repetiu para os lentos.

— Com licença. — Jon mostrou-lhes as costas.

Castelo Negro parecia um lugar desolado e abandonado à pálida luz da aurora. O meu comando, refletiu Jon Snow com tristeza, é tanto ruína como fortificação. A Torre do Senhor Comandante era uma casca, a Sala Comum uma pilha de madeira enegrecida, e a Torre de Hardin parecia poder ser derrubada pela próxima rajada de vento… embora tivesse esse aspeto há anos. Por trás erguia-se a Muralha: imensa, ameaçadora, frígida, cheia de construtores que faziam subir uma nova escada em ziguezague para ir se juntar aos restos da antiga. Trabalhavam da aurora ao ocaso. Sem a escada não havia maneira de chegar ao topo da Muralha, exceto através do guincho. Não seria suficiente se os selvagens voltassem a atacar.

Por cima da Torre do Rei, o grande estandarte de batalha dourado da Casa Baratheon estalava como um chicote do telhado que Jon Snow patrulhara de arco na mão não havia muito tempo, matando Thenns e membros do povo livre ao lado de Cetim e do Surdo Dick Follard. Dois homens da rainha estavam em pé, tremendo, nas escadas, com as mãos enfiadas nos sovacos e as lanças encostadas à porta.

— Essas luvas de tecido nunca servirão — disse-lhes Jon. — Procurem Bowen Marsh amanhã, e ele dará a cada um de vocês um par de luvas de couro forradas de pele.

— Procuraremos senhor, e obrigado — disse o guarda mais velho.

— Isso se a porcaria das nossas mãos não tiver congelado até lá — acrescentou o mais novo, com a respiração transformada numa névoa pálida. — Costumava pensar que na Marca de Dorne fazia frio. Que sabia eu?

Nada, pensou Jon Snow, tal como eu. Na metade da subida pela escada em caracol encontrou Samwell Tarly, que a descia.

— Veio de falar com o rei? — perguntou-lhe Jon.

— O Meistre Aemon enviou-me com uma carta.

— Estou vendo. — Alguns senhores confiavam nos meistres para lhes lerem as cartas e transmitirem-lhes os respetivos conteúdos, mas Stannis insistia em quebrar pessoalmente os selos. — Como foi que Stannis a encarou?

— Não com alegria, ajuizando pela cara que fez. — Sam baixou a voz até a transformar num sussurro. — Não devo falar do assunto.

— Então não fale. — Jon perguntou-se qual dos vassalos do pai teria recusado jurar obediência ao Rei Stannis daquela vez. Ele foi bastante rápido em espalhar a notícia quando Karhold lhe declarou o seu apoio. — Como está você a atirar com o seu arco?

— Encontrei um bom livro sobre o tiro com arco. — Sam franziu o sobrolho. — Mas fazê-lo é mais difícil do que ler sobre o assunto. Fico com bolhas nas mãos.

— Insista. Podemos vir a precisar do seu arco na Muralha se os Outros aparecerem alguma noite escura.

— Oh, espero que não. Mais guardas estavam à porta do aposento privado do rei.— Não são permitidas armas na presença de Vossa Graça, senhor — disse o sargento. — Vou querer essa espada. As facas também. — Jon sabia que de nada serviria protestar. Entregou-lhes as suas armas.