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Ser rainha. Ser rainha.

Agora o rei está a jogar ténis. Numa bancada encostada a um dos lados do edifício, os cortesãos assistem.

Ele joga bem, o corpo alto move-se com uma rapidez surpreendente enquanto salta de um lado para o outro do campo. Apesar disso, parece-me que o homem mais jovem com quem ele joga conseguiria ganhar, se quisesse. Sempre que conquista um ponto é possível ver a sua hesitação, como se receasse ter ido longe de mais.

O rei também o sabe. Assim que vence o outro homem, chama com impaciência outro adversário.

– Jogamos por amor ou por pontos, senhor? – pergunta o próximo jovem.

– Pontos – responde Carlos secamente. – O amor não tem lugar no campo de ténis.

– Apenas na corte do rei? – diz o outro jogador. Ouvem-se risos e alguns olhares voltam-se para mim. Finjo não reparar, mas o meu coração bate um pouco mais depressa.

Este adversário é mais inteligente do que o anterior: acumula uma boa vantagem para que o rei sinta o desafio de ter de a ultrapassar. Ao meu lado, lady Arlington murmura-me ao ouvido:

– É bom sinal, há meses que ele não jogava assim. Não acha que joga bem? É um atleta, um homem muito atraente, além de monarca. Também sabe nadar, e muitas vezes vai a pé até Hampton Court. Para não falar do seu desporto com as senhoras.

– «As senhoras»? – repito, abismada.

– Oh, o rei é um amante exímio – diz ela com um sorriso maldoso. – Além de todos os seus outros talentos.

Sinto-me corar.

– Lady Arlington…

– Peço desculpa. Estou a ser demasiado franca? Talvez viva há tempo a mais em Inglaterra. Por aqui, são quase ridiculamente descontraídos em relação a essas coisas. Por outro lado, mademoiselle, também já não é nenhuma criança, pois não? Estou certa de que sabe do que estou a falar. – Dá-me uma leve cotovelada. – Afinal de contas, por aquilo que tenho ouvido, Madame não era nenhuma santa.

Não respondo. Nunca me tinha ocorrido que a inocência nestas questões pudesse ser considerada uma infantilidade.

Além do mais, há verdade suficiente no que ela diz para me deixar desconcertada. Eu sabia que para Madame, delicada e enfermiça, as atenções do marido eram um dever cada vez mais desagradável. Porém, não podia esquecer aquela ocasião em que monsieur estava fora e eu entrara no escritório dela à procura de penas para escrever. E ali estava Madame, deitada de costas no divã, com as pernas frágeis enroladas à volta das ancas do rei enquanto o monarca se soerguia sobre ela, com a camisa comprida desabotoada, as pernas nuas e peludas… Eu recuara, chocada, e fechara rapidamente a porta. Não conseguia encontrar sentido naquilo que vira. Madame nunca se deitaria com Luís para obter vantagens pessoais. Então porquê? Por amor? Eu não diria que existia paixão entre eles, mas sim amizade; a compreensão profunda daqueles que nasceram em posições semelhantes.

Não compreendo as relações sexuais, penso, e essa consciência irrita-me. Ser inteligente e, ao mesmo tempo, tão ignorante – saber tocar instrumentos, falar várias línguas e escrever cartas diplomáticas, e contudo compreender tão pouco deste desejo, aparentemente o mais fundamental dos desejos… era como ver um jogo de ténis sem compreender as regras.

Não que compreenda completamente também as regras do ténis, penso, com um esforço para me concentrar no jogo. A competição entre o rei e o cortesão está agora mais intensa, como um duelo ou a luta de dois veados no cio. Carlos lança uma bola alta que cai por trás do seu adversário. O jovem consegue ainda tocar-lhe com a raquete mas, nesta altura, Carlos já está junto da rede. Golpeia a bola para o interior do campo. Sei o suficiente para perceber que esta é considerada a forma mais decisiva de vencer o ponto.

O rei agradece os aplausos dos espectadores com uma reviravolta da raquete. Depois, ainda ofegante, olha directamente para mim.

– Ele joga para si – diz lady Arlington entre dentes, aplaudindo furiosamente. – Sorria. Agora tem de jogar para ele.

Enquanto os jogadores bebem cordiais frescos, a corte dispersa. Reconheço uma figura de sobrecasaca francesa que se afasta com uma caixa de gelo nos braços.

– Signor Demirco – chamo.

Por um momento ele hesita – mas depois apressa o passo e vejo-me obrigada a correr atrás dele.

– Espere – chamo. – Signor Demirco, espere!

Por fim, ele não tem outra alternativa senão parar.

– Não me ouviu? – pergunto, espantada.

– Ouvi – responde ele secamente.

– Então porque está tão zangado?

Parece-me que ele quase diz qualquer coisa, mas pensa duas vezes.

– Por nada – responde, por fim. – Como está? Ouvi dizer que a sua diplomacia está a ter grande sucesso.

Será imaginação minha, ou há uma sugestão de escárnio na palavra «diplomacia»? Um pouco aborrecida, digo:

– E eu ouvi dizer que a sua nem por isso.

Ele encolhe os ombros.

– Julga-se que há mais probabilidades de o rei aceitar os meus gelos se for a Louise a oferecê-los.

– E é por isso que está tão… carrancudo? Tem o orgulho ferido?

– Não estou carrancudo, como diz – responde ele, ainda em tom seco. – Nem tem nada a ver com o meu orgulho. Pelo contrário, o seu sucesso será a minha passagem de regresso a França. Por falar nisso, como deve estar feliz agora por não ter aceitado o meu pedido de casamento em Versalhes!

– Nunca poderia ter aceitado, de uma maneira ou de outra – respondo, cuidadosamente –, tendo em conta o abismo entre as nossas origens. No entanto, uma vez que os nossos amigos mútuos o informaram, evidentemente, da minha possível sorte nesse aspec­to, direi que sim, ainda bem que não aceitei. Contudo, signor… talvez seja melhor que esse episódio em particular permaneça apenas entre nós. Um pedido de casamento, mesmo recusado, pode ser visto como uma mancha no meu bom nome, e a minha reputação será agora mais importante do que nunca.

– A sua reputação? – murmura ele. – Oh, por favor. Poupe-me. Quer apenas dizer que agora tem coisas mais importantes em vista.

Zangada, digo:

– Estou a ajudar o rei a recuperar o ânimo… coisa que os seus gelos, ao que parece, são incapazes de fazer.

Ele curva-se numa vénia.

– É verdade. Tem a minha gratidão. – E afasta-se, com expressão tempestuosa.

Fico a olhar para ele, exasperada. Parece que os sentimentos do confeiteiro ainda estão algo feridos. Claro que o lamento muito – apesar de isso me surpreender – mas não posso permitir que estas coisas me afastem da minha tarefa.

Nessa noite, Arlington e a mulher têm uma conversa atrás de portas fechadas. Mais tarde, lady Arlington vem ao meu quarto. Manda a criada embora e penteia-me ela própria o cabelo, com exclamações de admiração pela espessura dos caracóis apertados que se soltam sob os seus dedos, indomáveis como sempre. Nunca consegui dominá-los completamente.

– De qualquer maneira, creio que ambas conhecemos alguém que os admira – diz em tom de provocação, e eu coro. – Diga-me – continua, no mesmo tom de voz calmo. – Quando são as suas regras mensais?

Um pouco embaraçada, respondo:

– Tenho tudo o que preciso, obrigada.

– Não estou a falar disso – diz ela, imperturbável. – Refiro-me ao rei. Para que possa procurá-lo na altura certa. – Sorri-me de forma tranquilizadora pelo espelho. – Quer que ele se apaixone por si, não quer? – A sua mão no pente não hesita nem por um segundo, continuando a mover-se de forma tão regular como a de um moço de estrebaria a escovar um cavalo.

– Eu… não sei – respondo, com hesitação.

– Eu acho que sim – murmura ela. – Só pode querer. A maneira como ele a olha… Pretende mais de si do que consolo para a tristeza. Muito mais. Que sorte a sua!