Ela procurou não demonstrar desapontamento.
- Não há problema. Direi a Peter.
- Obrigado.
Judd recordou-se subitamente do motivo pelo qual telefonara. - Norah, você sabe quem é Teri
Washburn?
- A Teri Washburn? A estrela? Por que está perguntando?
- Eu… eu a vi em Madison Avenue esta manhã.
- Em pessoa? Está falando sério?
Norah parecia uma criança ansiosa.
- Como ela parece? Velha? Jovem? Gorda? Magra?
- Está muito bem. Ela foi uma grande estrela, não foi?
- Se foi? Ela foi a maior de todas… e em todos os sentidos, se entende o que estou querendo
dizer.
- Por que será que ela deixou Hollywood?
- Não foi exatamente assim. Ela não deixou Hollywood.
Então Teri lhe contara a verdade. Judd sentiu-se um pouco melhor.
- Vocês, médicos, vivem com a cabeça enterrada na areia. Teri Washburn esteve envolvida
num dos maiores escândalos da história de Hollywood.
- É mesmo? O que houve?
- Ela assassinou o amante.
Capítulo 12
Começara outra vez a nevar. Os ruídos do tráfego vinham flutuando da rua, quinze andares
abaixo, abafados pelos flocos brancos que dançavam no vento gelado. Numa sala acesa, do outro lado da rua, Judd pôde ver o rosto vago de uma secretária.
- Tem certeza, Norah?
- Quando se trata de Hollywood, querido, você está falando com uma enciclopédia
ambulante. Teri estava vivendo com o chefão dos Continental Studios, mas dormia também com um assistente do diretor. Uma noite ela o surpreendeu enganando-a e apunhalou-o. O chefão do estúdio usou de toda a sua influência, subornando muita gente para abafar o caso. A morte foi classificada de acidental. Cumprindo sua parte no acordo, Teri deixou Hollywood e nunca mais voltou lá.
Judd ficou olhando para o telefone, aturdido.
- Você ainda está-me ouvindo, Judd?
- Estou.
- O que houve? Você parece preocupado…
- Onde foi que ouviu tudo isso?
- Onde foi que ouvi? Mas saiu em todos os jornais e nas revistas de cinema! Todo mundo
soube da História.
Menos Judd.
- Obrigado, Norah. Dê lembranças minhas a Peter.
Ele desligou. Então fora aquele o "pequeno incidente"! Teri Washburn assassinara um homem
e nunca lhe dissera coisa alguma a esse respeito. E se ela já cometera um assassinato…
Pensativo, Judd pegou num bloco e escreveu: "Teri Washburn". O telefone tocou. Ele
atendeu.
- Dr. Stevens falando.
- Estou telefonando apenas para verificar se está bem.
Era o Detetive Angeli. Sua voz ainda estava rouca do resfriado. Um sentimento de gratidão
dominou Judd. Alguém estava do seu lado.
- Alguma novidade?
Judd hesitou. Não via nenhuma vantagem em guardar segredo a respeito da bomba.
- Eles tentaram novamente.
Judd contou a Angeli a respeito de Moody e da bomba que haviam colocado em seu carro.
- Creio que agora McGravy deve ficar convencido.
- E onde está a bomba? - indagou Angeli, excitado.
- Foi desmontada.
- Foi o quê? - indagou Angeli, incrédulo. - E quem a desmontou?
- Moody. Ele achou que não tinha nenhuma importância.
- Não tinha importância? Para que diabo ele pensa que serve o Departamento de Polícia?
Poderíamos dizer quem colocara a bomba só de olharmos para ela! Temos um arquivo completo no M. O.
- M. O.?
- Modus Operandi. As pessoas criam hábitos. É provável que continuem a fazer uma coisa
da mesma maneira com a fizeram pela primeira vez. Mas creio que não preciso dizer isso.
- Não - disse Judd, pensativo.
É claro que Moody devia saber disso. Será que ele tinha alguma razão para não querer
mostrar a bomba a McGravy?
- Como foi que contratou Moody, Dr. Stevens?
- Encontrei o nome dele nas páginas amarelas.
Soava ridículo, Judd pôde ouvir Angeli engolir em seco.
- Então quer dizer que não sabe absolutamente nada a respeito dele.
- Só sei que confio nele. Por que…
- Neste momento, Doutor, acho que não deveria confiar em ninguém.
- Mas Moody não poderia de jeito nenhum estar ligado às pessoas que querem matar-me.
Afinal de contas, escolhi o nome dele ao acaso, nas páginas amarelas.
- Não me importa como o descobriu. Algo está-me parecendo suspeito nessa história. Moody
diz que preparou uma armadilha para apanhar quem quer que estivesse tentando liquidá-lo. Mas só puxou a armadilha depois que tinham mordido a isca, de forma que ninguém foi apanhado. E depois ele lhe mostrou uma bomba em seu carro, que poderia ter sido colocada por ele mesmo. E assim ganha a sua confiança. Não é isso, Doutor?
- Creio que se podem ver as coisas por esse ângulo. Mas…
- Talvez o seu amigo Moody esteja sendo sincero, mas talvez ele possa estar metido com os
assassinos. De qualquer maneira, gostaria que continuasse a tratá-lo como se de nada desconfiasse, até que possamos descobrir tudo.
Moody contra ele? Era difícil de acreditar. Mas Judd recordou-se das suas dúvidas iniciais,
quando pensara que Moody o estivesse enviando para uma emboscada.
- O que acha que devo fazer? - indagou Judd.
- Que tal o senhor saísse da cidade? Mas sair mesmo!
- Não posso deixar meus pacientes.
- Dr. Stevens…
- Além do mais, isso não resolveria coisa alguma, não é mesmo? Eu nem saberia do que
estaria fugindo. E, quando voltasse, tudo recomeçaria.
Houve um momento de silêncio do outro lado.
- Talvez tenha razão.
Angeli deixou escapar um suspiro, seguido por um prolongado acesso de tosse.
- Quando espera receber mais notícias de Moody?
- Não sei. Ele pensa que tem uma idéia de quem está por trás de tudo.
- Já lhe ocorreu que a pessoa que está por trás desses acontecimentos pode pagar Moody
muito mais do que o senhor? Se Moody lhe pedir para ir encontrá-lo, telefone-me antes. Ficarei em casa, de cama, por mais um ou dois dias. Mas aconteça o que acontecer, Doutor, não se vá encontrar com ele sozinho!
- Acho que está fazendo uma tempestade num copo dágua. Só porque Moody removeu a
bomba do meu carro…
- É mais do que isso, Dr. Stevens. Tenho o pressentimento de que o senhor escolheu o
homem errado.
- Eu telefonarei assim que receber notícias dele - prometeu Judd.
Ele desligou, um pouco abalado. Será que Angeli não estava sendo excessivamente
desconfiado? Era verdade que Moody poderia ter mentido a respeito da bomba, a fim de conquistar a sua confiança. O próximo passo seria então bem fácil. Tudo o que ele teria de fazer seria telefonar para Judd e marcar um encontro em algum lugar deserto, sob o pretexto de que descobrira alguma prova importante. E então… Judd estremeceu. Será que ele se enganara a respeito do caráter de Moody? Recordou a sua reação ao ver Moody pela primeira vez. Julgara-o ineficiente e pouco inteligente. Depois compreendera que essa fachada simplória servia apenas para ocultar um cérebro ágil e esperto. Mas isso não significava que Moody fosse digno de confiança absoluta. E, contudo… Judd ouviu alguém abrir a porta da sala de recepção e olhou para o relógio. Anne!, pensou. Guardou rapidamente as fitas, foi até a porta que dava diretamente de sua sala para o corredor e abriu-a.
Anne estava parada no corredor. Usava um elegante vestido azul-marinho e um chapeuzinho
que emoldurava seu rosto de forma impecável. Estava imersa em seus pensamentos, sem perceber que Judd a observava. Ele estudou-a longamente, impregnando-se de sua beleza, tentando encontrar alguma imperfeição, alguma razão para dizer a si mesma que ela não seria a mulher ideal para ele, que algum dia encontraria uma outra bem melhor. A raposa e as uvas. Freud não era o pai da psiquiatria.
Esopo o era.