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— Para que dar tanta importância a um treino tão complexo do cérebro e do corpo, na educação convencional? — perguntou Will. — Isso auxiliará as crianças a escrever gramaticalmente, a fazer cálculos ou a entender a física elementar?

— Ajuda bastante — disse Mr. Menon. — Um conjunto mente-corpo bem treinado aprende melhor e com muito maior rapidez do que outro que não foi treinado. Além disso, tem maior capacidade de relacionar os fatos às idéias e aos acontecimentos de sua própria vida.

Subitamente e para surpresa de todos (pois aquele rosto longo e melancólico dava a impressão de ser incompatível com qualquer expressão de alegria, além de um pálido sorriso), Mr. Menon soltou uma boa gargalhada.

— Qual é a graça? — perguntou Will.

— Estava me lembrando de duas pessoas que encontrei na última vez em que estive em Cambridge, na Inglaterra. Uma delas era um físico atômico e a outra um filósofo, ambos muito famosos. No entanto, a idade mental de um deles fora do laboratório era a de uma criança de onze anos. O outro era um comilão compulsório que se recusava a encarar um problema de excesso de peso. Esses dois personagens constituem um exemplo clássico do que acontece quando um menino inteligente recebe uma educação convencional e intensiva durante quinze anos, enquanto o conjunto mente-corpo, do qual dependem a vida e o saber, é completamente negligenciado.

— E seu sistema de ensino não produz essa espécie de «monstro acadêmico»?

O subsecretário balançou a cabeça.

— Até a minha ida à Europa, não tinha visto nada semelhante. São grotescamente divertidos — acrescentou. — E, pobres coitados, como são curiosamente repulsivos!

— Tornarmo-nos patética e curiosamente repulsivos, este é o preço que pagamos pela especialização.

— Pela especialização — concordou Mr. Menon —, mas não no sentido que é dado a esse termo no mundo em que você vive. Tal tipo de especialização, além de ser necessária, é também inevitável. Sem especialização não há civilização. Se você educar o todo mente-corpo, utilizando símbolos intelectuais, esse tipo de especialização é necessário e não causa um dano apreciável. Mas vocês não educam esse todo. Pretendem remediar o excesso de especialização científica ministrando alguns cursos suplementares de humanidades. Concordo em que tudo isso é excelente. Em todo processo educacional deviam ser incluídos os cursos de humanidades, contudo não devemos nos deixar iludir pelas aparências. Intrinsecamente, os cursos de humanidades não nos tornam mais humanos. Não passam de outra forma de especialização no nível simbólico. Lendo Platão ou ouvindo uma conferência de T. S. Eliot, nem todos conseguem se educar. Ocorre o mesmo num curso de Física ou de Química, onde, enquanto se ensina a manipulação dos símbolos, o resto do todo mente-corpo é deixado no seu estado de primitiva ignorância e de inépcia. Isso tudo vem gerar as criaturas patéticas e repulsivas que tanto me chocaram em minha primeira viagem ao exterior.

— Qual sua opinião a respeito da educação convencional? Que pensa da instrução básica do ensino, das matérias indispensáveis e das habilidades intelectuais? Seu método de ensino é o mesmo que o nosso?

— Nosso método apenas será utilizado por vocês daqui a uns dez ou quinze anos. Tomemos a Matemática como exemplo. Historicamente o seu início se deu com a elaboração de proveitosas mágicas que foram elevadas até o plano da metafísica e finalmente explicadas em termos de transformações lógicas e estruturais. Em nossas escolas, invertemos o processo histórico. Começamos com a estrutura e a lógica, excluímos a metafísica e passamos diretamente dos princípios gerais para a aplicação prática.

— E as crianças são capazes de compreender isso?

— Compreendem melhor do que se fossem iniciadas em trabalhos de utilidade imediata. A partir dos cinco anos de idade qualquer criança inteligente aprende praticamente tudo, desde que lhe seja apresentado sob a forma de jogos e de quebra-cabeças. Ao brincarem, compreendem o sentido das coisas com incrível rapidez. Isso feito, podemos passar às aplicações práticas. Com esse método de ensino a maioria das crianças pode aprender na metade do tempo um número de coisas três vezes maior e de um modo quatro vezes mais completo. Consideremos outro campo onde possam ser usados jogos para incutir a compreensão dos sistemas básicos. Todo pensamento científico é feito em termos de probabilidades. As velhas e eternas verdades não são mais que grandes verossimilhanças. As leis imutáveis da natureza apenas são valores estatísticos médios. Qual o modo de fazer com que as crianças aprendam as noções de coisas tão pouco evidentes? Ensinando-lhes a jogar roleta, girar moedas, fazer sorteios, jogar cartas, dados e jogos de tabuleiro.

— O jogo mais popular entre os menores é «cobras e escadas giratórias» — disse Mrs. Narayan. — Outro grande favorito é o das «felizes famílias de Mendel».

— Mais tarde aprendem um ainda mais complicado, jogado por quatro pessoas, com um baralho de sessenta cartas especialmente desenhadas e divididas em três naipes — acrescentou Mr. Menon. — É chamado «bridge psicológico». A sorte está nas mãos do jogador, mas o jogo requer habilidade e capacidade para o blefe.

— Psicologia, mendelismo, evolução… Seu sistema educacional parece ser profundamente biológico — disse Will.

— E o é, realmente — concordou Mr. Menon. — Insistimos principalmente nas ciências da vida e não na física ou química.

— Por questão de princípios?

— Não somente por isso, mas também devido às nossas conveniências e necessidades econômicas. Não dispomos dos grandes recursos financeiros indispensáveis à pesquisa em larga escala no campo da física ou da química. Além disso, não há nenhuma utilidade prática para nós no empreendimento dessas pesquisas. Não possuímos indústria pesada para motivar qualquer espécie de competição. Não temos armamentos e por isso não podemos nos ocupar em torná-los ainda mais diabólicos. Também não nos anima o menor desejo de aterrissar do outro lado da Lua. A nossa única e modesta ambição é de que, nesta ilha e nesta latitude deste planeta, possamos viver, como seres humanos «integrais», em perfeita harmonia com a vida que nos cerca. Quando quisermos ou quando nossos meios nos permitirem, aplicaremos os resultados de nossas experiências físicas e químicas em proveito próprio. Enquanto isso, concentraremos nossos esforços naquilo que nos promete maiores benefícios: na ciência da vida e da mente. Se os políticos dos países recém-independentes tivessem bom senso, também fariam o mesmo. Mas o poder é o que lhes interessa realmente. Querem exércitos, querem se emparelhar com os motorizados e viciados da televisão da América e da Europa. Vocês não têm outra escolha. Então irreparavelmente comprometidos com a física e a química aplicadas e com todas as suas funestas conseqüências militares, políticas e sociais. Mas os países subdesenvolvidos não estão comprometidos. Não têm que seguir esse exemplo, pois ainda dispõem de liberdade para escolher o nosso caminho: o caminho da biologia aplicada, da natalidade controlada, da produção limitada e da industrialização seletiva, que só é possível quando se controla a natalidade. É o caminho que leva à felicidade e que vem de dentro de nós, através da saúde, do conhecimento e da mudança de atitude em face do mundo. Não é aquela miragem da felicidade exterior e que é adquirida à custa dos brinquedos, das pílulas e das intermináveis distrações. Esses países poderiam escolher nosso caminho, porém não o fazem porque desejam ser exatamente iguais a vocês. Que Deus os ajude! Não há a menor possibilidade de que possam realizá-lo no curto espaço de tempo em que se propuseram, e por isso estão condenados à frustração e ao desapontamento. Seu destino será a miséria do colapso social, a anarquia e finalmente a desgraça de serem escravizados pelos tiranos. É uma tragédia perfeitamente previsível, mas continuam caminhando em direção a ela com os olhos bem abertos.