Ele empurrou a porta da cabine telefônica. Havia uma jovem esperando do lado de fora. Era
bonita e usava uma blusa apertada, com uma minissaia e uma capa por cima, aberta na frente. Judd saiu da cabine.
- Desculpe a demora.
Ela sorriu-lhe jovialmente.
- Não há problema.
Havia uma expressão de ansiedade em seu rosto. Judd já vira aquele olhar antes. Era a
solução tentando romper a barreira que ele inconscientemente erguera ao seu redor.
Se Judd sabia que tinha alguma coisa que atraía as mulheres, então isso estava enterrado no
fundo de seu subconsciente. Ele jamais procurava analisar o fato, em busca de uma explicação. Era mais uma desvantagem que uma vantagem descobrir que as suas pacientes sempre se apaixonavam por ele. Algumas vezes isso criava situações bem difíceis.
Ele passou pela moça com um aceno cordial. Sentiu que ela ficou parada ali, debaixo da
chuva, observando-o entrar no carro e afastar-se.
Judd virou em East Drive e seguiu para o Merrit Parkway. Uma hora e meia depois estava
em Connecticut Turnpike. A neve em Nova York era suja e semiderretida, mas a mesma tempestade magicamente transformara a paisagem de Connecticut num cartão-postal de Currier e Ives.
Ele passou por Westport e Danbury, deliberadamente forçando sua mente a concentrar-se na
faixa de estrada que voava sob as rodas e na paisagem de inverno que o cercava. Cada vez que seus pensamentos voltavam a John Hanson, ele se obrigava a pensar em outras coisas. Durante horas guiou pela escuridão dos campos de Connecticut, até que, emocionalmente exausto, decidiu que já estava na hora de voltar para casa.
Mike, o porteiro de rosto vermelho, que normalmente o cumprimentava efusivamente, sempre
sorrindo, estava preocupado e distante. "Problemas de família", calculou Judd. Geralmente Judd conversava um pouco com Mike sobre o filho adolescente dele e as filhas casadas. Mas naquela noite Judd não estava com a menor vontade de conversar. Pediu a Mike que levasse o seu carro para a garagem.
- Pois não, Dr. Stevens.
Mike deu a impressão de que ia dizer mais alguma coisa, mas mudou de idéia. Judd entrou
no prédio. Ben Katz, o sindico, estava atravessando o saguão. Ele viu Judd, acenou-lhe nervosamente e seguiu em frente apressado, entrando em seu apartamento.
"Mas que diabo está acontecendo com todo mundo esta noite?", pensou Judd. “Ou serei eu”.
que estou nervoso demais “? Ele entrou no elevador. Eddie, o ascensorista, sacudiu a cabeça”.
- Boa noite, Dr. Stevens.
- Boa noite, Eddie.
Eddie engoliu em seco e olhou para o outro lado, embaraçado.
- Há algo errado, Eddie?
Eddie sacudiu a cabeça rapidamente e manteve os olhos afastados de Judd. "Meu Deus!",
pensou Judd. "Outro candidato a meu divã de analise"! Parecia que o prédio se enchera rapidamente de gente que estava precisando dos seus serviços profissionais.
Eddie abriu a porta do elevador e Judd saiu. Encaminhou-se para seu apartamento. Não ouviu
a porta do elevador fechar-se e, por isso, virou-se. Eddie estava olhando para ele. Judd começou a falar, mas Eddie rapidamente fechou a porta do elevador. Judd foi para o seu apartamento, abriu a porta e entrou.
Todas as luzes estavam acesas. O Tenente McGreavy estava abrindo uma gaveta da sala de
estar. Angeli saía do quarto. Judd sentiu a raiva irromper lá do fundo.
- Mas o que vocês estão fazendo no meu apartamento?
- Estávamos à sua espera, Dr. Stevens - disse McGreavy.
Judd avançou e fechou a gaveta violentamente, por pouco não imprensando os dedos de
McGreavy.
- Como foi que entraram aqui?
- Temos um mandado de busca - informou Angeli.
Judd fitou-o com uma expressão de incredulidade.
- Um mandado de busca? Para meu apartamento?
- Nós é que fazemos as perguntas, Doutor - disse McGreavy.
- Não precisa respondê-las - acrescentou Angeli. - Isto é, não precisa responder nada sem a
presença do seu advogado. E devemos também informá-lo de que tudo o que disser poderá ser usado como prova contra o senhor.
- Quer chamar um advogado? - perguntou McGreavy.
- Não preciso de advogado nenhum! Já lhe disse que emprestei minha capa a John Hanson
esta manhã e não tornei a vê-la até que a levaram a meu escritório, à tarde. Eu não poderia Tê-lo matado. Passei o dia inteiro com meus pacientes. A senhorita Roberts pode confirmar.
McGreavy e Angeli trocaram um olhar misterioso.
- Onde foi depois que saiu do seu escritório esta tarde, Doutor? - indagou Angeli.
- Fui ver a Sra. Hanson.
- Já sabíamos disso - falou McGreavy. - Queremos saber onde foi depois.
Judd hesitou.
- Fui dar uma volta de carro.
- Aonde?
- Fui até Connecticut.
- Onde foi que parou para jantar?
- Não parei. Estava sem fome.
- Então ninguém o viu?
Judd pensou por um momento.
- Acho que não.
- Talvez tenha parado em algum posto para encher o tanque - sugeriu Angeli.
- Não parei em lugar nenhum. Mas que diferença faz o lugar onde fui esta noite? Honson foi
morto pela manhã.
- Não voltou ao seu consultório depois que saiu de lá no fim da tarde? A voz de McGreavy
era quase indiferente.
- Não. Por quê?
- É que foi arrombado.
- O quê? Quem fez isso?
- Não sabemos. E eu gostaria de que fosse até lá conosco para dar uma olhada. Poderá
dizer-nos se está faltando alguma coisa.
- Mas claro que sim. Quem foi que informou o arrombamento?
- O vigia noturno - disse Angeli. - Guarda alguma coisa de valor em seu consultório,
Doutor? Dinheiro? Drogas? Alguma coisa assim.
- Só o dinheiro para as despesas miúdas do consultório. E nenhum narcótico. Não existe lá
qualquer coisa que valha a pena roubar. Isso não faz o menor sentido.
- Está certo - disse McGreavy. - Mas agora vamos embora.
No elevador Eddie lançou para Judd um olhar de quem pedia desculpas. Judd fitou-o e
sacudiu a cabeça, indicando que compreendia.
“Evidentemente a polícia não podia suspeitar de que ele arrombara o seu próprio”.
consultório “, pensou Judd. Parecia que McGreavy estava determinado a atribuir-lhe a culpa de”.
alguma coisa, para se vingar do seu companheiro morto. Mas só que isso acontecera há cinco anos.
Será que McGreavy passara todos aqueles anos remoendo o caso e chegando à conclusão de que ele era o culpado? Será que ficara esperando o tempo todo por uma oportunidade para agarrá-lo.
Havia um carro de polícia não identificado a poucos metros da entrada do prédio. Entraram os três e seguiram para o consultório de Judd, em silêncio. Ao chegarem, Judd assinou o registro que havia no saguão. Bigelow, o vigia noturno, olhou-o com uma expressão estranha. Ou seria apenas imaginação de Judd?
Subiram no elevador até o décimo quinto andar e percorreram o corredor até o consultório
de Judd. Um guarda uniformizado estava parado diante da porta. Ele acenou para McGreavy e deu um passo para o lado. Judd meteu a mão no bolso para tirar a chave.
- A porta está aberta - disse Angeli.
Ele empurrou a porta e os três entraram. Judd seguiu na frente. A sala de recepção era um
caos. Todas as gavetas tinham sido arrancadas da escrivaninha e o chão estava coalhado de papeis.
Judd não queria acreditar no que estava vendo, sentindo um choque de violação pessoal.
- O que acha que estavam procurando, Doutor? - indagou McGreavy.
- Não tenho a menor idéia.
Ele encaminhou para a porta que dava para o seu gabinete pessoal e abriu-a. McGreavy veio
logo atrás dele.