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- A culpa é sua. Se não fosse você, Johnny ainda estaria seguro ao meu lado.

Sem poder dominar-se, impelido por algum instinto de vingança há muito esquecido e

enterrado profundamente em sua mente. Judd estendeu as mãos para a garganta de Boyd. Seus dedos se fecharam em torno da traquéia do brutamontes, apertando-a com toda a força. Boyd não fez o menor gesto para se defender. Continuou parado no mesmo lugar, enquanto as lágrimas lhe escorriam pelo rosto. Judd encarou-o e foi como se visse nos olhos dele um poço que ia dar no inferno.

Lentamente, afrouxou os dedos e baixou as mãos. "Meu Deus", pensou Judd, “eu sou um médico!”.

Um homem doente me agride e a vontade que tenho é de matá-lo “! Olhar para Boyd era ver uma criança arrasada, aturdida”.

E subitamente Judd compreendeu o que seu subconsciente vinha tentando informar-lhe: Bruce

Boyd não era Don Vinton. Se fosse, Judd não estaria vivo nesse momento. Boyd era incapaz de cometer homicídio. Então ele não errara ao pensar que Boyd não se ajustava à imagem que fizera do assassino! Era um consolo irônico na situação!

- Se não fosse por você, Johnny estaria vivo agora - soluçou Boyd. - Estaria aqui comigo e

eu poderia protegê-lo.

- Eu não pedi a John Hanson que o deixasse - disse Judd, a voz cansada. - A idéia partiu dele

mesmo.

- Mentiroso!

- As coisas já estavam erradas entre você e John antes mesmo dele ir procurar-me.

Houve um longo silêncio. Depois Boyd assentiu:

- Tem razão. Nós… nós brigávamos o tempo todo.

- Ele estava procurando descobrir-se a si mesmo, e seus instintos lhe diziam que ele queria

voltar para a esposa e para os filhos. No fundo, John queria ser heterossexual.

- Tem razão - murmurou Boyd. - Ele costumava falar nisso o tempo todo, mas eu pensava

que era apenas para castigar-me.

Ele levantou os olhos e encarou Judd.

- Mas um dia ele me deixou. Ele… Simplesmente foi embora. Deixou de me amar.

Havia um desespero total em sua voz.

- Ele não deixou de amá-lo - disse Judd. - Pelo menos não como amigo.

Os olhos de Boyd estavam agora fixos no rosto de Judd.

- Quer ajudar-me?

O desespero em seus olhos era indescritível.

- Ajude-me! Tem que me ajudar!

Era um grito de angústia. Judd ficou calado por algum tempo.

- Está certo, eu o ajudarei.

- Poderei ser normal?

- Não existe conceito absoluto de comportamento. Cada pessoa carrega a sua própria

normalidade dentro de si. Não há duas pessoas que sejam iguais.

- Pode fazer de mim um heterossexual?

- Isso depende de que você o queira de verdade. Nesse caso, podemos ajudá-lo através da

psicanálise.

- E se falhar?

- Se descobrirmos que você nasceu homossexual, pelo menos poderá ajustar-se a tal situação.

- Quando podemos começar, Doutor?

Bruscamente, Judd voltou à realidade. Estava sentado ali, conversando tranqüilamente com

um paciente, quando tudo indicava que seria assassinado dentro das próximas vinte e quatro horas.

E ainda não tinha a menor idéia de quem era Don Vinton. Já eliminara os dois últimos suspeitos da sua lista, Teri e Boyd. Não sabia mais agora do que quando começara. Se sua análise de Don Vinton era correta, ele deveria estar, nesse momento, dominado por uma fúria assassina. O próximo ataque seria desfechado sem demora.

- Telefone-me na segunda-feira - disse ele a Boyd.

Judd procurou avaliar as suas possibilidades de sobrevivência, afundado num banco traseiro

de um táxi que o levava de volta ao prédio em que morava. Pareciam mínimas. O que Don Vinton poderia estar querendo tão desesperadamente? E, quem era Don Vinton? Como era possível que ele não tivesse ficha na polícia? Será que ele estaria usando outro nome? Não. Moody dissera claramente "Don Vinton".

Era difícil concentrar-se. Cada sacolejo do táxi provocava dores terríveis em seu corpo

machucado. Judd pensou nos assassinatos e tentativas cometidos até aquele momento, procurando encontrar alguma espécie de padrão que fizesse sentido. Uma vítima esfaqueada, outra torturada até à morte, um "acidente" de carro, uma bomba em seu carro, um estrangulamento. Não havia padrão algum que ele pudesse discernir. Somente uma violência implacável, maníaca. Ele não tinha como saber qual a forma que assumiria a próxima tentativa de matá-lo. Nem quem a executaria. Os lugares em que seria mais vulnerável eram o escritório e o seu apartamento. Recordou-se do conselho de Angeli. Mandaria instalar trancas mais fortes nas portas do seu apartamento. Pediria a Mike, o porteiro, e a Eddie, o ascensorista, que ficassem de alerta. Podia confiar neles!

O táxi parou diante do prédio em que morava. O porteiro abriu a porta de trás.

Era um homem totalmente desconhecido para ele.

Capítulo 17

Era um homem grande, de pele morena, rosto bexiguento e olhos negros, bem fundos. Tinha

uma cicatriz antiga na garganta. Estava usando o casaco do uniforme de Mike, apertado demais para ele.

O táxi afastou-se e Judd ficou sozinho com o desconhecido. Foi invadido por um acesso

súbito de dor. "Oh, meu Deus, agora não"! Ele cerrou os dentes.

- Onde está Mike?

- De férias, Doutor.

Doutor! Então o homem sabia quem ele era! E como Mike poderia tirar férias em Dezembro?

Havia um ligeiro sorriso de satisfação no rosto do homem. Judd olhou para um lado e outro

da rua varrida pelo vento, mas estava completamente deserta. Ele poderia tentar correr, mas não teria qualquer possibilidade de escapar, no estado em que se encontrava. Seu corpo estava dolorido e sentia dores a cada respiração.

- Parece que sofreu um acidente, Doutor.

A voz do homem era jovial. Judd virou-se sem responder e entrou no saguão do edifício.

Podia contar com Eddie para ajudá-lo.

O porteiro seguiu Judd até o saguão. Eddie estava no elevador, de costas. Judd avançou na

sua direção. Cada passo constituía-se numa agonia desesperada. Ele sabia que não podia fraquejar agora. O importante era não deixar que o homem o pegasse sozinho. Ele não teria coragem de fazer qualquer coisa diante de testemunhas.

- Eddie! - chamou Judd.

O homem no elevador virou-se.

Judd nunca o vira antes. Era uma cópia em ponto menor do porteiro. Só que não tinha a

cicatriz. Era óbvio que ambos eram irmãos.

Judd parou, encurralado entre os dois. Não havia mais ninguém no saguão.

- Vamos subir - disse o homem no elevador.

Ele tinha no rosto o mesmo sorriso de satisfação do irmão. Então eram assim os rostos da

morte! Mas Judd tinha certeza de que nenhum dos dois era o cérebro que comandava tudo. Não passavam de assassinos profissionais contratados. Será que pretendiam matá-lo ali, no saguão, ou deixariam para fazê-lo em seu apartamento? "No apartamento", concluiu Judd. Isso lhes daria mais tempo para fugir, enquanto não descobrissem o corpo.

Judd deu um passo na direção do escritório do gerente.

- Tenho que falar ao Sr. Katz sobre…

O homem maior bloqueou-lhe o caminho.

- O Sr. Katz está ocupado, Doutor - disse ele suavemente.

- Vou levá-lo lá para cima - disse o homem do elevador.

- Não, eu…

- Faça o que ele está dizendo.

Não havia qualquer emoção na voz do grandalhão.

Houve uma súbita rajada de ar gelado quando a porta do saguão se abriu. Dois homens e duas

mulheres entraram apressadamente, rindo e conversando, encolhidos dentro dos seus casacos.

- Está pior do que na Sibéria - disse uma das mulheres.

O homem que segurava o braço dela tinha um rosto rechonchudo, com um sotaque do

Centro-Oeste:

- A noite lá fora não dá para homem nem para animal.