Выбрать главу

— Alguma coisa está acontecendo lá fora — avisou Hurin, com urgência. — Um homem acaba de chegar correndo, e estão num alvoroço só, como peixes em um balde. Esperem. O oficial está vindo aqui para dentro!

— Vão! — bradou Ingtar. Ele tentou pegar a Trombeta, mas Mat já estava correndo. Rand hesitou, mas Ingtar agarrou seu braço e o puxou para o corredor. Os outros seguiram em ila atrás de Mat. Perrin dirigiu apenas um olhar sofrido para Rand, antes de ir. — Você não vai conseguir salvar a garota se ficar aqui e morrer!

Rand correu com eles. Parte dele se odiava por fugir, mas outra parte sussurrava: Eu vou voltar. Vou dar um jeito de libertá-la.

Quando chegaram ao fim da escada estreita e curva, ele pôde ouvir a voz profunda de um homem se erguer na parte da frente da casa, exigindo, com irritação, que alguém se levantasse e falasse. Uma serviçal vestida com uma túnica quase transparente se ajoelhava ao pé da escada. Uma mulher grisalha, toda coberta de lã branca e com um longo avental, fazia o mesmo à porta da cozinha. Ambas estavam exatamente como Mat descrevera, com o rosto no chão e os braços ao redor da cabeça, e não moveram sequer um dedo quando Rand e os outros passaram. Ele ficou aliviado ao notar que ainda respiravam.

Atravessaram o jardim em uma corrida desabalada, escalando o muro dos fundos mais do que depressa. Ingtar xingou quando Mat jogou a Trombeta de Valere à frente, e tentou pegá-la outra vez ao aterrissar do outro lado, mas o rapaz a apanhou com um rápido:

— Não está nem arranhada. — E disparou pela viela.

Mais gritos vinham da casa da qual haviam acabado de sair. Ouviu-se o berro de uma mulher e alguém começou a soar um gongo.

Voltarei para buscá-la. Vou dar um jeito. Rand correu atrás dos outros o mais rápido que pôde.

46

Sair da Sombra

Ao se aproximarem dos prédios onde ficavam as damane, Nynaeve e as outras ouviram gritos distantes. A multidão começava a aumentar, e as pessoas na rua pareciam nervosas, andando com passos um pouco mais apressados. Pareciam mais cautelosos do que o normal ao olharem de relance para Nynaeve, em seu vestido com raios, e para a mulher que ela levava, presa pela corrente prateada.

Reacomodando a trouxa que trazia em seus braços, Elayne, também nervosa, olhava na direção do barulho e dos gritos. A comoção estava a uma rua dali, onde o estandarte do gavião dourado com um raio em suas garras tremulava ao vento.

— O que está acontecendo?

— Nada que tenha a ver conosco — respondeu Nynaeve, firme.

— É o que você espera — comentou Min. — E eu também. — Ela apressou o passo, subindo a escada antes das outras, e desapareceu dentro da alta casa de pedra.

Nynaeve encurtou a corrente.

— Lembre-se, Setah, você quer que tudo corra bem tanto quanto a gente.

— Sim, sim — respondeu a Seanchan, com fervor. — Não causarei nenhum problema para vocês, eu juro.

Enquanto subiam os degraus de pedra cinza, uma sul’dam e uma damane surgiram no topo da escada, descendo-a. Após olhar de relance para se certi ficar de que a mulher na coleira não era Egwene, Nynaeve não prestou mais atenção a elas. Usava o a’dam para manter Setah bem junto a si, de modo que, caso a damane percebesse a habilidade de canalizar em uma delas, pensaria que tratava-se de Setah. Contudo, ainda sentiu o suor escorrendo pelas costas, até perceber que as duas não lhe deram mais atenção do que dera a elas. Tudo que viam foi um vestido com raios e outro cinza, e a corrente prateada de um a’dam que unia as duas mulheres. Eram apenas mais uma Senhora do Colar com sua Encolarada, seguidas por uma garota local que corria com um embrulho pertencente à sul’dam.

Nynaeve empurrou a porta, e elas entraram.

Qualquer que fosse o alvoroço ao redor do estandarte de Turak, a confusão não chegara até ali. Pelo menos, ainda não. Apenas mulheres se deslocavam de um lado a outro no salão de entrada, e todas podiam ser identificadas com facilidade pelas vestimentas. Três damane de vestidos cinza, acompanhadas por suas sul’dam. Duas mulheres em vestidos de raios bifurcados estavam paradas conversando, e outras três atravessavam o salão, sozinhas. Quatro outras, vestidas como Min, com roupas simples de lã, passavam apressadas carregando bandejas.

Min estava parada, esperando do outro lado do salão, quando elas entraram. Olhou de relance para elas apenas uma vez e seguiu mais para dentro da casa. Nynaeve conduziu Setah atrás de Min, com Elayne na cola. Ninguém prestou atenção nelas, pelo que pareceu à Sabedoria, mas ela achava que o fio de suor que descia por suas costas logo se tornaria um rio. Forçou Setah a andar mais depressa, de modo que ninguém tivesse a chance de examiná-las com atenção ou, pior ainda, de fazer alguma pergunta. Com os olhos fixos nos próprios pés, a mulher precisou de tão pouco incentivo que Nynaeve achou que ela correria, se não estivesse presa por uma corrente.

Perto dos fundos da casa, Min subiu por uma estreita escada em espiral. Nynaeve empurrou Setah na frente, até o quarto andar. O teto ali era baixo, e os corredores, vazios e silenciosos, exceto pelos suaves sons de choro. O choro parecia combinar com aqueles corredores gélidos.

— Este lugar… — começou Elayne, e então sacudiu a cabeça. — Dá uma sensação…

— Sim, dá — concordou Nynaeve, em tom sombrio.

Ela olhou com ódio para Setah, que mantinha a cabeça baixa. O medo deixava a pele da Seanchan ainda mais pálida do que o normal.

Sem dizer uma palavra, Min abriu uma porta e entrou, e as outras a seguiram. O cômodo fora dividido em quartos menores com paredes rústicas de madeira, e um corredor estreito levava a uma janela. Nynaeve seguiu atrás de Min, que foi, apressada, para a última porta e entrou, abrindo-a com um empurrão.

Uma garota esbelta, vestida de cinza e com cabelos compridos estava sentada a uma pequena mesa, descansando a cabeça nos braços cruzados. Mesmo antes de ela olhar para cima, Nynaeve sabia que era Egwene. Uma corrente de metal brilhante ia da coleira prateada em seu pescoço até um bracelete pendurado em um pino na parede. Os olhos dela se arregalaram ao vê-las, e ela balbuciou palavras soltas. Quando Elayne fechou a porta, Egwene soltou uma risadinha súbita, então pôs as mãos na boca para abafá-la. O pequeno quarto estava mais do que lotado com todas dentro.

— Sei que não estou sonhando — disse, com a voz trêmula —, porque, se estivesse, seriam Rand e Galad em garanhões altos. Ando sonhando. Achei que Rand estava aqui. Não consegui vê-lo, mas achei que… — Ela não terminou a frase.

— Se você prefere esperar por eles… — começou Min, seca.

— Ah, não! Não, vocês são todas lindas, as coisas mais lindas que já vi! De onde saíram? Como fizeram isso? Esse vestido, Nynaeve, e o a’dam… E quem é… — Ela soltou um guincho. — É Setah. Como…? — Sua voz endureceu tanto que Nynaeve mal a reconheceu. — Gostaria de enfiá-la em um caldeirão fervente.

A mulher mantinha os olhos bem fechados, e suas mãos agarravam a saia. Ela tremia.

— O que fizeram com você? — perguntou Elayne. — O que poderiam ter feito para você desejar cometer uma coisa dessas?

Egwene não desviou os olhos da Seanchan um momento sequer.

— Gostaria de fazer com que ela sentisse isso. Foi o que ela fez comigo, me fez sentir como se estivesse imersa até o pescoço em… — Ela estremeceu. — Você não sabe como é usar uma dessas, Elayne. Não sabe o que elas podem fazer com você. Não consigo decidir quem é pior, Setah ou Renna, mas todas são horríveis.

— Acho que eu sei — respondeu Nynaeve, em voz baixa.

Ela conseguia sentir o suor encharcando a pele de Setah, os tremores frios em seus braços. A Seanchan loura estava aterrorizada. A Sabedoria quase não conseguiu se impedir de fazer com que os terrores da mulher se concretizassem ali mesmo.