- Hoje chegaram dolorosas novas, meu senhor. Não quis incomodá-lo
até se ter purificado - não havia maneira de suavizar o golpe, e ela o
disse sem rodeios. - Lamento tanto, meu amor. Jon Arryn está morto.
Os olhos dele encontraram os dela, e Catelyn viu como lhe custou,
como sabia que custaria. Na juventude, Ned tinha sido acolhido no
Ninho da Águia, e Lorde Arryn, que não tinha filhos seus, tinha se
tornado um segundo pai para ele e para o seu outro protegido,
Robert Baratheon. Quando o Rei Aerys n Targaryen, o Louco, exigira
suas cabeças, o Senhor do Ninho da Águia erguera em revolta os
seus estandartes da lua e do falcão em vez de entregar aqueles que
jurara proteger.
E um dia, há quinze anos, seu segundo pai tinha se transformado
também num irmão, quando ele e Ned se juntaram no septo de
Correrrio para desposar duas irmãs, as filhas de Lorde Hoster Tully,
-Jon.. - Ned disse. - Esta notícia é segura?
- Trazia o selo do rei, e a carta vinha escrita na caligrafia do próprio
Robert. Guardei-a para você. Diz que Lorde Arryn partiu depressa.
Nem Meistre Pycelle pôde fazer alguma coisa, mas trouxe o leite da
papoula, para que Jon não ficasse por muito tempo em sofrimento.
- Isto foi uma pequena misericórdia, suponho - ele disse. Catelyn via
o pesar em seu rosto, mas mesmo nesse momento seu primeiro
pensamento era-lhe dedicado. - A sua irmã - disse Ned. - E o filho de
Jon. Que notícias há deles?
- A mensagem dizia apenas que estavam bem e que tinham
regressado ao Ninho da Águia - ela respondeu. - Eu preferia que
tivessem ido para Correrrio. O Ninho da Águia é um lugar alto e
solitário, e sempre foi o lugar de Jon, não deles. A memória de Lorde
Jon assombrará cada pedra. Conheço minha irmã. Ela precisa do
conforto da família e dos amigos ao seu redor.
- Seu tio espera no Vale, não é verdade? Ouvi dizer que Jon o
nomeou Cavaleiro do Portão. Catelyn anuiu com a cabeça.
- Brynden fará por ela e pelo rapaz o que puder. E algum conforto,
mas mesmo assim..
- Vá ter com ela - Ned tentou animá-la. - Leva as crianças. Encha
aqueles salões de ruído, gritos e risos. Aquele rapaz precisa de outras
crianças a sua volta, e Lysa não deve ficar só na sua dor.
- Gostaria de poder fazer isso - disse Catelyn. - A carta trazia outras
notícias. O rei viaja para Winterfell à sua procura.
Ned precisou de um momento para ver o sentido daquelas palavras,
mas, quando as compreendeu, a escuridão abandonou seus olhos.
- Robert vem para cá? - quando ela anuiu, um sorriso abriu-se no
seu rosto.
Catelyn desejou poder compartilhar da alegria do marido. Mas ouvira
o que se dizia pelos pátios; um lobo gigante morto na neve, com um
chifre partido na garganta. O terror retorcia-se no seu interior como
uma serpente, mas forçou-se a sorrir para aquele homem que amava,
aquele homem que não punha fé alguma nos sinais.
- Sabia que te agradaria - disse. - Deveríamos enviar uma mensagem
ao seu irmão, na Muralha.
- Sim, claro - ele concordou. - Ben vai querer estar aqui. Direi a
Meistre Luwin para enviar sua ave mais rápida - Ned ergueu-se e
ajudou a esposa a pôr-se em pé. - Demônios, quantos anos já se
passaram? E não nos dá mais notícias do que estas? A mensagem
dizia quantos homens traz na comitiva?
- Penso que um cento de cavaleiros, pelo menos, com todos os seus
servidores, e vez e meia este número de cavaleiros livres. Cersei e as
crianças viajam com eles.
- Robert virá em passo moderado por causa delas - disse Ned. -
Ainda bem. Teremos mais tempo para nos preparar.
- Os irmãos da rainha também vêm na comitiva - ela completou.
Ao ouvir aquilo, Ned fez um trejeito. Catelyn sabia que pouca
simpatia havia entre ele e a família da rainha. Os Lannister de
Rochedo Casterly tinham chegado tarde à causa de Robert, quando a
vitória era praticamente certa, e ele nunca os perdoara por isso.
- Bem, se o preço a pagar pela companhia de Robert é uma
infestação de Lannister, que seja. Parece que Robert traz metade da
corte.
- Aonde o rei vai, o reino segue - ela respondeu.
- Será bom ver as crianças. O mais novo ainda mamava da teta da
Lannister da última vez que o vi. Agora deve ter o quê? Cinco anos?
- O Príncipe Tommen tem sete anos. A mesma idade de Bran. Por
favor, Ned, tenha tento na língua. Lannister é nossa rainha, e diz-se
que seu orgulho cresce a cada ano que passa.
Ned apertou-lhe a mão.
- Terá de haver um festim, bem-composto, com cantores, e Robert
vai querer caçar. Enviarei Jory para o sul com uma guarda de honra
ao seu encontro, a fim de escoltá-los no caminho até aqui pela
estrada do rei. Deuses, como iremos alimentar a todos? Maldito seja
o homem. Maldito seja o seu real couro.
Daenerys
O irmão ergueu o vestido para que ela o inspecionasse.
- Isto é uma beleza! Toque-o. Vamos. Acaricie o tecido,
Dany o tocou. O tecido era tão macio que parecia correr-lhe pelos
dedos como água. Não conseguia se lembrar de alguma vez ter usado
algo tão suave. Assustou-se. Afastou a mão.
- É mesmo meu?
- Um presente de Magíster Illyrio - disse Viserys, sorrindo. Seu irmão
estava de bom humor naquela noite. - A cor realçará o violeta dos
seus olhos. E você também terá ouro e jóias de todos os tipos. Illyrio
prometeu, Esta noite deve se parecer uma princesa.
Uma princesa, pensou Dany. Já se esquecera de como aquilo era.
Talvez nunca tivesse realmente sabido.
- Por que ele nos dá tanto? - ela perguntou. - O que quer de nós? -
há quase meio ano que viviam na casa do magíster, comiam da sua
comida, eram paparicados pelos seus criados. Dany tinha treze anos,
idade suficiente para saber que tais presentes raramente vêm sem
preço ali, na cidade livre de Pentos.
- Illyrio não é nenhum tolo - Viserys respondeu. Era um jovem
magro com mãos nervosas e um ar febril nos olhos de um tom claro
de lilás. - O magíster sabe que não esquecerei os amigos quando
subir ao trono.
Dany não disse nada. Magíster Illyrio era um comerciante de
especiarias, pedras preciosas, ossos de dragão e outras coisas menos
palatáveis. Tinha amigos em todas as Nove Cidades Livres, dizia-se, e
mesmo para lá delas, em Vaes Dothrak e nas terras das fábulas junto
ao Mar de Jade. Também se dizia que nunca tinha tido um amigo
que não fosse capaz de vender alegremente pelo preço justo. Dany
escutava o falatório nas ruas e ouvia essas coisas, mas também sabia
que era melhor não questionar o irmão enquanto tecia suas teias de
sonho. Quando era despertada, a ira de Viserys era algo terrível. Ele
a chamava "o acordar do dragão".
O irmão pendurou o vestido ao lado da porta.
- Illyrio enviará as escravas para lhe darem banho. Assegure-se de se
livrar do fedor dos estábulos. Khal Drogo tem mil cavalos e hoje vem
à procura de um tipo diferente de montaria - estudou-a criticamente.
- Ainda tem as costas tortas. Endireite-se - pôs-lhe as mãos nos om-
bros e puxou-os para trás. - Deixe-os ver que tem agora a forma de
uma mulher - os dedos do irmão roçaram levemente seus seios em
botão e apertaram num mamilo. - Não me falhará esta noite. Senão,