até ele.
Dany estava mais fraca do que julgara. Sor Jorah pôs o braço
ao seu redor e a ajudou a ficar em pé.
- Há tempo suficiente para isto mais tarde, princesa - disse ele
em voz baixa.
- Quero vê-lo agora, Sor Jorah.
Depois da escuridão da tenda, o mundo lá fora era tão
brilhante que cegava. O sol queimava como ouro derretido, e a
terra estava seca e vazia. As aias esperavam com frutas, vinho
e água, e Jhogo aproximou-se para ajudar Sor Jorah a suportar-
lhe o peso. Aggo e Rakharo seguiam atrás. O clarão do sol na
areia fez com que lhe fosse difícil ver mais, até Dany erguer a
mão para dar sombra aos olhos. Viu as cinzas de uma fogu eira,
alguns cavalos que andavam às voltas, apaticamente, em busca
de um pouco de capim, tendas e esteiras espalhadas. Uma
pequena multidão de crianças reunira-se para vê-la, e atrás
delas vislumbrou mulheres que tratavam de seus deveres e
velhos mirrados que olhavam o céu azul uniforme com olhos
cansados, enxotando fracamente moscas de sangue. Uma
contagem mostraria umas cem pessoas, não mais. Onde as
outras quarenta mil tinham montado acampamento, só o vento
e a poeira restavam agora.
- O khalasar de Drogo desapareceu - disse ela.
- Um khal que não pode montar não é um khal - disse Jhogo.
- Os dothrakis seguem apenas os fortes - disse Sor Jorah. -
Lamento, minha princesa. Não havia maneira de detê -los. Ko
Pono foi o primeiro a partir, chamando-se a si mesmo Khal
Pono, e muitos o seguiram. Jhaqo não esperou muito tempo
para fazer o mesmo. O resto foi se esgueirando noite após
noite, em bandos grandes e pequenos. Há uma dúzia de novos
khalasares no mar dothraki, no lugar que em tempos passados
foi apenas de Drogo.
- Os velhos ficaram - disse Aggo. - Os assustados, os fracos e
os doentes. E nós, que juramos. Nós ficamos.
- Levaram as manadas de Khal Drogo, khaleesi - disse Rakharo.
- Não éramos suficientes para impedir. É direito dos fortes
roubar dos fracos. Levaram também muitos escravos, do khal e
seus, mas deixaram alguns.
- Eroeh? - perguntou Dany, lembrando-se da criança assustada
que salvara fora da cidade dos Homens-Ovelhas.
- Mago, que é agora companheiro de sangue de Khal Jhaqo,
capturou-a para si - disse Jhogo. - Montou-a por cima e por
baixo e a deu ao seu khal, e Jhaqo a deu aos seus outros
companheiros de sangue. Eram seis. Quando ficaram satisfeitos,
cortaram-lhe a garganta.
- Foi o destino dela, khaleesi - disse Aggo.
Se olhar para trás, estou perdida.
- Foi um destino cruel - disse Dany -, mas não tão cruel como
será o de Mago, Prometo, pelos velhos deuses e pelos novos,
pelo deus-ovelha e pelo deus-cavalo e por todos os deuses que
vivem. Juro pela Mãe das Montanhas e o Ventre do Mundo.
Antes de acabar com eles, Mago e Ko Jhaqo suplicarão pela
clemência que mostraram a Eroeh,
Os dothrakis trocaram olhares inseguros.
- Khaleesi - explicou a aia Irri, como se estivesse falando com
uma criança. - Jhaqo é agora um khal, à frente de vinte mil
cavaleiros.
Dany ergueu a cabeça,
- E eu sou Daenerys, nascida na Tempestade, Daenerys da Casa
Targaryen, do sangue de Aegon, o Conquistador, e Maegor, o
Cruel, e da velha Valíria antes deles. Sou a filha do dragão, e,
juro-lhes, esses homens morrerão aos gritos. Agora leve -me a
Khal Drogo.
Jazia sobre a terra vermelha e nua, de olhos fixos no sol.
Uma dúzia de moscas de sangue pousara em seu corpo,
embora ele não parecesse senti-las, Dany enxotou-as e
ajoelhou-se a seu lado. Os olhos dele estavam muito abertos,
mas não viam, e ela compreendeu de imediato que Drogo
estava cego. Quando sussurrou seu nome, não pareceu ouvir. A
ferida no peito estava curada como jamais poderia estar, com a
cicatriz que a cobria cinzenta e vermelha e hedionda.
- Por que ele está aqui sozinho ao sol? - perguntou-lhes.
- Parece gostar do calor, princesa - disse Sor Jorah. - Seus
olhos seguem o sol, embora não o veja. Consegue fazer algo
semelhante ao andar. Vai para onde o levam, mas não mais
longe. Come se lhe puserem comida na boca e bebe se lhe
escorrerem água para os lábios.
Dany beijou o seu sol-e-estrelas suavemente na testa, e ergueu-
se para encarar Mirri Maz Duur.
- Seus feitiços são caros, maegi.
- Ele vive - disse Mirri Maz Duur. - Você pediu vida, e pagou
por vida.
- Isto não é vida para quem era como Drogo. Sua vida eram
gargalhadas e carne assando numa fogueira, e um cavalo entre
as pernas. Sua vida eram um arakh na mão e as campainhas
tinindo no cabelo enquanto cavalgava ao encontro de um
inimigo. Sua vida eram os seus companheiros de sangue, e eu,
e o filho que lhe devia ter dado.
Mirri Maz Duur não deu resposta.
- Quando voltará a ser como era? - quis saber Dany.
- Quando o sol nascer no ocidente e se puser no oriente - disse
Mirri Maz Duur. - Quando os mares secarem e as montanhas
forem sopradas pelo vento como folhas. Quando seu ventre
voltar a ganhar vida para dar à luz um filho vivo. Então, e não
antes, ele regressará.
Dany fez um gesto para Sor Jorah e os outros.
- Deixem-nos. Quero falar a sós com esta maegi - Mormont e
os dothrakis retiraram-se. - Você sabia - disse Dany depois de
eles irem embora. Sentia dor, por dentro e por fora, mas a
fúria dava-lhe forças. - Você sabia o que eu estava comprando
e conhecia o preço, e mesmo assim me deixou pagá-lo.
- Foi errado da parte deles terem queimado meu templo - disse
placidamente a pesada mulher de nariz achatado. - Isso
enfureceu o Grande Pastor.
- Isto não foi trabalho de nenhum deus -Dany disse friamente.
Se olhar para trás, estou perdida.
- Enganou-me. Assassinou meu filho dentro de mim.
- O garanhão que monta o mundo já não queimará cidades. O
seu khalasar não transformará nações em poeira.
- Eu intervim por você - disse Dany, angustiada. - Salvei-a.
- Salvou-me? - cuspiu a lhazarena. - Três guerreiros já tinham
me possuído, não como um homem possui uma mulher, mas
por trás, como um cão possui uma cadela. O quarto estava
dentro de mim quando você passou por ali. Como foi que me
salvou? Vi a casa do meu deus arder, o lugar onde curei
homens bons sem conta. Também me queimaram a casa, e na
rua vi pilhas de cabeças. Vi a cabeça de um padeiro que me
fazia o pão. Vi a cabeça de um rapaz que salvei da febre do
olho morto havia só três luas. Ouvi crianças chorando quando
os guerreiros as arrancaram de casa à chicotada. Diga-me lá
outra vez o que salvou.
- A sua vida.
Mirri Maz Duur soltou uma gargalhada cruel.
- Olha para o seu khal e vê de que serve a vida quando todo o
resto desapareceu.
Dany chamou os homens do seu khas e lhes pediu para
prenderem Mirri Maz Duur e atarem seus pés e mãos, mas a
maegi sorriu-lhe quando a levaram, como se partilhassem um
segredo. Uma palavra, e Dany podia ter feito com que a