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- Espero que Jaan esteja errado - disse certa vez, enquanto escovava o cabelo. - Eu prefiro encarar Lorimaar e seu teyn, em vez de Bretan.

Dirk murmurou alguma coisa concordando, pois Lorimaar, muito mais velho e ferido, seria bem menos perigoso do que o duelista de um olho que o caçava. Mas quando disse isso, Gwen apenas abaixou a escova e o encarou com curiosidade.

- Não - ela falou. - Não, não é por isso, em absoluto.

Mas o mais afetado pela espera era Jaantony Riv Lobo Alto-Jadeferro Vikary. Enquanto estivera em ação e a situação exigia dele, permanecera o velho Jaan Vikary - forte, decidido, um líder. No ócio, era um homem diferente. Não tinha função a cumprir; em vez disso, tinha tempo ilimitado para cismar. Isso não era bom. Embora Garse Janacek fosse mencionado raramente naqueles dias, era claro que Jaan era assombrado pelo espectro de seu teyn de barba ruiva, pois estava sempre sério, e começou a cair em silêncios obstinados que podiam durar por horas.

No princípio, Jaan havia insistido para que todos permanecessem do lado de dentro da torre o tempo todo; depois, ele mesmo começara a dar longas caminhadas ao amanhecer e ao pôr do sol, quando não estava de vigia. Durante suas horas na torre de vigilância, a maior parte de suas conversas era preenchida com divagações de sua infância na fortaleza do grupo Jadeferro e relatos históricos de heróis martirizados, como Vikor Alto-Açorrubro e Aryn Alto-Pedrardente. Nunca falava sobre o futuro, e apenas raramente sobre as circunstâncias presentes. Observando-o, Dirk quase podia entrever o tumulto interior do homem. Em questão de dias, Jaan Vikary perdera tudo: seu teyn, seu planeta natal e seu povo, até mesmo o código pelo qual vivera. Estava lutando contra tudo isso - já adotara Gwen como teyn, aceitando-a com uma dependência plena que nunca demonstrara antes em relação a ela ou mesmo a Garse. Parecia a Dirk que Jaan estava tentando manter seu código, agarrando-se desesperadamente a qualquer parte da honra kavalariana que lhe fora deixada. Era Gwen, não Jaan, quem falava de caçar os caçadores, de animais matando uns aos outros depois que todos os códigos haviam se perdido. Parecia falar por seu teyn e por si mesma, mas Dirk não achava que isso fosse compartilhado por Vikary, que quando falava das lutas iminentes, sempre deixava implícito que duelaria com Bretan Braith. Em suas longas caminhadas pela cidade levava tanto o rifle quanto a pistola.

- Se encontrar Bretan, preciso estar pronto - tinha dito e, como um autômato, praticava diariamente, em geral à vista da torre, preparando-se para cada um dos modos de duelo kavalariano. Um dia, praticava o quadrado da morte e o tiro de dez passos, acertando antagonistas imaginários. No dia seguinte era estilo livre e andar na linha, e então tiro único e quadrado da morte novamente. Os que estavam de guarda davam cobertura para ele, e rezavam para que nenhum inimigo visse os insistentes pulsos de luz. Dirk tinha medo. Jaan era a força do grupo, e estava perdido nessa ilusão marcial, na presunção de que Bretan Braith retornaria e lhe garantiria a cortesia do código, apesar de tudo. Mesmo com toda a destreza de Vikary em duelos, apesar de seu ritual diário de treino, parecia para Dirk cada vez mais improvável que o Jadeferro pudesse triunfar sobre Bretan no combate singular.

Até mesmo o sono de Dirk era atormentado por pesadelos recorrentes do rosto desforme do Braith: Bretan, com sua voz estranha, o olho brilhante e seu tique grotesco; Bretan delgado, de rosto suave e inocente; Bretan, o destruidor de cidades. Dirk despertava desses sonhos suado e exausto, enrascado nas roupas de cama, lembrando-se dos gritos de Gwen, lamentos ásperos e agudos como as torres de Kryne Lamiya, e do jeito que Bretan olhava para ele. Para banir essas visões, contava apenas com Jaan, e Jaan era vítima de um exausto fatalismo, ainda que conservasse uma certa força.

Era a morte de Janacek, Dirk disse para si mesmo - e, mais do que isso, as circunstâncias da morte. Se Garse tivesse morrido de maneira mais normal, Vikary seria um vingador mais feroz, mais implacável e mais invencível do que Myrik e Bretan combinados. Mas, pelo contrário, Jaan estava convencido de que seu teyn o traíra, que o caçara como a um animal ou um quase- -homem, e a convicção o estava destruindo. Mais do que uma vez, sentado com o Jadeferro na pequena sala de vigia, Dirk sentiu vontade de lhe dizer a verdade, de pular sobre ele e gritar: Não, não! Garse era inocente, Garse amava você, Garse teria morrido por você! Ainda assim, não disse nada. Se Vikary estava morrendo daquela maneira, consumido por sua melancolia, pelo sentimento de traição e pela perda definitiva da fé, dizer a verdade o teria matado imediatamente.

Então os dias passavam e as fissuras aumentavam, e Dirk observava seus três companheiros com apreensão crescente. Enquanto Ruark esperava a fuga; Gwen, a vingança; e Jaan Vikary, a morte.

Capítulo 15

No primeiro dia de vigília, choveu quase a tarde toda. As nuvens se apinharam à leste durante toda a manhã, ficando cada vez mais espessas e mais ameaçadoras, obscurecendo o Satã Gordo e seus filhos, de modo que o dia estava mais lúgubre do que o usual. Perto do meio-dia, a tempestade começou. O ruído era ensurdecedor. Os ventos sopravam do lado de fora tão alto que a torre de vigilância parecia sacudir, e rios de água marrom corriam selvagemente pelas ruas de pedrardente. Quando os sóis finalmente apareceram - um pouco antes do entardecer -, Larteyn brilhou, suas muralhas e construções resplandecendo úmidas pareciam mais limpas do que Dirk jamais vira. A Fortaleza de Fogo aparentava estar quase esperançosa. Mas esse foi o primeiro dia de vigília.

No segundo dia, as coisas voltaram ao normal. O Olho do Inferno percorreu o lento caminho vermelho pelo céu, Larteyn brilhou pálida e negra, e o vento trouxe de volta a poeira da Comuna que a chuva do dia anterior havia lavado. No crepúsculo da tarde, Dirk viu um aeromóvel. O veículo se materializou sobre as montanhas, um ponto negro, e sobrevoou a Comuna antes de começar a descer. Dirk observou cuidadosamente, pelos binóculos, os cotovelos repousando no parapeito de pedra da estreita janela. Não era nenhum carro que conhecesse - uma coisa morta e negra, um pequeno morcego estilizado com amplas asas e enormes faróis que faziam as vezes de olhos. Vikary partilhava a guarda com ele. Dirk o chamou, e Jaan olhou com desinteresse.

- Sim, conheço esse veículo - Jaan afirmou. - Não nos interessa, t'Larien, são apenas os caçadores do grupo Shanagate. Gwen informou tê-los visto partir esta manhã.

O aeromóvel desaparecera, então, perdido entre os edifícios de Larteyn, e Vikary voltou para seu assento, deixando Dirk com suas reflexões.

Nos dias que se seguiram, viu os Shanagates várias vezes, e nunca deixaram de parecer irreais. Era estranho pensar que iam e vinham, intocados por tudo o que acontecera, vivendo sua vida como se Larteyn ainda fosse a pacífica cidade moribunda que aparentava, como se ninguém tivesse perecido ali. Estavam tão perto de tudo aquilo e, ainda assim, tão distantes e não envolvidos; Dirk podia imaginá-los retornando ao seu grupo em Alto Kavalaan e contando quão monótona e aborrecida era a vida em Worlorn. Para eles, nada mudara; Kryne Lamiya ainda cantava seu fúnebre lamento, e Desafio era um local fervilhante de vida e promessas. Ele os invejava.

No terceiro dia, Dirk despertou de um pesadelo particularmente virulento, no qual estava lutando sozinho contra Bretan, e foi incapaz de voltar a dormir depois disso. Gwen, descansando da guarda, andava de um lado para o outro na cozinha. Dirk serviu-se de uma caneca da cerveja dela e escutou-a por um momento.