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"Aqui!"

Sentiu uma mão vinda do nada agarrá-lo e puxá-lo para um buraco que aparecera no lugar do segundo quadro à direita. O

quadro abriu-se como se fosse uma porta e deu por ele num espaço estreito e sombrio. Sem que tivesse tempo para estudar a abertura para onde fora arrastado, viu o quadro fechar a passagem e com ele levar a luz. Ficou às escuras num lugar estranho, com a impressão de ter sido transportado para uma qualquer quarta dimensão, um buraco perdido entre realidades alternativas.

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"Que é isto?", assustou-se ele, atarantado com a forma como fora puxado para ali e com a irrealidade que impregnava o local.

"Quem está aqui?"

"Chiu!", foi a resposta sussurrada da treva por uma voz feminina.

"Cala-te!"

Era Raquel.

"Raquel, és tu?"

"Cala-te, já te disse!"

Obedeceu e o silêncio impôs-se naquele espaço fechado dentro da parede. Ouviram passos ecoar no outro lado da parede e vozes a disparar em várias direcções. Suspendendo a respiração, perceberam ambos que se tratava dos perseguidores que tinham chegado à antecâmara dos quadros mitológicos e se mostravam desconcertados com a volatilização da sua presa. Ao fim de alguns instantes de aparente desorientação, os ruídos desvaneceram-se e, aliviados, os dois fugitivos recomeçaram a respirar.

"O que é isto?", soprou Tomás, mal se atrevendo a usar as cordas vocais. "Onde estamos nós?"

"Numa passagem secreta", respondeu ela. "Anda. Tem cuidado com os degraus..."

Uma corrente de ar soprou-lhe no rosto, indício seguro de que havia por ali uma qualquer ligação com o exterior, e sentiu a mão de Raquel agarrá-lo pelo braço e puxá-lo para a direita. Receando o que a escuridão ocultava, explorou o chão com o pé até o sentir a embater em algo; tratava-se do primeiro degrau para cima.

Tacteando as paredes e sondando o piso, ambos subiram quatro degraus e deram com uma porta invisível a travar-lhes a progressão.

"Uma passagem secreta, hem?", sorriu Tomás. "Onde raio descobriste isto?"

"Informei-me, ora essa!", retorquiu a espanhola com uma risadinha nervosa. "Parece que esta passagem oculta foi construída 424

na Idade Média por um dos Mediei para se esconder no palácio." Deu uma nova risadinha. "Excelente ideia, hem? Dá-nos cá um jeitão..."

"Pois dá", concordou ele. "Só faltavam uns archotes para iluminar o caminho."

Franquearam a porta e acederam a uma câmara apertada em formato cúbico; o chão desenhava um xadrez de mármores gastos, via-se branco de Carrara, vermelho de Siena e verde de Florença. O

compartimento secreto era iluminado por uma pequena janela rústica, sem vidros e enquadrada por uma grade de ferro medieval, com vista para os telhados da cidade e por onde brotava a luz solar.

A câmara oculta estava rodeada de portas altas de madeira, três em cada parede, doze ao todo. Abriu uma dessas portas e encontrou objectos de cobre e jarros de vidro alinhados em prateleiras.

"Uma câmara de alquimia."

Ao inspeccionar a terceira porta deparou-se com uma corda grossa, daquelas usadas no mar. Tomás pegou nela e testou a sua solidez. Satisfeito com a resposta da corda, aproximou-se da janela e, inclinando-se, espreitou lá para baixo; eram dois andares até à rua. Sem hesitar, atou a corda à grade de ferro que enquadrava a janela.

"Que estás a fazer?", questionou-o Raquel, alarmada com o que via.

"Eres loco?"

O português testou a solidez do nó com dois puxões fortes.

Constatando que a corda se encontrava bem atada, atirou-a para a rua e virou-se para a sua companheira.

"Vocês na Interpol fazem testes de destreza física, não fazem?", perguntou-lhe em tom de desafio. "Então estou certo de que serás capaz de descer por aqui."

Sem esperar que ela respondesse, empoleirou-se na janela e, agarrando a corda com firmeza, passou para o lado exterior e começou a deslizar pelas muralhas do Palazzo Vecchio. Olhou para cima e viu a 425

espanhola imitá-lo. A descida foi relativamente rápida, as mãos agarradas à corda e as pernas a calcorrearem a parede como se caminhasse para trás, até que sentiu o chão próximo e, largando a corda, saltou para a rua.

A sua companheira fez o mesmo alguns segundos mais tarde, juntando-se a ele na via della Ninna.

"Ufa!", suspirou Raquel com alívio, inebriada pelo ar fresco.

"Desta já nos safámos!"

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LXIV

A trattoria diante da estação de Santa Maria Novella estava a tornar-se o poiso de Tomás e Raquel. Chegaram a considerar a possibilidade de se instalarem num hotel ou numa pousada, mas a necessidade de mostrarem documentos dissuadiu-os; não tinham dúvidas de que os homens que os caçavam percorreriam todos os lugares da cidade onde se pudesse passar a noite.

Quando chegaram ao restaurante, vindos do Palazzo Vecchio, instalaram-se na mesinha que haviam ocupado nessa manhã e mandaram vir comida. Quando o empregado do bigode revirado se afastou com os pedidos, o historiador abriu o bloco de notas sobre a mesa e ambos estudaram o criptograma que teriam de quebrar antes de a sessão preliminar ser retomada na manhã seguinte.

G O T O s a t a n + & S E A R C H O V E R S A T A N ' S T O M B .

"Vai para satanás mais e procura sobre o túmulo de Satanás", leu Raquel literalmente. Levantou os olhos para o português. "Olha lá, não tinhas já decifrado esta algaraviada em Madrid? Na altura fiquei com essa impressão..."

"O que eu percebi no apartamento da tua amiga é que o Filipe tinha escondido o DVD aqui em Florença", esclareceu Tomás. "Foi a notícia dada na televisão sobre a sessão preliminar do Tribunal Penal Internacional, mais o facto de o Filipe me ter dito que viera de Itália, 427

que me puseram nesta pista." Indicou a charada. "Agora o criptograma vai dar-nos a localização exacta do esconderijo."

A agente da Interpol examinou mais uma vez a frase, desta feita com tanta intensidade que dava a impressão que acreditava que os olhos bastavam para arrancar o segredo escondido nas estranhas palavras.

"Isto não se percebe nada!", acabou por desabafar, frustrada.

"Que chinesice!"