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Um menino chamado Tarber atirou um punhado de bolotas sobre o corpo de Praed, para que um carvalho pudesse nascer e marcar o lugar em que jazia.

Naquela noite, pararam em uma aldeia, numa estalagem coberta de hera. Yoren contou as moedas que trazia na bolsa e decidiu que tinham o suficiente para uma refeição quente.

– Vamos dormir aqui fora, como sempre, mas eles têm uma casa de banhos aqui, se algum de vocês estiver sentindo falta de água quente e de uma esfregadinha com sabão.

Arya não se atreveu, embora já cheirasse tão mal como Yoren, toda ela acre e fedorenta. Algumas das criaturas que viviam na sua roupa a acompanhavam desde a Baixada das Pulgas; não parecia certo afogá-las. Tarber, Torta Quente e Touro juntaram-se à fila de homens que se dirigiam para as tinas. Outros instalaram-se na frente da casa de banhos. O resto amontoou-se na sala comum. Yoren até mandou Lommy levar canecas de cerveja aos três homens presos que tinham sido deixados acorrentados na parte de trás da carroça.

Os lavados e os por se lavar jantaram empadões quentes de porco e maçãs cozidas. O estalajadeiro ofereceu-lhes uma rodada de cerveja por conta da casa.

– Tive um irmão que vestiu o negro, há anos. Era criado de refeições, esperto, mas um dia foi visto surrupiando pimenta da mesa do senhor. Gostava do sabor, nada mais. Só uma pitada de pimenta, mas Sor Malcolm era um homem duro. Tem pimenta na Muralha? – quando Yoren balançou a cabeça, o homem soltou um suspiro. – Que pena. Lync adorava pimenta.

Arya bebericou cautelosamente da caneca, entre uma e outra colherada de empadão ainda quente do forno. Lembrou-se de que o pai, às vezes, os deixava beber uma taça de cerveja. Sansa costumava fazer uma careta, dizendo que o vinho era muito melhor, mas Arya gostava bastante. Pensar em Sansa e no pai deixava-a triste.

A estalagem estava cheia de gente que rumava para o sul, e a sala comum irrompeu em escárnio quando Yoren disse que viajavam na direção oposta.

– Voltará em breve – garantiu o estalajadeiro. – Não há como ir para o norte. Metade dos campos está queimada, e as pessoas que restam estão trancadas dentro das muralhas dos seus castros. Um grupo afasta-se de madrugada, e outro aparece ao anoitecer.

– Isso não é nada pra nós – Yoren insistiu teimosamente. – Tully ou Lannister, não importa. A Patrulha não participa.

Lorde Tully é meu avô, pensou Arya. A ela importava, mas mordeu o lábio e ficou quieta, ouvindo.

– É mais do que Lannister e Tully – rebateu o estalajadeiro. – Há selvagens das Montanhas da Lua. Tente lhes dizer que não participa. E os Stark também estão metidos no assunto, o jovem senhor desceu, o filho do Mão morto…

Arya endireitou-se no lugar, esforçando-se para ouvir. Estaria ele se referindo a Robb?

– Ouvi dizer que o rapaz monta um lobo nas batalhas – disse um homem de cabelo amarelo, com uma caneca na mão.

– Conversa de gente imbecil – Yoren cuspiu.

– O homem que me disse isso viu com seus próprios olhos. Um lobo grande como um cavalo, ele jurou.

– Jurar não torna isso verdade, Hod – disse o estalajadeiro. – Você anda sempre jurando que vai pagar o que me deve, e ainda não vi um único vintém.

A sala comum explodiu em gargalhadas, e o homem de cabelo amarelo ficou vermelho.

– Tem sido um ano ruim para lobos – interveio um homem pálido com seu manto verde manchado pela viagem. – Nas redondezas do Olho de Deus, as matilhas tornaram-se mais ousadas do que se tem registro. Ovelhas, vacas, cães, não importa, matam o que bem quiserem, e não têm medo dos homens. Entrar naqueles bosques durante a noite é arriscar a vida.

– Ah, isso são mais histórias, e são tão pouco reais quanto a outra.

– Eu ouvi o mesmo da minha prima, e ela não é do tipo que mente – disse uma velha. – Diz que há uma grande matilha, com centenas de lobos, matadores de homens. O animal que os lidera é uma loba, uma cadela do sétimo inferno.

Uma loba. Arya bebeu sua cerveja, refletindo. Será que Olho de Deus ficava perto do Tridente? Gostaria de ter um mapa. Tinha sido perto do Tridente que deixara Nymeria. Não queria fazê-lo, mas Jory disse que não tinha alternativa, que se a loba voltasse com eles seria morta por ter mordido Joffrey, apesar de ele ter merecido. Tinham tido de gritar, e berrar, e atirar pedras, e só depois de ser atingida por algumas delas, atiradas por Arya, é que a loba gigante deixou de segui-los. Ela provavelmente nem me reconheceria agora, Arya pensou. Ou, se reconhecesse, iria me odiar.

O homem do manto verde disse:

– Ouvi falar de como esta cadela do inferno entrou um dia numa aldeia… Um dia de mercado, com gente por todo o lado, e ela entrou, na cara dura, e arrancou um bebê dos braços da mãe. Quando Lorde Mooton ouviu a história, ele e os filhos juraram que acabariam com ela. Seguiram-na até a toca com uma matilha de lobeiros, e foi por pouco que conseguiram salvar a própria pele. Nem um dos cães voltou, nem um.

– Isso é só uma história – Arya exclamou, antes de conseguir se controlar. – Os lobos não comem bebês.

– E o que você sabe disso, moço? – perguntou o homem do manto verde.

Antes que Arya conseguisse pensar numa resposta, Yoren agarrou seu braço.

– O rapaz tem cerveja na cabeça, é só isso.

– Não tenho nada. Eles não comem bebês…

– Lá pra fora, rapaz… E vê se fica lá até aprender a calar a boca quando os homens estão conversando – Yoren deu-lhe um empurrão firme, na direção da porta lateral que levava de volta aos estábulos. – Vá. E veja se o cavalariço deu água aos cavalos.

Arya saiu, dura de fúria.

Não comem – resmungou, chutando uma pedra no momento em que saía. A pedra foi rolando, e só parou debaixo das carroças.

– Menino – chamou uma voz amistosa. – Menino adorável.

Um dos homens presos estava falando com ela. Cuidadosamente, Arya aproximou-se da carroça, com uma mão no cabo da Agulha.

O prisioneiro ergueu uma caneca vazia, tilintando as correntes.

– Um homem faria bom proveito de outro gole de cerveja. Um homem tem muita sede quando usa essas pulseiras pesadas.

Era o mais novo dos três, esguio, com traços delicados, sempre a sorrir. Tinha o cabelo vermelho de um lado e branco do outro, todo embaraçado e sujo da cadeia e da viagem.

– Um homem também não se importaria com um banho – ele disse quando viu o modo como Arya o olhava. – Um garoto poderia fazer um amigo.

– Já tenho amigos – ela respondeu.

– Nenhum que eu consiga ver – disse o que não tinha nariz. Era atarracado e troncudo, com umas mãos enormes. Pelos negros cobriam seus braços, pernas, peito e até mesmo as costas. Fazia Arya lembrar-se de um desenho que tinha visto num livro, de um macaco das Ilhas do Verão. O buraco no seu rosto tornava difícil olhá-lo durante muito tempo.

O careca abriu a boca e silvou, como se fosse um imenso lagarto branco. Quando Arya vacilou para trás, sobressaltada, ele abriu a boca e sacudiu a língua na sua direção, mas aquilo era mais um coto que uma língua.

– Para com isso! – ela exclamou.

– Um homem não escolhe os companheiros nas celas negras – disse o bonito, com o cabelo vermelho e branco. Qualquer coisa no jeito como falava lembrou-lhe Syrio; era o mesmo, mas ao mesmo tempo diferente. – Estes dois não têm educação. Um homem tem de pedir perdão. Chamam você de Arry, não é verdade?

– Cabeça de Caroço – disse o que não tinha nariz. – Cabeça de Caroço, Cara de Caroço, Rapaz Pau. Toma cuidado, Lorath, que ele bate em você com o pau.

– Um homem tem de sentir vergonha das companhias que tem, Arry – voltou a falar o bonito. – Este homem tem a honra de ser Jaqen H’ghar, antigamente habitante da Cidade Livre de Lorath. Bem que gostaria de estar em casa. Os malcriados companheiros de cativeiro deste homem chamam-se Rorge – indicou com a caneca o homem sem nariz – e Dentadas – Dentadas voltou a silvar para ela, mostrando uma boca cheia de dentes amarelos, limados até ficar pontiagudos. – Um homem tem de ter algum nome, não é? O Dentadas não pode falar, e nem sabe escrever, mas seus dentes são muito afiados, e por isso um homem o chama de Dentadas, e ele sorri. Está encantado?