- Cancele todas as consultas.
- Mas de que vai adiantar…
- Eu por acaso lhe digo como deve cuidar dos seus negócios? Quando sair daqui, quero que
vá direto a uma agência de viagens. Peça que lhe façam uma reserva…
Moody pensou por um momento antes de continuar:
- …No Grossinger's. É uma bela viagem de carro através das montanhas Catskills. O prédio
em que mora tem garagem?
- Tem.
- Pois então peça que preparem seu carro para a viagem. Não vá querer enguiçar no meio do
caminho!
- Não posso deixar para a próxima semana? Amanhã tenho um dia cheio…
- Depois que fizer a reserva, vá direto para seu consultório e ligue para todos os seus
pacientes. Diga-lhes que se trata de uma emergência e que estará de volta dentro de uma semana.
- Mas não posso realmente fazer isso. É fora de…
- É melhor telefonar para Angeli. Não quero que a polícia comece a procurá-lo depois de
partir.
- Mas por que tenho de viajar?
- Para proteger os seus cinqüenta dólares. O que me faz lembrar de uma coisa: vou precisar
de mais duzentos como sinal. Cobro cinqüenta dólares por dia mais as despesas.
Moody ergueu o corpo imenso da cadeira de balanço.
- Quero que saia bem cedo amanhã, para que chegue antes do anoitecer. Pode partir por volta
das sete horas da manhã?
- Creio que sim. O que irei encontrar quando chegar lá em cima?
- Com um pouco de sorte, talvez consiga marcar um ponto no jogo em que está metido.
Cinco minutos depois, Judd voltava a seu carro, pensativo. Dissera a Moody que não poderia
partir assim de repente, cancelando as consultas com tão pouca antecedência. Mas sabia que era exatamente isso o que iria fazer. Estava literalmente pondo a sua vida nas mãos daquele falstaff do mundo da investigação particular. Ao arrancar, ele olhou novamente para a placa que estava pendurada na janela:
"SATISFAÇÃO GARANTIDA".
"É bom que seja mesmo", pensou Judd, sombriamente.
Os planos para a viagem foram executados sem qualquer contratempo. Judd parou numa
agência de viagens de Madison Avenue. Reservaram-lhe um quarto no Grossinger's e forneceram-lhe um mapa rodoviário da região e diversos folhetos coloridos sobre as montanhas Catskills. Em seguida ele ligou para o serviço de recados telefônicos e pediu que telefonassem para todos os pacientes e cancelassem as consultas, até nova comunicação. Depois telefonou para o 19º Distrito e pediu para falar com o Detetive Angeli.
- Angeli está em casa, doente - disse uma voz impessoal. - Quer o número da casa dele?
- Quero.
Momentos depois, Judd estava falando com Angeli. Pela voz dele, devia estar com um
tremendo resfriado.
- Cheguei à conclusão que estou precisando sair da cidade por alguns dias - disse Judd. - Vou
partir amanhã de manhã. Mas antes queria informá-lo.
Houve um silêncio prolongado do outro lado, enquanto Angeli pensava no assunto.
- Até que não é má idéia, Doutor. Para onde pretende ir?
- Pensei em ficar no Grossinger's.
- Está certo. Não se preocupe. Resolverei tudo com McGreavy.
Angeli hesitou por um instante.
- Já soube o que aconteceu em seu consultório ontem à noite.
- Está querendo dizer que ouviu a versão de McGreavy, não é? - Conseguiu ver os dois
homens que tentaram matá-lo?
"Então pelo menos Angeli acreditava nele".
- Não.
- Não há o que possa dizer para ajudar-nos a encontrá-los? Cor, idade, altura?
- Lamento, mas não vi nada. Estava tudo escuro.
Angeli fungou.
- Está bem. Continuarei a procurar. Talvez eu já tenha alguma notícia quando voltar. Tome
cuidado, Doutor.
- Certo - disse Judd, agradecido, desligou logo.
Em seguida, ele telefonou para o presidente da companhia em que Burke trabalhava e
explicou-lhe rapidamente a situação. Não havia outra alternativa senão interná-lo o mais depressa possível. Judd ligou depois para Peter, explicou-lhe que tinha de sair da cidade por uma semana e pediu-lhe que tomasse as providências necessárias com relação a Burke. Peter concordou.
As cartas estavam na mesa.
O que mais perturbava Judd era que não podia ver Anne na próxima sexta-feira. Talvez nunca
mais tornasse a vê-la.
Judd pensou em Norman Z. Moody ao voltar para seu apartamento. Tinha a impressão que
sabia qual o plano de Moody. Fazendo com que Judd comunicasse a todos os seus pacientes que estava de partida, Moody queria certificar-se de que, se um deles fosse o assassino, e se é que existisse mesmo um assassino, ele iria ser atacado. Tratava-se de uma armadilha. E o próprio Judd era a isca.
Moody determinara que ele deixasse o endereço para onde estava indo com seu serviço de
recados telefônicos e com o porteiro do prédio em que morava. Era para que todos pudessem saber onde Judd se encontrava.
Quando Judd estacionou diante do seu prédio, Mike estava parado ali para cumprimentá-lo.
- Vou viajar amanhã de manhã, Mike. Poderia pedir que preparassem o carro e enchessem o
tanque?
- Pode deixar que eu cuido de tudo, Dr. Stevens. A que horas vai precisar do carro?
- Pretendo sair às sete horas da manhã.
Judd sentiu que Mike o observava enquanto entrava no prédio. Subiu para o seu apartamento
e trancou todas as portas, verificando cuidadosamente as janelas. Tudo parecia estar em ordem.
Tomou duas pílulas de codeína, despiu-se e entrou num banho quente, massageando
cuidadosamente o corpo dolorido, sentindo que as tensões iam-se esvaindo das costas e do pescoço.
Ficou por muito tempo estendido na banheira cheia de água quente, pensando. Por que Moody o alertara para providenciar a fim de que o carro não enguiçasse na estrada? Porque seria o local mais provável para atacarem-no, em algum ponto da estrada deserta nas Catskills? E o que Moody poderia fazer se Judd fosse então atacado? Moody recusara-se a lhe contar qual era o seu plano - se é que tinha algum plano. Quanto mais Judd pensava no caso, mais convencido ficava de que estava indo direto para uma armadilha. Moody dissera que estava armando para os perseguidores de Judd. Mas não importava quantas vezes Judd assim o dissesse a si mesmo, a resposta parecia ser sempre a mesma: a armadilha parecia preparada para apanhá-lo. Mas por quê? Que interesse Moody poderia ter em vê-lo morto? "Meu Deus", continuou pensando Judd, "escolhi um nome ao acaso nas páginas amarelas do Catálogo Telefônico de Manhattam e já estou começando a pensar que ele quer que eu seja assassinado! Sou de fato um paranóico"!
Ele sentiu que os olhos começavam a se fechar. As pílulas e o banho quente haviam atuado
eficientemente. Cansado, ele saiu da banheira, enxugou cuidadosamente o corpo dolorido com uma toalha felpuda e vestiu um pijama. Foi para a cama e fixou o relógio elétrico para despertar as seis da manhã. E caiu na cama num sono profundo de exaustão.
Judd acordou instantaneamente quando o despertador tocou, às seis horas da manhã. E, como
se não houvesse decorrido tempo algum, seu primeiro pensamento foi: "Não acredito numa série de coincidências e não creio que um dos meus pacientes seja um maníaco homicida. Portanto, ou sou um paranóico ou estou-me tornando um". O que ele precisava era de consultar outro psicanalista.
Telefonaria para o Dr. Robbie. Sabia que isso significaria o fim de sua carreira profissional, mas não havia outra alternativa. Se estava sofrendo de paranóia, teria que ser internado. Será que Moody desconfiava de que estava tratando com um desequilibrado mental? Será que fora por isso que sugeria que tirasse uma semana de férias? Não porque pensasse que alguém estava querendo matar Judd, mas porque estava vendo todos os sinais de um colapso nervoso? Talvez a melhor coisa a fazer fosse mesmo aceitar o conselho de Moody e passar alguns dias nas Catskills. Sozinho, sem nenhuma das pressões que o estavam atormentando, ele poderia avaliar a si mesmo com toda a calma, procurar descobrir quando a sua mente começara a enganá-lo, quando começara a perder o contato com a realidade. Quando voltasse, marcaria uma consulta com o Dr. Robbie e entregar-se-ia aos seus cuidados.