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– Thorne tem a mão da criatura para lhes mostrar.

Era uma coisa horrível e branca, com dedos negros, que se agitava e torcia no frasco como se ainda estivesse viva.

– Seria bom que tivéssemos outra mão para enviar a Renly.

– Dywen diz que é possível encontrar qualquer coisa para lá da Muralha.

– Sim, Dywen diz. E da última vez que saiu em patrulha, disse que viu um urso com quatro metros e meio de altura – Mormont fungou. – Dizem que minha irmã tomou um urso como amante. Antes acredito nisso, do que num urso com quatro metros de altura. Se bem que num mundo onde os mortos andam… Ah... Mesmo assim, um homem tem de acreditar nos seus olhos. Vi o morto andando. Não vi nenhum urso gigante – dirigiu a Jon um longo olhar perscrutador. – Mas estávamos falando de mãos. Como está a sua?

– Melhor – Jon tirou a luva de pele de toupeira e a mostrou. O braço estava coberto de cicatrizes, desde a mão até metade do antebraço, e ainda sentia a salpicada pele cor-de-rosa esticada e sensível, mas estava sarando. – Mas ainda dá comichão. Meistre Aemon diz que isso é bom. Deu-me um unguento para levar comigo quando partirmos.

– Consegue manejar a Garralonga apesar da dor?

– Suficientemente bem – Jon flexionou os dedos, abrindo e fechando o pulso, como o meistre tinha lhe ensinado. – Tenho de trabalhar os dedos todos os dias para mantê-los flexíveis, como Meistre Aemon recomendou.

– Aemon pode ser cego, mas sabe do seu ofício. Rezo para que os deuses nos permitam conservá-lo por mais vinte anos. Você sabe que podia ter sido rei?

Jon foi pego de surpresa.

– Ele contou-me que o pai foi rei, mas não… Julguei que talvez fosse um filho mais novo.

– E era. O pai do pai era Daeron Targaryen, o Segundo do Seu Nome, que incorporou Dorne no reino. Parte do pacto determinava que casasse com uma princesa de Dorne. Ela deu-lhe quatro filhos. O pai de Aemon, Maekar, era o mais novo desses quatro, e Aemon foi o terceiro filho dele. Note que tudo isso aconteceu muito antes de eu ter nascido, por mais antigo que o Smallwood pense que eu seja.

– Meistre Aemon recebeu o nome em honra do Cavaleiro do Dragão.

– É verdade. Há quem diga que o Príncipe Aemon, e não Aegon, o Indigno, foi o verdadeiro pai do Rei Daeron. Seja como for, ao nosso Aemon faltava o temperamento marcial do Cavaleiro do Dragão. Gosta de dizer que possuía uma espada lenta, mas uma inteligência rápida. Não à toa o avô o enviou para a Cidadela. Tinha nove ou dez anos, creio… e também era o nono ou décimo na linha de sucessão.

Jon sabia que Meistre Aemon contava mais de uma centena de dias do seu nome. Frágil, mirrado, murcho e cego, era difícil imaginá-lo como um garotinho da idade de Arya.

Mormont continuou:

– Aemon estava às voltas com seus livros quando o mais velho dos seus tios, herdeiro da coroa, foi morto num acidente de torneio. Deixou dois filhos, mas seguiram-no para a sepultura não muito tempo depois, durante a Grande Peste da Primavera. O Rei Daeron também foi levado, e por isso a coroa passou para o segundo filho de Daeron, Aerys.

– O Rei Louco? – Jon estava confuso. Aerys tinha sido rei antes de Robert, e isso não há muito tempo atrás.

– Não, este foi Aerys Primeiro. O que Robert depôs foi o segundo desse nome.

– Há quanto tempo isso se passou?

– Oitenta anos, ou perto disso – disse o Velho Urso. – E, não, eu ainda não tinha nascido, embora Aemon já tivesse forjado meia dúzia de aros da sua corrente de meistre nessa época. Aerys casou com a irmã, como os Targaryen costumavam fazer, e reinou durante dez ou doze anos. Aemon fez seus votos e deixou a Cidadela para servir na corte de algum fidalguinho… até que seu real tio morreu sem deixar descendência. O Trono de Ferro passou para o último dos quatro filhos do Rei Daeron. Esse era Maekas, pai de Aemon. O novo rei convocou todos os filhos para a corte, e queria que Aemon participasse do seu conselho, mas este recusou, dizendo que isso usurparia o lugar que pertencia por direito ao Grande Meistre. Em vez disso, serviu na fortaleza do irmão mais velho, outro Daeron. Bem, esse também morreu, deixando como herdeira só uma filha de fraco entendimento. Alguma sífilis que pegou de uma puta, acho. O irmão seguinte era Aerion.

– Aerion, o Monstruoso? – Jon conhecia aquele nome. “O Príncipe que Pensava Ser Dragão” era uma das histórias mais horrendas da Velha Ama. Bran, seu irmão mais novo, adorava-a.

– Esse mesmo, embora chamasse a si próprio Aerion Chama-Viva. Uma noite, bem mamado, bebeu um frasco de fogovivo, depois de dizer aos amigos que isso o transformaria num dragão, mas os deuses foram misericordiosos, e o transformaram num cadáver. Menos de um ano depois, Rei Maekar morreu em batalha contra um lorde fora da lei.

Jon não era completamente ignorante em relação à história do reino; seu meistre tinha se assegurado disso.

– Esse foi o ano do Grande Conselho – ele completou. – Os senhores passaram por cima do filho pequeno do Príncipe Aerion e da filha do Príncipe Daeron e deram a coroa a Aegon.

– Sim e não. Primeiro, ofereceram-na, discretamente, a Aemon. E ele, também discretamente, a recusou. Disse-lhes que os deuses queriam que servisse, não que governasse. Que tinha prestado um juramento e não o quebraria, apesar de o próprio Alto Septão ter se oferecido para absolvê-lo. Bem, nenhum homem são queria um pingo do sangue de Aerion no trono, e a filha de Daeron era tola, além de ser mulher. Por isso não tiveram outra escolha que não fosse recorrer ao irmão mais novo de Aemon… Aegon, o Quinto do Seu Nome. Foi chamado de Aegon, o Improvável, nascido quarto filho de um quarto filho. Aemon sabia, e corretamente, que, se ficasse na corte, aqueles a quem o governo do irmão desagradava procurariam usá-lo, por isso veio para a Muralha. E aqui permaneceu, enquanto o irmão, o filho do irmão e o filho deste reinaram e morreram um atrás do outro, até Jaime Lannister pôr fim à linha dos Reis-Dragão.

Rei”, crocitou o corvo. A ave atravessou o aposento privado e foi pousar no ombro de Mormont. “Rei”, voltou a palrear, pavoneando-se de um lado para outro.

– Ele gosta dessa palavra – Jon sorriu.

– Uma palavra fácil de dizer, e fácil de gostar.

Rei”, a ave voltou a se manifestar.

– Acho que ele deseja que tenha uma coroa, senhor.

– O reino já tem três reis, e isso são dois a mais para o meu gosto.

Mormont afagou o corvo sob o bico com um dedo, mas os olhos nunca deixaram Jon Snow. Aquilo fez Jon se sentir estranho.

– Senhor, por que me disse isso sobre o Meistre Aemon?

– Preciso ter um motivo? – Mormont mexeu-se na cadeira, franzindo a testa. – Seu irmão Robb foi coroado Rei do Norte. Você e Aemon têm isso em comum. Um rei como irmão.

– E também – Jon completou: – um voto.

O Velho Urso soltou uma sonora bufada, e o corvo levantou voo, batendo as asas em círculo pela sala.

– Dê-me um homem por cada voto que vi quebrado, e a Muralha nunca mais sentirá falta de defensores.

– Sempre soube que Robb seria Senhor de Winterfell.

Mormont soltou um assobio, e a ave voou de novo para ele, instalando-se no seu braço.

– Um senhor é uma coisa, um rei é outra – ele deu ao corvo um punhado de milho tirado do bolso. – Vão vestir seu irmão Robb em sedas, cetins e veludos de cem cores diferentes, enquanto você vive e morre em cota de malha negra. Ele se casará com alguma bela princesa e será pai dos seus filhos. Você não terá esposa, nem segurará nos braços um filho do seu próprio sangue. Robb governará, você servirá. Os homens chamarão você de corvo. Ele, de Vossa Graça. Cantores elogiarão cada coisinha que ele fizer, enquanto os maiores dos seus feitos passarão despercebidos. Diga-me que nada disso o perturba, Jon… e eu chamarei você de mentiroso, e saberei que tenho razão.