Judd fitou-o, sem entender.
- O Sr. Benson é a testemunha do acidente - explicou Moody, benevolente. - Descobri o
nome dele no relatório da polícia sobre o acidente e fui procurá-lo assim que o senhor saiu do meu escritório. O táxi custou-me três dólares e cinqüenta, Certo?
Judd assentiu, aturdido demais para conseguir falar.
- O Sr. Benson… Devo dizer que ele é peleiro. Tem coisas muito bonitas. Se quiser comprar
algo para a sua namorada, fale comigo que lhe arranjarei um desconto especial. Seja como for, na terça-feira, o dia do acidente, ele estava saindo de um prédio onde a sua cunhada trabalha. Tinha levado alguns remédios para o seu irmão Matthew, que é vendedor de Bíblias e estava muito gripado.
A cunhada ia levar os remédios para casa.
Judd controlou a impaciência. Se Norman Z. Moody sentisse vontade de recitar toda a
Declaração de Independência, ele escutaria sem reclamar.
- O Sr. Benson deixou os remédios com a cunhada e estava saindo do prédio quando a
limusine avançou em sua direção. É claro que ele não sabia na ocasião, que se tratava do senhor, Doutor.
Judd simplesmente assentiu.
- O carro andava um pouco de lado. Do ponto em que estava, Benson teve a impressão que
derrapava. Quando viu o carro atropelá-lo, saiu correndo em sua direção. A limusine recuou para atropelá-lo novamente. O motorista viu então o Sr. Benson e fugiu em disparada.
Judd engoliu em seco.
- Então quer dizer que se o Sr. Benson por acaso não estivesse por perto…
- Isso mesmo. Nós dois não nos teríamos conhecido. Os rapazes não estão brincando em
serviço. Estão mesmo a fim de liquidá-lo, Doutor.
- O que me diz do ataque ao meu consultório? Porque é que eles simplesmente não
derrubaram a porta?
Moody ficou em silêncio por um momento.
- Não dá para entender. Eles poderiam ter arrombado a porta e matado o senhor e quem quer
que estivesse em sua companhia, sem que ninguém os visse. Mas foram embora quando pensaram que o senhor não estava sozinho. Isso não combina com o resto da história.
Moody ficou novamente em silêncio, mordendo o lábio inferior.
- A menos…
- A menos o quê?
Uma expressão especulativa surgiu no rosto de Moody.
- Por enquanto vou guardar só para mim. Tive uma idéia, mas não faz sentido enquanto não
encontrarmos um motivo.
Judd sacudiu os ombros, desolado.
- Não sei de ninguém que tenha motivo para matar-me.
Moody pensou no assunto por um momento.
- Será que não partilhou nenhum segredo com o tal de Hanson e com Carol Roberts, Doutor?
Algo que somente os três soubessem?
Judd sacudiu a cabeça.
- Os únicos segredos que tenho são segredos profissionais, a respeito dos meus pacientes. E
não há absolutamente nada nos casos deles que possa justificar um homicídio. Nenhum de meus pacientes é agente secreto, espião estrangeiro ou foragido da justiça. São pessoas comuns, donas-de-casa, profissionais liberais, altos funcionários de grandes organizações, pessoas com problemas que não conseguem enfrentar sozinhas.
Moody fitou-o com uma expressão inocente.
- Tem certeza de que não há nenhum maníaco homicida entre os seus pacientes, Doutor?
A voz de Judd era firme:
- Certeza absoluta. Ontem talvez eu não tivesse muita certeza. Para dizer a verdade, estava
começando a pensar que eu próprio sofria de paranóia e que o senhor procurava confirmar essa teoria naquele nosso primeiro encontro.
Moody sorriu.
- A idéia me passou pela cabeça. Depois que me telefonou marcando o encontro, andei
fazendo umas averiguações. Telefonei para dois médicos, amigos meus. O senhor tem uma reputação e tanto, Doutor.
Então o "Sr. Stevenson" fazia parte da fachada de caipira que Moody assumia.
- Se formos procurar a polícia agora com o que já sabemos - disse Judd -, poderemos, pelo
menos, conseguir com que eles se ponham à procura de quem está por trás disso tudo.
Moody fitou-o com uma expressão um tanto surpresa.
- Acha mesmo? Mas não temos muita coisa para falar, não é mesmo, Doutor?
Era verdade.
- Não quero que fique desanimado. Acho que estamos realmente progredindo. Já
conseguimos diminuir consideravelmente o nosso campo de busca.
Quando Judd falou, havia um tom de frustração em sua voz:
- Claro. Já sabemos agora que pode ser qualquer pessoa dos Estados Unidos.
Moody ficou imóvel por um momento, contemplando o teto. Finalmente sacudiu a cabeça
e murmurou:
- Famílias…
- Famílias? - Acredito quando me diz que conhece os seus pacientes por dentro e por fora,
Doutor. Se me diz que eles não poderiam cometer os crimes, eu tenho que acreditar. Afinal de contas, é a sua colméia, e é quem cuida das abelhas.
Ele recostou-se no sofá e acrescentou:
- Mas diga-me uma coisa: costuma entrevistar as famílias dos seus pacientes?
- Não. Às vezes a família nem mesmo sabe que o paciente está sendo submetido à psicanálise.
Moody exibiu uma expressão de satisfação.
- Aí está!
- Está pensando que um parente de algum dos meus pacientes esteja tentando me matar?
- É possível.
- Nenhum teria mais motivos que qualquer um dos meus pacientes. Provavelmente até menos.
Moody levantou-se com bastante dificuldade.
- Nunca se sabe, não é mesmo, Doutor? Vou dizer o que gostaria que fizesse: arrume-me uma
lista de todos os pacientes que teve nas últimas quatro ou cinco semanas. É impossível?
Judd hesitou.
- Não - disse ele finalmente.
- Está pensando nessa história do relacionamento confidencial entre médico e paciente? Creio
que está na hora de contornar um pouco essa regra. A sua vida está em jogo.
- Acho que está na pista errada. O que tem acontecido não possui a menor relação com meus
pacientes ou suas famílias. Se houvesse algum caso de insanidade nas famílias dos meus pacientes, eu já teria descoberto na psicanálise.
Judd sacudiu a cabeça e acrescentou:
- Lamento, Sr. Moody, mas tenho que proteger os meus pacientes.
- Disse que não havia em seu arquivo nada de importante.
- Nada que seja importante para nós.
Judd pensou em algumas das revelações que constavam em seus arquivos. John Hanson
apanhando marinheiros nos bares de invertidos da Terceira Avenida. Teri Washburn fazendo amor com todos os músicos do conjunto que fora tocar em seu apartamento. Evelyn Warshak, prostituta de catorze anos…
- Lamento - disse ele novamente - mas não posso mostrar-lhe os meus arquivos…
Moody sacudiu os ombros.
- Está certo. Mas sendo assim, terá de fazer uma parte do trabalho para mim.
- O que deseja que eu faça?
- Pegue as gravações de todas as pessoas que se deitaram em seu divã no último mês. Ouça
atentamente cada uma. Só que desta vez não deve escutar como médico e sim como detetive. Procure alguma coisa que lhe pareça estranha e inexplicável.
- É o que sempre faço. Meu trabalho é justamente esse.
- Pois faça-o novamente. E fique bastante atento. Não quero perdê-lo até que este caso esteja
resolvido.
Pegou o sobretudo, lutando para entrar dentro dele. Parecia executar os passos de um balé
de elefante. Diz-se que os homens gordos têm movimentos graciosos, pensou Judd. Mas o Sr. Moody não se incluía nessa categoria.
- Sabe o que eu acho mais estranho em toda essa história, Doutor?
- O que é?
- É o fato de dois homens terem tentado arrombar o seu consultório. Talvez um homem
pudesse ter essa ânsia incontrolável de matá-lo… mas porquê dois?
- Não sei.
Moody ficou pensativo por um longo tempo. Exclamou de repente: