dela, ao vê-la deitada no divã do seu consultório, soluçando.
- Quer um copo de água, Teri?
- Não, obrigada. Eu… eu estou bem.
Ela tirou um lenço do bolso e assoou o nariz.
- Desculpe eu ter-me comportado como uma idiota - disse ela, sentando-se.
Judd continuou calado, esperando que ela recuperasse o controlo.
- Por que é que eu me caso com homens como Harry?
- É uma pergunta da maior importância. Tem alguma idéia da resposta?
- Mas como diabo eu posso saber! Você é que é o psiquiatra e tem que me dizer! Acha que
se eu soubesse antes como era, iria casar-me com homens como Harry?
- Qual é a sua opinião?
Teri ficou chocada.
- Está achando que eu me casaria, mesmo que soubesse? - Ela levantou-se, furiosa. - Seu filho
da puta nojento! Está pensando que eu gostei de trepar com todos os músicos?
- E gostou?
Num acesso de raiva. Teri pegou um vaso e arremessou-o contra Judd. O vaso foi-se espatifar
em cima da mesa.
- Isso responde à sua pergunta.
- Não. Esse vaso custou 200 dólares. Vou pôr na sua conta.
Teri fitou-o em silêncio por um minuto, desesperada. E finalmente sussurrou:
- Será que gostei?
- Você é quem pode dizer.
A voz dela ficou ainda mais baixa.
- Eu devo estar doente. Oh, Deus, como eu devo estar doente! Por favor, Judd, ajude-me!
Judd levantou-se e aproximou-se dela.
- Você é que tem de ajudar-se a si mesma, Teri.
Ela assentiu, com uma expressão aturdida.
- Quero que vá para casa e pense como se sente, Teri. Não enquanto está fazendo essas
coisas, mas antes de fazê-las. Pense nos motivos que a levam a ter vontade de fazê-las. Quando souber disso, saberá uma porção de coisas a respeito de si mesma.
Teri relaxou visivelmente. Tornou a tirar o lenço da bolsa e assuou o nariz.
- Você é um homem maravilhoso, Charlie Brown - disse ela, pegando as luvas e a bolsa. - Até
a próxima semana?
Judd abriu a porta do corredor e Teri saiu. Ele sabia a resposta ao problema de Teri, mas ela
teria que chegar lá por si mesma. Teria que aprender que não se pode comprar o amor, que se trata de uma coisa que tem de ser dada gratuitamente. E Teri não podia aceitar esse fato enquanto não começasse a acreditar que era digna de merecer o amor. Até que isso acontecesse, Teri continuaria a procurar comprar o amor, usando a moeda de que dispunha: seu corpo. Judd sabia a agonia que ela estava enfrentando, o desespero infinito do auto-desprezo. Sentiu pena dela. Mas a única maneira que tinha de ajudá-la era mostrar-se impessoal e indiferente. Judd sabia que, para os seus pacientes, aparentava sempre ser remoto e alheio aos problemas de cada um, dispensando a sua sabedoria de uma terapia. Na verdade Judd se preocupava intensamente com os problemas de seus pacientes. Eles ficariam surpresos se soubessem com quanta freqüência os demônios que investiam contra os
baluartes de suas emoções apareciam nos pesadelos de Judd.
Durante os seis primeiros meses de sua carreira com psiquiatra, enquanto se submetia aos
necessários dois anos de análise para se tornar psicanalista, Judd começara a ter dores de cabeça terríveis. Assumira empaticamente os problemas dos seus pacientes e levara quase um ano para aprender a canalizar e a controlar o seu envolvimento emocional.
E agora, depois de guardar a gravação da sessão com Teri Wasburn. Judd voltou a
concentrar-se em seu próprio dilema. Foi até o telefone e discou para as Informações, pedindo o telefone do 19º Distrito.
A telefonista transferiu a ligação para a Sala dos Detetives. Ele ouviu a voz grave de
McGreavy ao telefone.
- Tenente McGreavy falando.
- O Detetive Angeli, por gentileza.
- Espere um momento.
McGreavy largou o telefone em cima da mesa. Um momento depois a voz de Angeli soou ao
telefone:
- Detetive Angeli.
- Judd Stevens. Será que já tem aquela informação?
Houve um instante de hesitação.
- Já verifiquei - disse Angeli cuidadosamente.
- Tudo o que precisa dizer é sim ou não.
O coração de Judd estava disparado. Custou-lhe um grande esforço formular a pergunta
seguinte:
- Ziffren ainda está em Matteawan?
Pareceu decorrer uma eternidade antes que Angeli respondesse:
- Sim, ele ainda está lá.
Uma onda de desapontamento invadiu Judd.
- Entendo…
- Sinto muito.
- De qualquer forma, obrigado.
E, lentamente, Judd desligou.
Assim, só restava Harrison Burke, um paranóico irremediável, que julgava que todos
querendo matá-lo. Será que Burke decidira atacar primeiro? John Hanson deixara o consultório de Judd às 10:50 de segunda-feira sendo assassinado alguns minutos depois. Judd precisava descobrir se Harrison Burke estava em seu consultório nessa ocasião. Ele procurou o telefone de Burke e discou.
- International Steel
A voz possuía o timbre remoto e impessoal de um autômato.
- O Sr. Harrison Burke, por gentileza.
- Sr. Harrison Burke… Um momento, por favor
Judd estava contando que a secretária de Burke atendesse ao telefone. Se ela tivesse saído
por um momento da sala e o próprio Burke atendesse…
- Gabinete do Sr. Burke.
Era voz de mulher.
- Aqui é o Dr. Judd Stevens. Será que poderia fornecer-me algumas informações?
- Mas claro que sim, Dr. Stevens!
Havia um tom de alívio na voz dela, misturado com alguma apreensão. Ela devia saber que
Judd era o analista de Burke. Será que esperava que Judd a ajudasse? O que Burke teria feito com ela?
- É sobre a conta do Sr. Burke… - começou Judd.
- A conta?
Ela não fez o menor esforço para disfarçar o desapontamento. Judd continuou rapidamente:
- Minha recepcionista foi… não está mais comigo e estou procurando pôr tudo em ordem.
Verifiquei que ela cobrou uma consulta do Sr. Burke às nove e meia da manhã da última
segunda-feira e gostaria que visse na agenda dele se realmente veio ao meu consultório.
- Espere um momento, por favor.
A voz dela era visivelmente desaprovadora. Judd podia adivinhar o que ela estava sentindo.
O patrão estava desmoronando e o analista preocupava-se apenas com o dinheiro que lhe pagava. Ela voltou ao telefone alguns minutos depois.
- Infelizmente a sua recepcionista cometeu um engano, Dr. Stevens. O Sr. Burke não podia
ter ido ao seu consultório na manhã de segunda-feira.
- Tem certeza? - insistiu Judd. - Está anotado aqui. De nove e meia até…
- Não importa o que a sua recepcionista tenha anotado, Dr. Stevens.
Ela estava agora visivelmente irritada com a insensibilidade dele.
- O Sr. Burke passou toda manhã de segunda-feira numa reunião de diretoria, que começou
às oito horas.
- Ele não poderia ter saído sem ser visto durante uma hora?
- Não, Doutor. O Sr. Burke nunca sai do escritório durante o dia.
O tom de acusação na voz dela era evidente. Será que não entende que ele está doente? O
que está fazendo para ajudá-lo?
- Quer que eu chame o Sr. Burke, Doutor?
- Não é necessário. Obrigado.
Judd teve vontade de acrescentar alguma coisa que pudesse tranqüilizá-la, mas não havia nada
que ele pudesse dizer. Por isso, desligou rapidamente.
Judd não tinha mais para onde se virar. Se nem Zifren nem Harrison Burke tinham tentado
matá-lo… então não havia mais ninguém que tivesse um motivo para fazê-lo. Ele estava de volta ao ponto de partida. Alguma pessoa - ou pessoas - assassinaram a sua recepcionista e um dos seus pacientes. O seu atropelamento podia ter sido deliberado ou acidental. No momento em que ocorrera, parecera-lhe um ato deliberado. Mas, recordando agora o fato imparcialmente, Judd chegou a conclusão de que estava bastante perturbado pelos acontecimentos recentes. Poderia ter transformado um simples acidente em algo sinistro. A verdade pura e simples é que não havia ninguém que tivesse motivos para assassiná-lo. Ele possuía um excelente relacionamento com todos os seus pacientes, não tinha quaisquer problemas nas relações com os amigos. Ao que soubesse, nunca prejudicara ninguém.