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submersos na água, como troncos negros com olhos e

dentes.

Nada daquilo parava Arya, claro. Um dia regressara com

seu sorriso de cavalo, o cabelo todo emaranhado e as

roupas cobertas de lama, agarrada a um rude buquê de

flores purpúreas e verdes para o pai. Sansa acalentou a

esperança de que ele dissesse a Arya para se portar bem e

agir como a senhora de boas famílias que era suposto s er,

mas ele assim não fez, limitou -se a abraçá-la e a

agradecer-lhe pelas flores. E isto só reforçou seus maus

modos.

Então, descobriu-se que as flores purpúreas eram

conhecidas por beijos de veneno, e Arya acabou com uma

irritação nos braços. Sansa supôs que aquilo lhe ensinaria

uma lição, mas Arya riu do assunto e no dia seguinte

esfregou lama nos braços, de cima a baixo, como uma

mulher ignorante qualquer do pântano, só porque o amigo

Mycah lhe dissera que faria desaparecer a comichão.

Também tinha nódoas negras nos braços e ombros,

vergões púrpuros escuros e manchas desbotadas verdes e

amarelas; Sansa os viu quando a irmã se despiu para

dormir. Como tinha arranjado aquilo, só os sete deuses

sabiam.

Arya ainda continuava a falar sobre coisas que vira n a

viagem para o Sul enquanto desfazia com a escova os nós

no pelo de Nymeria.

- Na semana passada, encontramos uma torre de vigia

assombrada e, no dia anterior, perse guimos uma manada

de cavalos selvagens. Devia tê -los visto correndo quando

sentiram o cheiro de Nymeria - a loba retorceu-se e Arya

ralhou com ela. - Para com isso, tenho de limpar o outro

lado, você está cheia de lama.

- Você não deve abandonar a coluna - relembrou-lhe

Sansa. - Foi o que o pai disse. Arya encolheu os ombros.

- Não fui longe. Seja como for, Nymeria sempre esteve

comigo. E nem sempre saio da coluna. Às vezes é

divertido cavalgar junto às carroças e conversar com as

pessoas.

Sansa sabia tudo sobre o tipo de gente com quem Arya

gostava de falar: escudeiros, cavalariços e criadas, homens

velhos e crianças nuas, cavaleiros livres de linguagem

rude e nascimento incerto. Arya fazia amizade com

qualquer um. Aquele Mycah era o pior; filho de um

carniceiro, com treze anos e desenfreado, dormia na

carroça das carnes e cheirava a matadour o. Bastava olhá-

lo para Sansa sentir-se enjoada, mas Arya parecia preferir

a companhia do rapaz à sua.

Sansa estava agora perdendo a paciência.

- Você tem de vir comigo - disse firmemente à irmã. -

Não pode dizer não à rainha. Septã Mordane conta

contigo.

Arya a ignorou. Puxou com força a escova. Nymeria

rosnou e rodopiou para longe, irritada.

- Volta já aqui!

- Vai ter bolos de limão e chá - continuou Sansa, toda

adulta e racional. Lady esfregou-se contra sua perna.

Sansa coçou-lhe as orelhas do modo que a l oba gostava, e

Lady sentou-se ao seu lado, observando a perseguição

entre Arya e Nymeria. - Por que motivo ia querer montar

um velho cavalo malcheiroso e ficar toda dolorida e suada

quando pode se encostar em almofadas de penas e comer

bolos com a rainha?

- Não gosto da rainha - Arya respondeu com indiferença.

Sansa prendeu a respiração, choca da por alguém, mesmo

que fosse Arya, poder dizer uma coisa daquelas, mas sua

irmã continuou a tagarelar, sem cuidado algum. - Ela nem

sequer me deixa levar Nymeria - enfiou a escova no cinto

e passou a perseguir a loba. Nymeria vigiava com

prudência sua aproximação,

- Uma casa rolante real não é lugar para um lobo - disse

Sansa. - E você bem sabe que a Princesa Myrcella tem

medo deles.

- Myrcella é um bebezinho - Arya agarrou Nymeria pelo

pescoço, mas no momento em que tirou a escova do cinto,

a loba gigante libertou-se com uma contorção e saltou

para longe dela. Frustrada, Arya atirou a escova ao chão. -

Loba má! - gritou.

Sansa não conseguiu evitar um pequeno sorriso. O me stre

do canil lhe dissera uma vez que um animal sai ao dono.

Deu a Lady um pequeno e rápido abraço. Lady lambeu -lhe

o rosto. Sansa soltou um risinho. Arya ouviu e deu meia-

volta, olhando-a furiosa.

- Não me interessa o que você possa dizer, eu vou

montar - seu longo rosto de cavalo tinha a expressão

teimosa que significava que faria algo de propósito.

-Juro pelos deuses, Arya, às vezes você não passa de uma

criança - Sansa a repreendeu. - Sendo assim, vou sozinha.

Vai ser muito mais agradável. Lady e eu vamos comer

todos os bolos de limão e passar sem você o melhor dos

dias. - Virou-se para se afastar, mas Arya gritou às suas

costas:

- Também não vão te deixar levar a Lady - e foi embora,

antes de Sansa conseguir pensar numa resposta,

perseguindo Nymeria ao longo do rio.

Só e humilhada, Sansa iniciou a longa caminhada de volta

à estalagem, onde sabia que Septã Mordane estava à

espera. Lady caminhava em silêncio ao seu lado. Estava

quase chorando. Tudo o que desejava era que as coisas

fossem agradáveis e bonit as, como eram nas canções. Por

que Arya não podia ser doce, delicada e bondosa, como a

Princesa Myrcella? Ela gostaria de uma irmã assim.

Sansa nunca conseguira compreender como era possível

que duas irmãs, nascidas apenas com dois anos de

diferença, pudessem ser tão diferentes. Teria sido mais

fácil se Arya fosse bastarda, como o meio -irmão Jon. Ela

até era parecida com Jon, com o rosto longo e os cabelos

castanhos dos Stark, e nada de sua mãe no rosto ou nas

cores. E a mãe de Jon fora uma mulher plebeia, ou pelo

menos era isso que se segredava. Uma vez, quando era

pequena, Sansa até chegou a pergun tar à mãe se não teria

havido algum engano. Talvez os gramequins tivessem

roubado sua irmã verdadeira. Mas sua mãe limitara-se a rir,

dizendo que não, que Arya era sua filha e irmã legítima

de Sansa, sangue do sangue delas. Sansa não era capaz de

imaginar um motivo que levasse a mãe a querer mentir

sobre aquilo, e assim concluíra que tinha de ser verdade.

Ao se aproximar do centro do acampamento, sua aflição

foi rapidamente esquecida. Uma multidão tinha se reunido

em torno da casa rolante da rainha. Sansa ouviu vozes

excitadas que zumbiam como uma colmeia. Viu que as

portas tinham sido escancaradas e que a rainha estava no

topo dos degraus de madeira, sorrindo par a alguém.

Ouviu-a dizer:

- O conselho nos presta uma grande honra, meus bons

senhores.

- O que está acontecendo? - perguntou Sansa a um

escudeiro seu conhecido.

- O conselho enviou cavaleiros de Porto Real para nos

escoltar pelo resto do caminho - informou o homem. -

Uma guarda de honra para o rei.

Ansiosa por vê-los, Sansa deixou Lady abrir-lhe caminho