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– Oh, foi um presente do seu rei, por a ter enfiado na cama de Carlos.

Sorrio com doçura e digo:

– Nesse caso, tenho de lhe dar também um presente, Elizabeth, pois não imagino maior felicidade do que a que sinto. – Não lhe darei nada, claro. Um colar de diamantes é recompensa mais do que suficiente pelo trabalho de dona de bordel.

E depois, rapidamente, tudo muda outra vez.

CARLO

Gelado queimado: derreta o açúcar numa frigideira sobre o lume até queimar levemente: entretanto, prepare uma mistura de seis ovos, um decilitro e meio de xarope e meio litro de natas. Mexa tudo, passe por um coador e congele.

O Livro dos Gelos

–Grávida? Tem a certeza?

Ela acenou com ar infeliz.

– Já vomitei duas vezes hoje.

– E isto vai alterar as coisas?

– Para mim? Não sei. O embaixador parece achar que é uma boa notícia.

– Mas a Louise não tem tanta certeza?

Ela encolheu os ombros.

– O rei já teve outros filhos bastardos: parece haver dezenas de crianças a correr por aqui. Suspeito que pode significar que a minha posição ficará consolidada e, portanto, mais difícil de mudar.

Percebi o que ela queria dizer.

– Ainda tem esperança de que ele a faça sua rainha.

– Se a Catarina morrer, sim. Porque não? É a única saída que me resta neste momento… a única maneira de a minha posição se tornar honrada. Mas acho que nem os Ingleses gostariam de ver uma francesa grávida e gorda a percorrer a coxia para casar com o seu rei.

– O que disse Carlos do bebé?

– Oh, ele está encantado. Mais ainda, julgo eu, por provar a sua potência do que por querer realmente outro filho. – Hesitou. – Há mais uma coisa. Assim que lhe contei, o interesse dele por mim diminuiu.

– Acha que ele ficou aborrecido?

Ela abanou a cabeça.

– Ainda me visita… mas para se sentar comigo, ou passear, ou conversar. Ninguém diria que algo está diferente pela atitude dele… continua atencioso como sempre… mas quando nos deitamos, só me cobre uma vez. – Reparei no tom prático com que ela o dizia: já não havia rubores. As suas cópulas eram questões políticas e de estratégia, para serem analisadas da mesma maneira que qualquer outro assunto da corte. – É quase como se, agora que já me emprenhou, sinta que cumpriu o seu dever, como qualquer marido que planta um herdeiro na esposa.

– Talvez seja isso. E é normal que o desejo de um homem acalme depois da lua-de-mel. – Talvez, pensei, as groselhas verdes de Culpeper tenham tido também algum efeito, afinal. – De qualquer forma, ele terá de se abster completamente assim que a sua barriga crescer. Depois de um período de abstinência forçada, voltará para si ainda com mais vigor.

– Se estiver mesmo em abstinência – disse ela secamente.

– Pensa que ele tem outras mulheres?

– Tenho a certeza – respondeu calmamente. – E não me impor­to nada, se reduzir as suas exigências para comigo. Mas isto é diferente. Não é apenas o Will Chinffinch a fazer entrar uma criadita qualquer pela escada das traseiras. Ele não tem jantado comigo.

– Está com a rainha?

Ela abanou a cabeça.

– Quando vai ter com ela, fá-lo publicamente, para que todos vejam. Temo que o Arlington tenha encontrado alguém por quem tenciona substituir-me.

Cassell foi ainda mais directo.

– O rei cansou-se dela – disse, com franqueza. – Não me admirava nada que a mandasse para França, para ter o seu bastardo lá.

– Então quem é agora a sua preferida?

– Consta que voltou para a actriz.

– A actriz! Porquê ela?

– Volta sempre para ela. A Nell diverte-o. Sua Majestade não é um homem de constância.

– Nesse caso, ainda pode voltar para a Louise.

– Suponho que é possível. Mas não as deixe lutar por ele. Não há nada de que o rei goste mais do que sossego, e já tivemos mulheres a lutarem por ele antes.

– A Louise não se rebaixará a esse ponto. Muito menos por causa de uma actriz.

– Oh, ela terá certamente de lutar – disse Cassell. – Queria apenas dizer que tem de o fazer discretamente. A actriz já se livrou de outras rivais e a sua madame Carwell faria bem em não a subestimar.

LOUISE

No Parque de St. James, aproximo-me de um grupo de cortesãos, pensando que o rei está entre eles, mas em vez disso encontro a actriz a andar de um lado para o outro, com o nariz empinado, a falar numa algaraviada com sotaque francês e a chamar-se a si própria «Madame Zarolhabela». Alguns dos que a rodeiam conseguem parar de rir quando eu me aproximo, mas a actriz vira-se para mim sem qualquer atrapalhação.

Oui? Bonjour? – diz. Mais risos. Reparo que ela tem a cabeça inclinada para o lado, com um olho semicerrado, como se estivesse a espreitar por um telescópio. A troçar do meu olho preguiçoso.

– Estava à procura do rei – digo, calmamente. – Mas vejo que não está aqui. Vou procurar noutro lado.

– Oh, Sua Majestade está muito bem – diz ela, agora com a sua voz normal. – Na verdade, nunca o tinha visto em melhor forma do que como esteve comigo ontem à noite.

– Obrigada – agradeço, em tom gelado. Quando me afasto, oiço-os aplaudir a representação dela.

Merci, merci – diz ela, com uma reverência delicada. – Mas madame Zarolhabela prefere jóias a aplausos.

*

Parece espantoso que ela tenha permissão para frequentar a corte, tendo em conta a sua grosseria. No entanto, ele instalou-a numa casa ao fundo de St. James, com um portão que liga o jardim dela ao parque.

Lembro-me daquelas damas de companhia. Teria sido a repreensão de Carlos para elas também um aviso codificado para mim? Aquelas com quem me deito são companhia adequada para os maiores deste país. Terei de aceitar não só partilhar a sua predilecção, como que esse facto me seja esfregado na cara?

Só me resta um caminho possíveclass="underline" ignorá-la e esperar que isto passe depois da minha gravidez.

Parece que é mais uma das situações em que tenho de me comportar como uma rainha.

Entretanto, é preciso lidar com Jemmy Monmouth, o primeiro bastardo do rei. Ele voltou do seu curto – demasiado curto – exílio e anda à procura de sarilhos.

Visita o rei quando ele está comigo e pergunta, abruptamente, se podem falar a sós.

– Jemmy – protesta Carlos –, não tenho segredos para a Louise.

– Ainda assim, deixo-vos a sós – digo, graciosamente. E, para o espicaçar um pouco mais, acrescento: – Talvez nos voltemos a ver daqui a pouco, Carlos?

– Muito pouco, espero eu.

O olhar furioso de Monmouth segue-me enquanto saio da sala.

Claro que, depois, Carlos me conta o que ele queria. Agora que o exército está em batalha, Monmouth quer que o rei o coloque no comando.

– Tentei dissuadi-lo – diz Carlos. – Mas, como todos os jovens, ele quer provar o seu valor no meio dos perigos da batalha.

Mais provavelmente, penso, quer provar que é digno da Coroa. Em voz alta, digo:

– Suponho que, do ponto de vista dele, é justo. Afinal de contas, o seu irmão tem o comando da marinha. Porque não havia o seu filho de comandar o exército?

Uma sombra passa pelo rosto de Carlos.

– É muito diferente. O meu irmão é filho legítimo de um rei, e meu herdeiro.

– Pensa que, se o Jemmy comandasse o exército, isso transmitiria a impressão errada? – pergunto, com ar pensativo. – Sim, não tinha pensado nisso.

– Eu também não, até termos esta conversa. Mas agora estou decidido… ele não deve ir.

Isto é bom – mas pode ser ainda melhor.