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Harrison Burke era uma bomba-relógio que poderia explodir a qualquer momento. Não havia nenhum parente próximo a quem se pudesse alertar. Judd deveria ligar para o presidente da companhia e comunicar-lhe a sua opinião? Se o fizesse, isso destruiria inteiramente o futuro de Burke. Ele teria que ser internado numa instituição para desequilibrados mentais. Mas será que ele estava certo em seu diagnóstico de que Burke era um paranóico potencial homicida? Ele gostaria de ter outra opinião médica a esse respeito, mas sabia que Burke jamais consentiria que outro médico o examinasse. Judd teria de tomar a decisão sozinho.

- Eu gostaria de que me prometesse uma coisa, Harrison.

- Prometer o quê? - indagou Burke, cauteloso.

- Se eles querem apanhá-lo, vão querer que você faça algo violento para poderem então

prendê-lo… Mas você é esperto demais para fazer o jogo deles. Não importa o quanto o provoquem, quero que me prometa que não fará nada contra eles. Dessa maneira, não poderão tocá-lo.

Os olhos de Burke se iluminaram. - Por Deus, você tem toda a razão! Então é esse o plano

deles! Mas somos espertos demais para eles, não é mesmo?

Judd ouviu a porta da sala de recepção se abrir e fechar. Olhou para o relógio. O paciente

seguinte já chegara. Ele desligou o gravador e disse calmamente:

- Acho que já chega por hoje.

- Gravou tudo o que conversamos? - indagou Burke, ansiosamente.

- Tudo. Não há a menor possibilidade de alguém atingi-lo agora.

Judd hesitou, mas terminou acrescentando:

- Não creio que deva ir ao escritório hoje. Por que não vai para casa e descansa um pouco?

- Não posso - murmurou Burke, a voz impregnada de desespero. - Se eu não aparecer no

escritório, vão tirar o meu nome da porta e pôr o de algum outro.

Ele se inclinou para Judd e disse baixinho:

- Tome cuidado. Se eles souberem que o senhor é meu amigo, vão tentar pegá-lo também.

Burke encaminhou-se até à porta que dava diretamente para o corredor. Entreabriu-a e

espiou para um lado e para outro. Depois saiu rapidamente.

Judd ficou imóvel por um momento, amargurado com o que teria de fazer com a vida de

Harrison Burke. se Burke o tivesse procurado seis meses antes… E então um pensamento súbito fez com que um calafrio lhe percorresse o corpo. E se Harrison Burke já fosse um assassino? Era possível ele estar envolvido nas mortes de John Hanson e Carol Roberts? Tanto Burke quanto Hanson eram pacientes. Poderiam facilmente ter-se encontrado. Por diversas vezes, nos últimos meses, as consultas de Burke haviam sido depois das de Hanson. E Burke chegara atrasado mais de uma vez. Talvez tivesse esbarrado com Hanson no corredor. O fato de ter visto Hanson várias vezes poderia perfeitamente ter acionado a sua paranóia, levando-o a pensar que o outro o estava seguindo, ameaçando-o. Quanto a Carol, Burke vira-a todas às vezes em que estivera no consultório. Será que sua mente doentia imaginara alguma ameaça da parte dela, que só poderia ser afastada com a morte?

Há quanto tempo Burke estava mentalmente afetado? A esposa e os três filhos haviam morrido num incêndio acidental. Acidental? Judd tinha que descobri-lo, de alguma forma.

Ele foi até a porta que dava para a sala de recepção e abriu-a.

- Entre, por favor.

Anne Blake levantou-se graciosamente e avançou com rapidez, com um sorriso afetuoso a

iluminar-lhe o rosto. Judd sentiu novamente a mesma emoção que o dominara quando a vira pela primeira vez. Não experimentara alguma reação emocional profunda por uma mulher desde a morte de Elizabeth.

Elas não eram absolutamente parecidas. Elizabeth era loura e miúda, de olhos azuis. Anne

Blake tinha cabelos pretos e olhos violeta deslumbrantes, emoldurados por pestanas compridas e negras. Era alta, com um corpo maravilhoso, cheio e com muitas curvas. Aparentava uma inteligência extraordinária. Sua beleza era clássica, aristocrata, o que faria com que parecesse inacessível se não fosse pelo brilho dos olhos. A voz era baixa e suave, ligeiramente rouca.

Anne tinha vinte e poucos anos. Era, indubitavelmente, a mulher mais bonita que Judd até

então vira. Mas fora algo além da sua beleza que impressionara Judd. Era uma força quase palpável que o atraía para ela, alguma reação inexplicável que o fazia sentir como se a conhecesse desde a infância. O sentimento que ele julgara há muito desaparecido havia novamente aflorado à superfície, surpreendendo-o por sua intensidade.

Ela aparecera no consultório de Judd três semanas antes, sem hora marcada. Carol

explicara-lhe que ele estava com todas as horas ocupadas e que não podia de maneira alguma aceitar novos pacientes. Mas Anne perguntara calmamente se poderia esperar. Ao fim de duas horas de espera, Carol se condoera e a introduzira no gabinete de Judd.

Ele sentira imediatamente uma reação emocional bem forte ao ver Anne, de tal forma que

não teve idéia do que ela disse nos primeiros minutos. Recordava-se de que a convidara a sentar-se e que ela disse seu nome, Anne Blake. Era dona-de-casa. Judd perguntara-lhe qual o seu problema.

Ela hesitara e depois dissera que não sabia. Nem mesmo sabia se tinha de fato um problema. Um médico amigo dela dissera que Judd era um dos melhores analistas do país. Mas quando Judd indagara qual fora o médico, Anne desconversara. Pelo que Judd sabia, ela podia ter descoberto o nome dele no catálogo telefônico.

Ele tentara explicar que todas as suas horas estavam ocupadas, que não podia aceitar mais

nenhum paciente. Oferecera-se para recomendar meia dúzia de outros bons analistas. Mas Anne insistia em que só queria se tratar com ele e mais nenhum. Ao final, Judd acabara acedendo.

Exteriormente, excetuando-se o fato de que parecia estar sob alguma tensão, Anne aparentara ser perfeitamente normal. Judd concluíra que o problema dela deveria ser relativamente fácil, podendo ser resolvido sem maiores complicações. Ele quebrou a regra que se impusera de jamais aceitar um paciente sem a indicação de outro médico e abrira mão da sua hora de almoço para tratar de Anne.

Nas últimas três semanas ela fora ao seu consultório duas vezes por semana. Judd sabia agora a respeito dela praticamente a mesma coisa que descobrira na primeira sessão. Mas sabia algo novo a respeito de si mesmo: estava apaixonado, pela primeira vez desde a morte de Elizabeth.

Na primeira sessão, Judd perguntara-lhe se amava o marido, odiando-se a si mesmo por

desejar que ela respondesse que não. Mas não fora o que ela respondera:

- Amo, sim. Ele é um ótimo homem, muito firme.

- Acha que ele representa a figura de seu pai?

Anne fixara nele aqueles incríveis olhos violeta.

- Não. Jamais procurei um homem que pudesse ser a imagem de meu pai. Tive uma infância

bem feliz.

- Onde nasceu?

- Em Revere, uma cidadezinha perto de Boston.

- Seu pai e sua mãe ainda são vivos?

- Papai está vivo. Mamãe morreu de derrame quando eu tinha doze anos.

- Seu pai e sua mãe tinham um bom relacionamento?

- Tinham. Eram profundamente apaixonados um pelo outro.

"É o que transparece em você", pensara Judd, alegremente. Vendo tanta aberração, miséria

e sofrimento todos os dias, a presença de Anne era como uma refrescante brisa de primavera.

- Algum irmão ou irmã?

- Não. Sou filha única. Fui uma garota mimada.

Ela sorrira, um sorriso franco e cordial, sem qualquer artifício ou afetação. Anne contara-lhe

que vivera no exterior com o pai, que era do Departamento de Estado. Quando ele casara novamente e fora viver na Califórnia, ela ficara em Nova York, indo trabalhar como intérprete na ONU. Falava fluentemente Francês, Italiano e Espanhol. Conhecera o futuro marido nas Bahamas, aonde fora em férias. Ele era dono de uma firma de construção. Anne não se sentira atraída, a princípio, mas ele se mostrara persistente e persuasivo. Dois meses depois de conhecê-lo, Anne casara-se com ele. Estava agora casada há quase seis meses. Moravam numa casa grande em Nova Jersey.