- E isso é muito importante?
- Como assim? Quantos caras acha que podem investir tanto dinheiro assim? Tem que
começar a tocar a sua buzina, Peter Pan. Estou na maior satisfação de poder investir um dinheiro desses.
- Está falando o tempo todo em investir. O que quer dizer é doar, não é?
- Dá tudo no mesmo. A gente emprega um milhão de dólares e logo estão todos nos beijando
os pés. Eu já lhe disse que hoje é meu aniversário de casamento?
- Não. Parabéns!
- Obrigado. Quinze anos espetaculares. Acho que nunca conheceu Sally. É a rapariga mais
maravilhosa que já caminhou por esta terra de Deus. Sabe como os parentes da mulher podem ser um incômodo, não é? Pois Sally tem dois irmãos, Ben e Charley. Eu já lhe falei a respeito deles. Ben é o principal redator do meu programa de televisão e Charley é meu produtor. Eles são uns gênios!
Já tem sete anos que estou no ar. E em nenhum momento deixamos de estar entre os dez programas de maior audiência. Fui muito esperto em casar-me e entrar numa família como essa, não acha? A maioria das mulheres fica gorda e desleixada depois que agarra o marido. Mas Sally, graças a Deus, está mais esbelta agora do que no dia em que nos casamos. Que mulher! Tem um cigarro aí, Doutor?
- Tome. Pensei que tivesse parado de fumar.
- Eu apenas quis demonstrar para mim mesmo que ainda tinha a velha força de vontade, e por
isso parei. Mas agora voltei a fumar porque quero… Fiz ontem um novo contrato com a televisão. E realmente passei-os para trás. Minha hora já acabou?
- Ainda não. Por que está tão inquieto, Skeet?
- Para lhe dizer a verdade, queridinho, estou em tão boa forma que nem mesmo sei por que
continuo a vir aqui!
- Não tem problemas?
- Eu? O mundo é minha ostra e eu sou "Diamond Jim Brady". Tenho que agradecer-lhe,
Doutor. Ajudou-me de verdade. É o meu homem. Tenho a impressão de que o senhor ganha tanto dinheiro que até me dá vontade de estabelecer-me por conta própria no seu ramo. O que acha da idéia? Isso me lembra a história de um cara que vai consultar um "espreme-crânios", mas está tão nervoso que apenas se deita no divã e não diz coisa alguma. Ao final de uma hora, o médico diz que são cinqüenta dólares. A mesma cena se repete durante dois anos inteirinhos, sem que o cara fale coisa alguma. Mas, finalmente, o cara resolve abrir a boca: "Doutor, posso fazer-lhe uma pergunta?"
Diz o médico: "Mas é claro!" E o camaradinha diz: "Não gostaria de ter um sócio?"
Risadas.
- Tem uma aspirina ou algo assim?
- Claro! Está com outra das suas dores de cabeça?
- Não é nada que eu não possa controlar, companheiro… Obrigado. Isso vai resolver.
- O que acha que provoca essas suas dores de cabeça?
- Apenas a tensão normal do show-business… Esta tarde vamos fazer a leitura do script do
próximo programa.
- E isso o deixa nervoso?
- A mim? Mas claro que não! Por que eu deveria ficar nervoso? Se as minhas piadas são
horríveis, eu faço uma carranca e pisco para o público e eles engolem direitinho. Não importa o quão nojento seja um programa, o velho Skeet sempre sai cheirando como uma rosa!
- Por que acha que tem essas dores de cabeça todas as semanas?
- Como diabo eu vou saber? O senhor que é médico é que deve dizer-me. Eu não lhe pago
para passar uma hora sentado em cima desse traseiro gordo a me fazer perguntas estúpidas. Meu Deus, se um idiota como você não pode curar uma simples dor de cabeça, então eles não deveriam deixá-lo à solta confundindo a vida das pessoas. Onde é que conseguiu o seu diploma de médico?
Numa escola de veterinária? Eu não lhe confiaria os meus gatos! Não passa de um miserável
charlatão! A única razão que me fez procurá-lo foi a insistência de Sally. Só assim consegui me livrar dela. Conhece a minha definição de Inferno? É estar casado com uma mulher feia e esquelética durante quinze anos. Se está procurando mais alguns otários para explorar, fale com os dois irmãos de Sally, Ben e Charley. Ben é o principal redator do meu programa, mas não sabe qual é a ponta do lápis com que se pode escrever. E Charley é ainda mais estúpido. Eu gostaria de que todos caíssem mortos. Só estão a fim de me explorar. E pensa que eu gosto de você? Muito pelo contrário.
Não passa de um nojento! É um presunçoso, sentado aí a olhar tudo de cima. Não tenho nenhum problema, não é? E sabe porquê? Porque não existe de verdade. Tudo o que é passar o dia arriado nesse traseiro gordo a roubar o dinheiro das pessoas doentes. Pois bem, seu filho da puta, eu vou destruí-lo. Vou denunciá-lo à Associação Médica Americana…
Silêncio.
- Eu gostaria de não ter que ir à maldita leitura…
Silêncio.
- Continue firme aqui, queridinho. Até a próxima semana.
Judd desligou o gravador. Skeet Gibson, atualmente o mais famoso comediante da América,
devia ter sido internado dez anos atrás. Suas diversões eram espancar coristas jovens e louras e provocar brigas de bar. Skeet era um homem pequeno, mas começara a vida como lutador de boxe e sabia como machucar os outros. Um dos seus desportos preferidos era entrar num bar de efeminados, atrair um homossexual inocente para o banheiro e ali espancá-lo impiedosamente. Skeet fora agarrado pela polícia por diversas vezes, mas os incidentes tinham sido sempre abafados. Afinal de contas ele era o maior comediante da América. Skeet era paranóico o bastante para querer matar, e era bem capaz de matar num acesso de raiva. Mas Judd não achava que ele fosse capaz de executar um plano de vingança a sangue-frio. E Judd tinha certeza de que essa era a chave para a solução do problema. Quem quer que estava querendo matá-lo, não agia no auge de alguma emoção, mas metodicamente e com sangue-frio. Era um louco. Que não se comportava como tal.
Capítulo 11
O telefone tocou. Era o serviço de recados. Eles haviam conseguido falar com todos os seus
pacientes, à exceção de Anne Blake. Judd agradeceu à telefonista e desligou.
"Então Anne viria naquele dia"! Judd ficou perturbado ao perceber como se sentia
irracionalmente feliz pela perspectiva de vê-la novamente. Mas tinha que lembrar-se de que ela só estava vindo porque ele lhe pedira, como médico. O quanto ele sabia a respeito dela… e quão pouco!
Ele pôs uma das fitas das sessões de Anne no gravador e ficou escutando. Era uma das
primeiras visitas dela.
- Está à vontade, Srª Blake?
- Estou sim, obrigada.
- Relaxada?
- Sim.
- Está com os punhos cerrados.
- Talvez eu esteja um pouco tensa.
Um longo silêncio.
- Fale-me a respeito da sua vida em casa. Está casada há seis meses, não é?
- É, sim.
- Continue.
- Sou casada com um homem maravilhoso. Moramos numa linda casa.
- Como é a casa?
- No estilo rural francês… É uma propriedade antiga, adorável! Há um caminho longo e
sinuoso que leva até a casa. No alto do telhado fica um galo de bronze muito velho e engraçado, sem cauda. Creio que algum caçador arrancou-a com um tiro há muito tempo atrás. A propriedade possui cinco acres, a maior parte coberta de bosques. Costumo dar longos passeios. É como murar no campo.
- Gosta do campo?
- Muito.
- Seu marido também gosta?
- Creio que sim.
- Um homem não costuma comprar uma propriedade de cinco acres a menos que goste.
- Ele me ama. De qualquer maneira, teria comprado a casa para mim. É um homem muito
generoso.
- Vamos falar a respeito dele.
Silêncio.
- Ele é bem-apessoado?
- Anthony é bem bonito!
Judd sentiu uma ponta de ciúmes, irracional e nada profissional.
- São compatíveis fisicamente?