aí,
- Hoje não tenho disposição para a sua insolência - Tyrion virou-se
para o sobrinho. - Joffrey, íá é mais que tempo de ir falar com Lorde
Eddard e sua senhora para lhes oferecer seu consolo.
Joffrey pareceu tão petulante como só um jovem príncipe podia ser.
- E que bem lhes faria o meu consolo?
- Nenhum - disse Tyrion. - Mas espera-se que faça isto. Sua ausência
foi notada.
- O rapaz Stark não me é nada - disse Joffrey. - Não consigo suportar
os choros das mulheres. Tyrion Lannister ergueu o braço e deu no
sobrinho um forte tapa na cara. A bochecha do rapaz começou a
corar.
- Uma palavra - disse Tyrion -, e bato outra vez.
- Vou contar para minha mãe! - exclamou Joffrey.
Tyrion bateu-lhe de novo. Agora ambas as bochechas ardiam.
- Vai lá contar para ela - disse-lhe Tyrion. - Mas primeiro vá falar
com o Senhor e a Semora Stark, ponha-se de joelhos e lhes diga o
quanto lamenta e que está a seu serviço se houver alguma coisa que
possa fazer por eles nesta hora desesperada, e que lhes dedica todas
as suas preces. Compreende? Compreende?
O rapaz fez cara de quem ia chorar. Mas, em vez disso, deu um
fraco aceno com a cabeça. Depois se virou e fugiu correndo do pátio,
com as mãos cobrindo o rosto. Tyrion ficou vendo-o correr.
Uma sombra caiu-lhe sobre o rosto. Virou-se e deparou com
Clegane, que se erguia acima ia sua cabeça como uma falésia. A
armadura negra como fuligem do cavaleiro parecia embotar o sol. Ele
tinha baixado o visor do elmo, moldado de forma a parecer-se com a
cabeça de um cão de caça negro, de dentes arreganhados, assustador
ao olhar, mas Tyrion sempre o considerara uma grande melhoria
comparado à cara horrivelmente queimada de Clegane.
- O príncipe se recordará disto, pequeno senhor - preveniu o Cão de
Caça, e o elmo transformou sua gargalhada num estrondo oco.
- Rezo para que se recorde - respondeu Tyrion Lannister. - Caso se
esqueça, seja um bom cãozinho e o relembre - passou os olhos pelo
pátio. - Sabe onde posso encontrar meu irmão?
- Está no desjejum com a rainha.
- Ah - respondeu Tyrion. Inclinou negligentemente a cabeça para
Sandor Clegane e afastou-se, assobiando, com tanta vivacidade
quanto suas pernas deformadas permitiam. Sentia pena do primeiro
cavaleiro a medir forças hoje com o Cão de Caça. O homem tinha
mau gênio.
Uma refeição fria e triste tinha sido servida na sala de estar da Casa
de Hóspedes. Jaime estava sentado a uma mesa com Cersei e as
crianças, conversando em voz baixa e abafada,
- Robert ainda está deitado? - perguntou Tyrion ao sentar-se à mesa
sem ser convidado.
A irmã o olhou com a mesma tênue expressão de desagrado que
ostentava desde o dia em que ele nascera.
- O rei não chegou a dormir - informou. - Está com Lorde Eddard. O
desgosto do amigo o atingiu profundamente no coração.
- Tem um grande coração o nosso Robert - disse Jaime com um
sorriso indolente. Eram muito poucas as coisas que Jaime levava a
sério. Tyrion conhecia essa característica do irmão, e o perdoava.
Durante todos os terríveis longos anos da infância, só Jaime lhe
mostrara o menor sinal de afeto ou respeito, e por isso Tyrion estava
pronto a perdoar-lhe quase tudo.
Um servo aproximou-se.
- Pão - disse-lhe Tyrion -, e dois daqueles peixinhos, e uma caneca
daquela bela cerveja preta para empurrá-los para baixo. Ah, e algum
bacon. Queime-o até ficar preto - o homem fez uma reverência e
afastou-se. Tyrion voltou a virar-se para os irmãos. Gêmeos, um
homem e uma mulher. E, naquela manhã, pareciam-se muito. Ambos
tinham escolhido um verde profundo que combinava com seus olhos.
Os caracóis louros eram em ambos uma confusão elegante, e orna-
mentos de ouro brilhavam em seus pulsos, dedos e gargantas.
Tyrion perguntou a si próprio como seria ter um gêmeo, mas decidiu
que preferia não saber. Já era suficientemente ruim encarar-se todos
os dias no espelho. Outro dele era uma idéia terrível demais para
imaginar.
Príncipe Tommen falou:
- Tem notícias de Bran, tio?
- Passei ontem à noite pela enfermaria - anunciou Tyrion. - Não
havia alterações. O meistre acha que é sinal esperançoso.
- Não quero que Brandon morra - disse Tommen timidamente. Era
um bom rapaz. Não era como o irmão, mas também Jaime e Tyrion
não eram propriamente a imagem um do outro.
- Lorde Eddard tinha também um irmão chamado Brandon -
meditou Jaime. - Um dos reféns assassinados por Targaryen. Parece
ser um nome sem sorte.
- Ah, certamente não é assim tão desafortunado - disse Tyrion. O
servo trouxe-lhe o prato, e ele partiu um bocado de pão escuro.
Cersei o estava estudando com prudência.
- O que quer dizer?
Tyrion deu-lhe um sorriso torto.
- Ora, apenas que Tommen pode ver realizado seu desejo. O meistre
pensa que o rapaz pode sobreviver - e bebeu um trago de cerveja.
Myrcella fez um arquejo de contentamento, e Tommen sorriu
nervosamente, mas Tyrion não estava observando as crianças. O
olhar que Jaime e Cersei trocaram não durou mais de um segundo,
mas não lhe passou despercebido. Então, a irmã deixou cair seu olhar
sobre a mesa.
- Isto não é nenhuma misericórdia. Estes deuses nortenhos são cruéis
ao deixar que crianças passem por tamanha dor.
- Quais foram as palavras do meistre? - Jaime perguntou.
O bacon estalou ao ser mordido. Tyrion mastigou por um momento,
pensativo, e disse:
- Ele pensa que se o rapaz fosse morrer, já teria acontecido. E já se
passaram quatro dias sem nenhuma alteração.
- Será que Bran ficará melhor, tio? - perguntou a pequena Myrcella,
que tinha toda a beleza da mãe, mas nada da sua natureza,
- Ele quebrou a coluna, minha menina - informou Tyrion. - O
meistre só tem esperança
- Tyrion mastigou mais um pouco de pão. - Eu seria capaz de jurar
que é aquele seu lobo que o mantém vivo. A criatura fica junto à sua
janela dia e noite uivando. E sempre que o afugentam, ele volta. O
meistre disse que uma vez fecharam a janela, para abafar o barulho,
e Bran pareceu ficar mais fraco. Quando voltaram a abri-la, seu
coração bateu com mais força.
A rainha estremeceu.
- Há qualquer coisa que não é natural nesses animais - disse. - São
perigosos. Não quero que nenhum deles venha para o Sul conosco.
Jaime interveio:
- Teremos dificuldade em impedi-los de ir, irmã. Eles seguem aquelas
moças para todo lado. Tyrion atacou o peixe.
- Vão então partir em breve?
- Não será breve o suficiente - disse Cersei.
Então franziu a sobrancelha. - Não vamos partir? - ela disse alto. -
Então, e você? Deuses, não me diga que vai ficar aqui?
Tyrion encolheu os ombros.
- Benjen Stark regressará à Patrulha da Noite com o filho bastardo do
irmão. Penso em ir com eles e ver esta Muralha de que tanto
ouvimos falar.
Jaime sorriu.
- Espero que não esteja pensando em vestir o negro, querido irmão.
Tyrion soltou uma gargalhada.
- O quê, eu, celibatário? As prostitutas passarão a pedintes entre
Dorne e Rochedo Casterly. Não, só quero subir ao topo da Muralha e