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— Atenção! Atenção!

Atenção para Molly. Atenção para Maud. Atenção para sua mãe. Atenção para Babs.

Subitamente, outra recordação emergiu daquela bruma de incerteza e confusão. A alcova rosa-morango de Babs abrigava outro hóspede, e o corpo de sua dona estremecia em êxtase pelas carícias de alguém. Além do aperto no estômago, um aperto no coração, uma contração na garganta.

— Atenção!

A voz se aproximara, chamando de algum lugar à sua direita. Virando a cabeça, tentou levantar-se para ver melhor, porém o braço que suportava o seu peso começou a tremer e fraquejou. Will caiu sobre as folhas.

Cansado demais para continuar recordando, ficou deitado por longo tempo, olhando para cima, através das pálpebras semicerradas. Olhando para o incompreensível mundo à sua volta… Onde estaria e como teria vindo parar ali? Não que isso tivesse importância. No momento, nada tinha importância, exceto sua dor e esta fraqueza aniquilante. Sempre a mesma coisa, apenas um assunto de interesse científico…

Esta árvore, por exemplo, debaixo da qual (por razão desconhecida) se encontrava deitado, esta coluna de casca acinzentada, com sua abóbada bem alta, de ramos salpicados de sol, tinha o direito de ser uma faia. Mas, neste caso — e Will se admirou por estar tão lucidamente lógico —, neste caso, as folhas não tinham o direito de ser tão verdejantes…

E por que uma faia expulsaria dessa maneira suas raízes para a superfície do solo? E estes ridículos suportes de madeira onde a pseudofaia se apoiava, onde encaixá-los?

De repente, lembrou-se da pior estrofe de poesia: Quem dá forças ao meu cérebro nesses maus dias é o que perguntas?

Resposta: é o ectoplasma congelado de Early Dali, aquele que realmente governou Chilterns.

Por que eram tão grandes as borboletas que voavam na densa e amanteigada luz solar? Por que tão irrealmente azul-celestes? Por que preto-aveludadas ou pintalgadas e com olhos extravagantes? Púrpura sobressaindo do castanho, prata pulverizada sobre esmeralda, topázio e safira.

— Atenção!

— Quem está aí? — perguntou Will Farnaby, no que julgou ser uma voz alta e possante. Mas o que saiu de sua boca não foi mais que um coaxar fraco e trêmulo.

Pareceu haver um silêncio longo e ameaçador. Surgindo de um buraco entre os galhos de duas árvores, uma enorme centopéia negra fez uma rápida aparição e desapareceu às pressas com seu regimento de pernas vermelhas, dentro de outra fenda do ectoplasma coberto de líquen.

— Quem está aí? — coaxou novamente.

Ouviu estalidos nos arvoredos à sua esquerda e, como se fosse um cuco de relógio, um pássaro preto, do tamanho de uma gralha — mas que não era uma gralha — moveu-se no espaço e pousou num dos ramos mais baixos de um arbusto morto, que estava a pequena distância. Will reparou que seu bico era alaranjado e que havia uma parte amarela e nua sob cada olho. Os lados e a parte posterior de sua cabeça eram revestidos por uma espécie de plumagem amarelo-viva e por um retalho de pele espessa, semelhante a uma peruca.

O pássaro empertigou-se e olhou-o primeiramente com o olho direito, depois com o esquerdo. Dando por terminada a inspeção, abriu o bico alaranjado e cantou dez ou doze notas de uma pequena escala pentatônica. Numa linguagem como que entrecortada por soluços, cantava… dó, dó, sol, dó… e era como se dissesse: «Vamos, rapazes, está na hora!»

As palavras como que dispararam uma mola e, de repente, Will se lembrou de tudo.

Eis aqui Pala, a ilha proibida, o lugar nunca visitado por qualquer jornalista. O momento que estava vivendo devia representar a manhã seguinte àquela tarde em que tinha feito a tolice de ir velejar sozinho, fora da baía de Rendang-Lobo.

Lembrava-se de tudo — a vela branca, curvada pelo vento, parecia uma imensa magnólia; a água sibilava na proa; a crista de cada onda tinha o brilho de diamantes e cada uma das suas dobras tinha a cor do jade. Do outro lado do estreito, as nuvens eram verdadeiros prodígios de brancura esculpida, que encimavam os vulcões de Pala! Sentado, segurando a cana do leme, percebeu que estava cantando — descobriu, sem querer acreditar, porém sem qualquer possibilidade de erro, que se sentia feliz.

— Três, três para os rivais — tinha declamado para o vento. — Dois, dois para os rapazes brancos como lírios, todos vestidos de verde, oh! Um é um e nada mais que isso.

Sim, estava só, inteiramente só, nesta jóia que é o mar.

— Cada vez mais, assim será!

Depois disso, não é necessário acrescentar que as coisas sobre as quais todos os iatistas cautelosos e experientes o advertiram vieram a acontecer. A súbita e negra rajada de vento e chuva, o frenesi louco do vento, as ondas…

— Vamos, rapazes, é agora! — cantou o pássaro. — É agora, rapazes!

Era realmente espantoso que ele estivesse debaixo daquelas árvores. Podia estar no fundo do estreito de Pala, ou ter sido feito em pedaços pelos rochedos, refletiu Will. Vencera a arrebentação no barco que afundava. Conseguira por puro milagre atingir a única praia arenosa existente em todas aquelas milhas de rochedos que constituíam as costas de Pala. Mas sua epopéia não terminara. As rochas elevavam-se acima dele e, no ponto mais elevado da enseada, havia uma espécie de ravina escarpada, de onde descia um pequeno córrego numa sucessão de cascatas diáfanas. Havia árvores e arbustos crescendo entre calcário cinzento.

Cento e oitenta ou duzentos metros de subida pela rocha — calçando tênis e pisando em pontos de apoio molhados e escorregadios.

Então, Deus meu! surgiram aquelas cobras. A preta enganchando-se no galho em que se apoiava para subir. Cinco minutos mais tarde, foi a vez daquela verde, enorme, que se enrolara no ressalto em que pretendia pisar. A um terror seguia-se outro infinitamente pior. A vista da cobra o assustara, fazendo-o recolher violentamente o pé, e, com aquele súbito e impensado movimento, perdeu o equilíbrio. Por um longo segundo, oscilando à beira do abismo, fez a terrível descoberta de que seu fim havia chegado. Depois foi a queda… Foi então que ouviu o barulho de madeira lascada e viu-se agarrado aos galhos de uma pequena árvore.

Tinha o rosto arranhado, o joelho direito machucado e sangrando, mas, ainda assim, continuava vivo.

Dolorosamente, recomeçou a subida. O joelho doía terrivelmente, porém não se deteve. Não havia alternativa. A luz começara a faltar. Ao terminar a escalada, a escuridão era quase completa.

Em completo desespero, guiara-se pela fé.

— Vamos, rapazes, é agora! — gritava o pássaro.

Will Farnaby não podia atender àquela convocação. Estava na encosta da rocha, revivendo o horrível momento da queda.

As folhas secas farfalharam debaixo dele e seu corpo tremia de modo incontrolável, da cabeça aos pés.

CAPÍTULO II

De repente, o pássaro deixou de emitir sons articulados e começou a gritar. Will escutou uma voz infantil dizer «Mainá!» e continuar falando uma língua desconhecida. A um som de folhas secas pisadas se seguiu um grito de alarme. Depois, o silêncio. Abrindo os olhos, Will viu duas estranhas crianças que o olhavam com expressão de surpresa e de fascinado horror. A menor delas era um menino de cinco ou seis anos, vestindo apenas uma tanga verde. A seu lado, carregando uma cesta de frutas à cabeça, estava uma menina uns quatro ou cinco anos mais velha. Usava uma ampla saia vermelha que lhe chegava quase aos tornozelos, porém estava nua da cintura para cima. À luz do sol, sua pele brilhava como se fosse de cobre, com reflexos rosados. Will olhou-os e admirou a beleza de ambos. Era realmente uma beleza pura, aliada a uma extraordinária elegância. Pareciam dois puros-sangues. O menino era rechonchudo e forte, e seu rosto se assemelhava ao de um querubim. A menina tinha um tipo diferente — um puro-sangue esguio, e seu pequeno rosto era ligeiramente alongado e emoldurado por duas tranças de cabelos escuros.