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Falaram dos bons e dos maus tempos, e o garoto não via qualquer diferença entre uns e outros. Todos eram maus. A idéia de passar a vida dentro da escuridão da terra o apavorava, e ele sabia que tinha de fugir. Saiu de casa aos doze anos. Abandonou os vales do carvão e foi para a costa, para a baía de Sully Ranny e para Lavernock, para onde corriam os turistas ricos. Foi mensageiro, carregador, ajudava as senhoras a descerem os caminhos escarpados para a praia, carregando cestas de piquenique, dirigiu um carro de pôneis em Penarth e trabalhou no parque de diversões de Whitmore Bay.

Estava apenas a algumas horas de casa, mas a distância já era incomensurável. A gente do lugar onde ele estava parecia pertencer a outro mundo. Rhys Williams nunca imaginara que as pessoas pudessem ser tão belas ou usar roupas tão magníficas. Toda mulher lhe parecia uma rainha, e os homens eram elegantes e esplêndidos.

Era aquele o seu mundo, e não havia nada que Rhys não fosse capaz de fazer para entrar nele. Quando completou catorze anos, tinha economizado dinheiro suficiente para comprar uma passagem até Londres. Passou lá os três primeiros dias simplesmente andando pela grande cidade, olhando para tudo e avidamente embebendo-se dos fantásticos espetáculos, sons e cheiros. O seu primeiro emprego foi em uma loja de tecidos. Havia dois caixeiros, ambos seres superiores, e uma caixeira que fazia o coração do jovem galês cantar sempre que a olhava. Os caixeiros tratavam Rhys como ele devia ser tratado, isto é, como lixo. Era uma curiosidade. Vestia-se com roupas esquisitíssimas, tinha maneiras abomináveis e falava com um sotaque incompreensível. Não conseguiam sequer pronunciar-lhe o nome direito. A moça teve pena dele. Chamava-se Gladys Simpkins e morava em um pequeno apartamento em Tooting com três outras moças. Um dia, ela permitiu que o rapaz a levasse até a casa depois do trabalho e convidou-o para entrar e tomar uma xícara de chá. O jovem Rhys estava muito nervoso. Pensava que aquela ia ser a sua primeira experiência sexual, mas quando passou o braço pelo corpo de Gladys, esta olhou muito séria para ele por um momento e depois riu.

- Não vou lhe dar nada disso, mas estou disposta a dar-lhe um bom conselho. Se você quiser ser alguma coisa, compre roupas melhores, procure instruir-se mais um pouco e aprenda a ter boas maneiras. - Olhou o rosto jovem e apaixonado de Rhys, viu seus profundos olhos azuis e disse com voz suave: - Até que você vai ficar um bocado legal quando crescer… Se você quiser ser alguma coisa…

Neste momento o fictício Rhys Williams nasceu. O verdadeiro Rhys Williams era um rapaz ignorante e sem educação, sem meios, sem tradição, sem passado e sem futuro. Mas ele tinha imaginação, inteligência e ardente ambição. Isso era o bastante.

Começou a imaginar do que queria conseguir, do que queria ser. Quando se olhava ao espelho, não via o rapaz bronco e desajeitado, de sotaque estranho. A imagem refletia uma pessoa polida, delicada e bem-sucedida. Pouco a pouco, Rhys começou a responder à imagem que trazia no espírito. Freqüentava escolas noturnas e passava os fins de semana em galerias de arte. Rondava as bibliotecas públicas e ia ao teatro, sentava-se nas galerias e reparando nas boas roupas dos homens sentados nas platéias. Fazia refeições frugais para poder, uma vez por mês, ir a um bom restaurante, onde imitava cuidadosamente as maneiras dos outros à mesa. Observava, aprendia e não esquecia.

Era como uma esponja que apagava o passado e absorvia o futuro. Em menos de um ano, Rhys aprendeu o bastante para compreender que Gladys Simpkins, sua princesa, era uma mocinha cockney vulgar, que estava abaixo do seu gosto. Deixou a loja de tecidos e foi trabalhar em uma farmácia, que fazia parte de uma grande rede. Tinha quase dezesseis anos, mas parecia mais velho. Estava mais cheio de corpo e mais alto. As mulheres estavam começando a prestar atenção na sua boa aparência morena de galês e sua conversa fluente e cheia de palavras lisonjeiras. Fazia muito sucesso na farmácia, e havia freguesas que esperavam até que Rhys pudesse atendê-las. Vestia-se bem e falava com correção. Mas, embora soubesse que já estava bem longe de Gwent e Carmarthen, ainda não ficava satisfeito quando se olhava no espelho. Tinha ainda uma longa jornada pela frente. Depois de dois anos, Rhys passou a ser gerente da farmácia.

O gerente distrital da rede lhe havia dito: "Isto é apenas o começo, Williams.

Continue a trabalhar assim e um dia você será o superintendente de meia dúzia de casas". Rhys quase deu uma gargalhada.

Pensar que isso poderia ser considerado o máximo da ambição de uma pessoa!

Nunca havia deixado de estudar. Estava fazendo cursos de administração de empresas, marketing e direito comercial. Queria mais. Tinha os olhos voltados para o topo da escada e sabia que ainda não chegara nem aos primeiros degraus. Teve a sua primeira oportunidade de subir quando um vendedor de produtos farmacêuticos entrou um dia na farmácia e viu Rhys cercado de mulheres, às quais induziu vários artigos de que elas não tinham qualquer necessidade.

- Você está perdendo tempo aqui, rapaz - disse ele.

- Devia estar trabalhando em um campo maior.

- Em que está pensando? - perguntou Rhys.

- Vou falar com meu chefe a seu respeito.

Duas semanas depois, Rhys estava trabalhando como vendedor de uma pequena firma de medicamentos. Fazia parte de uma equipe de cinqüenta vendedores, mas quando se olhava no espelho, sabia que a verdade não era essa. A verdadeira competição que tinha de enfrentar era consigo mesmo. Já estava se aproximando de sua imagem, do tipo fictício que procurava criar. Um homem inteligente, culto, refinado e encantador. O que ele tentava fazer era impossível.

Qualquer pessoa sabia que era preciso trazer essas qualidades do berço. Não podiam ser criadas. Mas Rhys conseguiu o que queria. Tornou-se a imagem que havia elaborado. Viajou pelo interior, vendendo produtos da firma, falando e escutando. Voltava a Londres cheio de sugestões práticas e tratava imediatamente de ir subindo a escada.

Três anos depois de haver entrado na companhia, Rhys foi nomeado gerente-geral de vendas. Sob a sua hábil orientação, a companhia começou a expandir-se. Quatro anos depois, Sam Roffe entrou na vida de Rhys e percebeu a fome que o consumia.

- Você é como eu -disse Sam. - Nós queremos conquistar o mundo. E vou mostrarlhe como fazê-lo. Sam Roffe tinha sido um guia brilhante. Durante os nove anos em que vivera sob a direção de Sam Roffe, Rhys Williams se tornara de valor inestimável para a companhia. Com o correr do tempo, assumira responsabilidades cada vez maiores, reorganizando várias divisões, resolvendo problemas em qualquer ponto do mundo, coordenando as diversas filiais da Roffe and Sons e criando novos conceitos. No fim, Rhys Williams conhecia o funcionamento e a situação da companhia mais do que qualquer pessoa, à exceção do próprio Sam Roffe. Rhys Williams era o sucessor natural para a presidência.