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"Ah, entendi."

"O que Einstein nos deu foi a informação de que tinha usado uma cifra de Alberti e mostrou-nos quais as duas sequências corretas dos alfabetos de cifra."

Greg apontou para a segunda linha da mensagem cifrada.

"Se utilizarmos esse método, saberemos qual a mensagem ocultada por este !ya ovqo?"

"Sim, em princípio sim."

"Então do que estamos à espera? Let's do it, pal!"

Tomás pegou na caneta e comparou cada letra aos alfabetos de cifra.

"Ora bem, vamos lá a ver o que significa este !ya ovqo." Suspirou. "O y do primeiro alfabeto de cifra corresponde a um i e o a no segundo alfabeto de cifra 347

corresponde a um l." Rabiscou as letras. "Hmm... o o dá r e o v dá s. O q é um v e o o é um b."

A frase emergiu no papel.

!il rrsvb

"Não estou a perceber", disse Greg, carregando as sobrancelhas. "Il rsvb”? Mas o que é isto?"

"É a mensagem original cifrada por Einstein", explicou Tomás.

O americano ergueu os olhos e mirou-o com uma expressão interrogativa.

"Mas isto não significa nada..."

"Pois não."

"E então?"

"E então, temos de prosseguir a decifração, não acha?"

"Prosseguir a decifração? Como assim? Isto não está decifrado?"

"É evidente que não", exclamou Tomás. "Como você constatou, il rsvb não significa nada. O que quer dizer que apenas cumprimos um passo da decifração."

"Há mais passos, é?"

"Claro que há." Apontou para a última palavra rabiscada por baixo das linhas com os alfabetos. "Está a ver este nome aqui?"

"Sim. O que tem?"

"Consegue ler?"

Greg inclinou-se sobre o papel.

"At... uh... atbart?"

"Atbash."

"Atbask", repetiu o americano. "O que é isso?"

"O atbask é uma forma tradicional de cifra de substituição hebraica, utilizada para ocultar significados no Antigo Testamento. A idéia é pegar numa letra que está, por exemplo, a três lugares do início do alfabeto e substituí-la pela letra correspondente a três lugares do fim do alfabeto. Assim o c torna-se x, não é? A terceira letra a contar do princípio é substituída pela terceira do fim, e assim sucessivamente."

"Estou a entender."

"Há vários exemplos de atbasb no Antigo Testamento. Em Jeremias aparece por vezes a palavra chechac, começando por duas letras hebraicas shin e por um kaph.

Ora, o shin é a penúltima letra do alfabeto hebraico. Substituindo-a pela segunda do alfabeto ficamos com beth. Kaph é a décima segunda letra a contar do fim, pelo que vamos substituí-la pela décima segunda letra a contar do princípio, o lamed. Portanto, o shinshinkaph, que dá chechac, torna-se beth-beth-lamed. Babel. Chechac quer dizer Babel. Entendeu?"

"Sim, é engenhoso."

"Engenhoso e simples."

"Einstein utilizou atbash nesta sua cifra?"

348

"É o que diz a anotação, não é? Repare. Alberti significa, como é óbvio, a cifra de Alberti, com os correspondentes alfabetos de cifra. Atbash significa que temos agora de procurar as letras simétricas correspondentes a il rsvb, não é?"

"Parece lógico", concordou Greg. "Vamos a isso?"

Tomás cravou os olhos na anotação com !il rsvb e contou a posição de cada letra no alfabeto.

"Ora, o i é a nona do princípio. A nona do fim é... uh... o r. O l é a décima segunda do princípio, o que corresponde a... a... ao o. O r dá... dá i, o s... uh... dá h, o v dá... dá e e o b remete para o... o y."

Apresentou o resultado.

!ro ihey

"O que é isto?", perguntou Greg. "Ro ihey? O que significa isso?"

O criptanalista estreitou os olhos e estudou a mensagem, intrigado.

"Realmente... uh..." gaguejou, mordendo o lábio inferior. "Não sei... não sei o que seja."

"Será uma língua estranha?"

A sugestão fez Tomás arregalar os olhos.

"Pois é óbvio que é", exclamou. "Se é um sinal do Gênesis, tem de ser em hebraico, não é?"

"E você sabe hebraico?"

"Estou a aprender", disse. "Mas já sei o suficiente para perceber que o hebraico se lê da direita para a esquerda e não da esquerda para a direita." Pegou na caneta.

"Espere aí, vou pôr à nossa maneira."

Inverteu a sequência das letras.

Yehi or!

"Yehi or!", leu Greg. "O que quer dizer isso?"

Tomás empalideceu.

"Meu Deus! Meu Deus!"

"O que foi?"

"Yehi or! Não está a perceber? Yehi or!"

"Mas o que é isso?"

"See sign Gênesis. Yehi or!" Bateu com o indicador na frase rabiscada no papel.

"É este o sinal do Gênesis. Yehi or!"

"Sim, mas o que significa yehi or?"

Tomás olhou para Greg e para Ariana, estupefacto, embasbacado, digerindo a enormidade do que acabara de lhe ser revelado, invadido por um tropel de imagens e sons e palavras e pensamentos que, naquele instante, como que coreografados em 349

súbita sincronia, como uma sublime melodia que emerge da orquestra mais caótica, se encaixaram uns nos outros e extraíram da treva a verdade mais profunda.

Om.

O om primordial que criou o universo ressoou-lhe na memória pelo coro cavado dos monges tibetanos. Foi ao som penetrante do mantra fundador que se lembrou do permanente bailado de nascimento e morte, de criação e destruição, a divina coreografia incorporada na eterna dança de Shiva; e foi ainda com aquela sílaba sagrada a ecoar-lhe na mente que compreendeu o segredo da Criação, o enigma por detrás do Alfa e para além do Ômega, a equação que faz do universo o universo, o misterioso desígnio de Deus, o surpreendente objetivo da vida, o software inscrito no hardware do cosmos.

O endgame da existência.

Diante de si, rabiscada a caneta, inscrevia-se a fórmula que rompe a não-existência e tudo cria.

Tudo, incluindo o Criador.

"Tomás", insistiu o americano, impaciente, quase abanando o seu interlocutor. "O

que diabo significa yehi or?"

O criptanalista olhou para ele e para Ariana, olhou-os com espanto e maravilha, olhou-os como se tivesse despertado de um longo transe e, num sopro tênue, quase temeroso, nomeou enfim a equação mágica, o enunciado a que a inteligência que se espalhar pelo universo terá um dia de recorrer para escapar ao cataclismo do fim dos tempos e começar tudo de novo.

A fórmula de Deus.

"Faça-se luz!"

O rosto de Greg permaneceu inexpressivo, como uma janela fechada que esconde o brilho do dia para lá dela, como uma tela branca que espera o pincel colorido que lhe dará vida.

"Faça-se luz?", murmurou por fim. "Não estou a perceber..."

Tomás inclinou-se para a frente, aproximando o seu rosto excitado da face opaca do americano.

"É esta a prova bíblica da existência de Deus. Faça-se luz!"

O seu interlocutor abanou a cabeça, ainda sem nada compreender.

"Desculpe, mas isso não faz qualquer sentido. Como é que esta expressão prova a existência de Deus?"

O criptanalista suspirou, impaciente.

"Ouça, Greg. A expressão em si não prova a existência de Deus. Ela tem de ser interpretada no contexto das descobertas feitas no campo da ciência, está a perceber?

É essa a verdadeira razão pela qual Einstein não quis divulgar o seu manuscrito. Ele sabia que este enunciado bíblico não chegava, era necessária confirmação científica."