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Os olhos dos que se encontravam mais perto desviaram-se para a frase garatujada numa das páginas do bloco.

G O T O s a n t a c r o s s & S E A R C H O V E R S A T A N ' S T O M B

"Sim", assentiu o juiz Seth. "E então?"

"Quando na basílica de Santa Croce percebi que esta mensagem apontava para o túmulo de Maquiavel, interroguei-me sobre os motivos que levaram Filipe a referir-se duas vezes a Satanás e a escrever Satan's tomb e não Devilś tomb, como seria mais natural. No fim de contas, 469

Maquiavel era conhecido por Il Diavolo, que se traduz por Diabo, Devil em inglês. Por que raio teria Filipe escolhido a palavra inglesa Satan e não a palavra Devil, como seria mais natural? Percebi então que ele estava a fazer uma ligação subtil entre Satan e Seth. A verdadeira chave do criptograma, para além de indicar o caminho para o DVD

comprometedor, era nomear Seth como o seu perseguidor."

"Isso é tudo especulação!"

"O que explicava outro mistério", acrescentou o historiador, ignorando o seu inimigo. "Quando começou a ser perseguido, Filipe deveria ter procurado a ajuda da procuradora-geral Agnès Chalnot, no fim de contas a pessoa que o tinha contratado como investigador neste processo e sua natural protectora. Porque não o fez? O problema constituiu para mim um grande enigma, que só resolvi quando me apercebi de que o Satanás a que o criptograma se referia era na realidade o juiz Seth. Sabem, sempre estranhei a nomeação do presidente da Comissão Europeia para juiz deste caso. Cheirou-me a arranjinho.

uma vez que Axel Seth mexera cordelinhos para presidir a este processo do Tribunal Penal Internacional de crimes contra a humanidade no escândalo da crise mundial, evidentemente de modo a melhor controlar o que nele era revelado, Filipe temera que a procuradora-geral do mesmo processo estivesse em conluio com o juiz.

Filipe não tinha a certeza de nada, claro, mas não podia correr riscos.

Daí que tenha evitado pedir ajuda à professora Agnès Chalnot, como era natural que tivesse feito."

A procuradora-geral baixou a cabeça.

"Pauvre Filipe!", murmurou, consternada. "Imagino o que não deve ter passado..."

"O senhor tem muita imaginação, sim senhor", exclamou Axel Seth com sarcasmo. "Mas tudo isso não passa de conversa da treta, como bem sabe. Se não provar nada, e não provará, as suas palavras resumem-se a conjecturas doentias de uma mente delirante. Não terei 470

dificuldade em arranjar quem o interne por patologia psicótica ou por qualquer outra coisa do género."

"Está a ameaçar-me?"

"Não, estou simplesmente a fazer uma previsão do que lhe vai acontecer."

As palavras do juiz, e na verdade toda aquela situação, deixaram os dois procuradores do Tribunal Penal Internacional muito pouco à vontade. Agnès Chalnot abeirou-se de Tomás.

"Desculpe, professor Noronha, mas deverei depreender que, quando veio falar comigo, já sabia que o juiz Seth era o... enfim, o principal suspeito?"

"Desconfiava. Só obtive a certeza final quando percebi que o criptograma se referia ao túmulo de Maquiavel." "Se desconfiava, porque não me disse nada?"

"Ninguém lança suspeitas sobre o presidente da Comissão Europeia, para mais juiz do processo no qual estamos envolvidos, sem ter certezas, não acha?"

A procuradora-geral não desarmou.

"Mesmo assim, poderia ter-me dito alguma coisa..."

Tomás fitou-a com intensidade, como a indicar que, se ela mentisse na resposta à sua pergunta, tal não passaria despercebido.

"Se lhe tivesse dito que suspeitava que a pessoa por detrás de tudo isto era o presidente da Comissão Europeia e UIZ deste

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processo do TPI, teria aderido ao meu plano?"

A pergunta pareceu desarmar Agnès Chalnot.

"Zut, alors!", exclamou ela, sem saber como responder. "Tenho de admitir que... enfim, não seria uma decisão fácil. Ninguém se atira a uma pessoa como o juiz Seth de ânimo leve, não é verdade?" Hesitou.

"Mesmo que tivesse decidido avançar, reconheço que teria dificuldade em convencer o juiz Joossens a passar o mandado de captura.

Provavelmente ele não o passaria."

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A resposta pareceu satisfazer o historiador.

"Percebe agora porque optei pelo silêncio?", perguntou. Fez um gesto a indicar o presidente da Comissão Europeia. "Mesmo neste momento, e perante tudo o que se passou aqui, vocês hesitam em deter o juiz Seth. Se é assim em condições destas, imagine como seria se eu tivesse aberto o jogo todo..."

Axel Seth soltou Uma gargalhada sem humor.

"Eles hesitam porque sabem o que os espera se não conseguirem provar nada contra mim", sentenciou. "E a verdade, mon cher, é que vocês nada têm de concreto. Apenas umas especulações fantasiosas, nada que se sustente num processo judicial."

Tomás virou-se para o presidente da Comissão Europeia e lançou-lhe um olhar sibilino, carregado de subentendidos.

"O senhor está esquecido de uma coisa, não está?"

A pergunta deixou o juiz incomodado. Axel Seth mudou a perna em que se apoiava, incapaz de conter a ansiedade que até esse momento conseguira reprimir.

"Está a falar de quê?"

"Esqueceu-se que eu vim a Florença à procura de algo que o Filipe aqui escondeu?"

O presidente da Comissão Europeia não tinha esquecido. Tratava-se do ponto mais importante de todos, aquele que tudo provocara, e o assunto nem por um momento lhe saía da cabeça.

"O DVD", murmurou ele num tom neutro, esforçando-se por ocultar o tumulto que nesse instante lhe revoluteava no coração. "Onde está ele? Encontrou-o?"

Tomás meteu a mão no bolso da túnica e extraiu uni disco prateado, que exibiu provocatoriamente.

"Infelizmente para si", disse com um sorriso largo, o olhar insolente cravado no seu inimigo. "Está aqui."

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LXXI

O computador portátil que Marilú tinha trazido foi instalado no altar satânico, mesmo ao lado da cabeça de bode, e o DVD inserido no espaço próprio. O ecrã registou a presença do disco e fixou a primeira imagem, uma sala vista de cima com homens engravatados lá em baixo à volta de uma mesa cheia de papéis, e uma seta gráfica a indicar play.

"O que vamos agora ver é uma sequência de imagens captadas por dois técnicos franceses, Éric Garnier e Hervé Chopin, em várias salas da sede da Comissão Europeia em Bruxelas", esclareceu Tomás, dirigindo-se especificamente aos dois procuradores do Tribunal Penal Internacional.

"Como esta tarde expliquei na sessão preliminar do processo, estes técnicos foram contratados em segredo pelo anterior presidente da Comissão para detectar a fonte de fugas de informação. Foi-lhes dada autorização para interceptarem as comunicações internas e as comunicações para o exterior, incluindo e-mails e telefonemas. O que vamos ver são intercepções relevantes para o processo do TPI contra os responsáveis pela crise por crimes contra a humanidade."

Os olhos dos dois procuradores colaram-se à imagem paralisada no ecrã do portátil.

"Esta imagem", perguntou Agnès Chalnot, "diz respeito a essas intercepções?"