que esta visita nos custou, Leve os livros daqui.
- Minha senhora, a comitiva do rei tinha apetites saudáveis. Temos de
voltar a fornecer os nossos armazéns antes que..
Ela o interrompeu.
- Eu disse para levar os livros daqui. O intendente tratará das nossas
necessidades.
- Não temos intendente - lembrou-lhe Meistre Luwin.
Como uma pequena ratazana cinzenta, pensou ela, o homem não a
largava. - Poole foi para o Sul a fim de organizar a casa de Lorde
Eddard em Porto Real.
Catelyn anuiu de forma ausente.
- Ah, sim. Lembro-me - Bran parecia tão pálido. Perguntou a si
própria se poderiam deslocar a cama até junto da janela para que
recebesse o sol da manhã.
Meistre Luwin depositou a candeia num nicho perto da porta e
ajustou seu pavio.
- Há várias nomeações que requerem a vossa atenção imediata,
minha senhora. Além do intendente, precisamos de um capitão dos
guardas para o lugar dejory, um novo mestre dos cavalos...
Os olhos dela dardejaram em redor e o encontraram.
- Um mestre dos cavalos? - sua voz era um chicote.
O meistre ficou abalado.
- Sim, minha senhora. Hullen foi para o Sul com Lorde Eddard, por
isso...
- Meu filho jaz aqui partido e morrendo, Luwin, e quer conversar
sobre um novo mestre dos cavalos? Acha que me importa o que
acontece nos estábulos? Acha que isso tem alguma importância para
mim? De bom grado mataria com as minhas próprias mãos os
cavalos de Winterfell um a um se isso fizesse com que os olhos de
Bran se abrissem. Compreende isso? Compreende?
Ele inclinou a cabeça.
- Sim, minha senhora, mas as nomeações...
- Eu farei as nomeações - disse Robb.
Catelyn não o ouvira entrar, mas ali estava ele, na soleira da porta,
olhando-a. Compreendeu com um súbito ataque de vergonha que
estava gritando. O que estava acontecendo com ela? Estava tão
cansada, e sua cabeça doía constantemente.
Meistre Luwin desviou o olhar de Catelyn para o filho.
- Preparei uma lista daqueles em que podemos querer pensar para os
cargos vagos - disse, oferecendo a Robb um papel retirado de dentro
da manga.
O filho de Catelyn olhou os nomes. Ela percebeu que ele viera de
fora: tinha as bochechas vermelhas do frio e os cabelos desgrenhados
pelo vento.
- São bons homens - disse. - Falaremos deles amanhã - devolveu a
lista de nomes.
- Muito bem, senhor - o papel desapareceu dentro da manga.
- Agora, deixe-nos - disse Robb.
Meistre Luwin fez uma reverência e partiu. Robb fechou a porta
atrás dele e virou-se para ela. Catelyn reparou que o filho usava uma
espada.
- Mãe, o que está fazendo?
Catelyn sempre achara que Robb se parecia com ela; tal como Bran,
Rickon e Sansa, possuía as cores dos Tully, os cabelos ruivos, os
olhos azuis. Mas agora, pela primeira vez, via algo de Eddard Stark
no seu rosto, algo tão resistente e duro como o Norte.
- Que estou fazendo? - respondeu num eco, confusa. - Como pode
me perguntar isso? O que imagina que estou fazendo? Estou
cuidando do seu irmão, Estou cuidando de Bran.
- É esse o nome que dá a isto? Não saiu deste quarto desde que Bran
se machucou. Nem sequer foi ao portão quando o Pai e as meninas
partiram para o Sul.
- Dei-lhes as minhas despedidas aqui e os vi partir daquela janela -
ela suplicara a Ned que não partisse, não agora, não depois do que
acontecera; tudo tinha mudado, ele não compreendia isso? Sem
sucesso. Ele dissera-lhe que não tinha escolha, e então saíra, fazendo
sua escolha. - Não posso deixá-lo, nem por um momento, quando
qualquer momento pode ser o último. Tenho de estar com ele, se...
se... - pegou na mão flácida do filho, deslizando seus dedos entre os
dele, Ele estava frágil e magro, não lhe restava nenhuma força na
mão, mas ainda podia sentir o calor da vida na sua pele.
A voz de Robb suavizou-se.
- Ele não vai morrer, mãe. Meistre Luwin diz que o maior perigo já
passou.
- E se Meistre Luwin se enganar? E se Bran precisar de mim e eu
não estiver aqui?
- Rickon precisa da senhora - disse Robb em tom penetrante. - Só
tem três anos, não compreende o que está se passando. Pensa que
todos o abandonaram, e por isso me segue para todo o lado,
agarrando-se à minha perna e chorando. Não sei o que fazer com ele
- fez uma pequena pausa, mordendo o lábio inferior como fazia
quando era pequeno. - Mãe, eu também preciso da senhora. Estou
tentando, mas não posso... não posso fazer tudo sozinho - sua voz
quebrou-se com súbita emoção, e Catelyn lembrou-se de que ele
tinha apenas catorze anos. Quis levantar-se e ir falar com ele, mas
Bran ainda segurava sua mão, e não podia se mover.
Fora da torre, um lobo começou a uivar. Catelyn estremeceu, só por
um segundo.
- É o de Bran - Robb abriu a janela e deixou entrar o ar da noite no
abafado quarto da torre. Os uivos ficaram mais fortes. Era um som
frio e solitário, cheio de melancolia e desespero.
- Não - disse ela. -Bran precisa ficar quente.
- Ele precisa ouvi-los cantar - disse Robb. Em outro ponto, em
Winterfell, um segundo lobo começou a uivar em coro com o
primeiro. Depois um terceiro, mais perto. - Cão Felpudo e Vento
Cinzento - disse Robb enquanto as vozes dos lobos se erguiam e
caíam em conjunto. - É possível identificá-los se ouvirmos com
atenção.
Catelyn estava tremendo. Era a dor, o frio, os uivos dos lobos
gigantes. Noite após noite, os uivos, o vento frio e o vazio castelo
cinzento continuavam, imutáveis, e o seu rapaz jazendo ali,
quebrado, o mais doce dos seus filhos, o mais gentil, o Bran que
gostava de rir, de escalar, de sonhos de cavalaria, tudo agora
desaparecido, nunca mais o ouviria rir. Soluçando, libertou sua mão
da dele e cobriu os ouvidos contra aqueles terríveis uivos.
- Faça-os parar! - gritou. - Não aguento mais, faça-os parar, faça-os
parar, mate-os todos se for preciso, mas faça-os parar!
Não se lembrava de ter caído ao chão, mas era no chão que estava, e
Robb erguia-a, segurando-a com braços fortes.
- Não tenha medo, mãe. Eles nunca lhe fariam mal - ajudou-a a
caminhar até sua estreita cama no canto do quarto de doente, -
Feche os olhos - disse, em voz branda. - Descanse. Meistre Luwin
disse-me que quase não tem dormido desde a queda de Bran.
- Não posso - ela chorou. - Que os deuses me perdoem, Robb, mas
não posso, e se ele morre enquanto durmo, e se ele morre, e se ele
morre... - os lobos ainda uivavam. Ela gritou e voltou a tapar os
ouvidos. - Ah, deuses, feche a janela!
- Se me jurar que vai dormir - Robb foi até a janela, mas ao estender
as mãos para os postigos, outro som foi acrescentado ao fúnebre
uivar dos lobos gigantes. - Cães - ele disse, escutando. - Os cães
estão todos ladrando. Nunca antes tinham agido assim... - Catelyn o
ouviu prender a respiração. Quando ergueu os olhos, o rosto estava
pálido à luz da candeia.
- Fogo - murmurou o jovem. Fogo, pensou ela e, em seguida, Branl
- Ajude-me - disse, com urgência na voz, sentando-se. - Ajude-me